Trabalhadores fazem denúncias à CPI da Cemig
Denúncias envolvendo o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Minas Gerais Participações (MG...
26/03/1999 - 09:39Trabalhadores fazem denúncias à CPI da Cemig
Denúncias envolvendo o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Minas Gerais Participações (MGI) e o Estado marcaram, nesta quarta- feira (24/3/99), a reunião da CPI da Cemig, que investiga irregularidades que teriam sido cometidas na venda de 33% do capital votante da companhia - adquirido pelo consórcio formado pelas empresas Southern, AES e Banco Opportunity, em maio de 1997. Representantes dos trabalhadores da Cemig e do Sindicato dos Eletricitários de Minas Gerais (Sindieletro) afirmaram que, mais de um ano antes da alienação das ações, o BNDES e o Estado firmaram um protocolo de intenções em que se previa direito sobre a gestão estratégica da empresa, nos termos de um futuro acordo de acionistas cujas bases seriam definidas entre o BNDESPAR, subsidiária do banco, e o governo do Estado.O protocolo de intenções determinava que o Estado firmaria contrato com o BNDES, para que este participasse do processo de desestatização em Minas. Uma das cláusulas do protocolo estabelecia que o Estado iria transferir as ações de emissão da Cemig de sua propriedade para a MGI Participações S.A., necessárias ao adiantamento, pelo BNDES à MGI, da importância de R$ 250 milhões pelo prazo máximo de 90 dias. Esse empréstimo seria garantido pela alienação fiduciária de 20% das ações ordinárias de emissão da Cemig. A MGI emitiria então, em troca do empréstimo, debêntures que seriam convertidas em bloco de ações a ser depois alienado, passando a deter o direito sobre a gestão estratégica da Cemig, nos termos de um futuro acordo de acionistas. Segundo o representante dos trabalhadores no Conselho de Administração da Cemig, Marcelo Correia, as ações mencionadas são parte do lote de 33% das ações alienadas em maio de 1997. O protocolo foi assinado em 19 de dezembro de 1995.
OPERAÇÕES QUESTIONADAS
Marcelo Correia afirmou que, além deste, outro empréstimo foi feito pela MGI nos mesmos moldes. Segundo ele, os dois empréstimos, realizados em dezembro de 1995 e em janeiro de 1996, totalizam o montante de R$ 565 milhões, embutidos os juros. Esse montante foi, segundo ele, "abatido" do total de recursos provenientes da venda das ações da Cemig, que totalizaram R$ 1,3 bilhão. O representante dos trabalhadores no Conselho de Administração da Cemig questionou essas operações feitas pela MGI, que, reafirmou ele, comprou ações pertencentes ao Estado e utilizou os empréstimos concedidos pelo BNDES para pagá-las, emitindo, em troca, debêntures (papéis conversíveis em ações), que depois seriam alienadas pelo banco.
O representante dos trabalhadores da Cemig fez, ainda, indagações sobre o fato de a MGI - empresa ligada ao próprio governo - ter comprado essas ações do Estado a R$ 18,40 e fixado o valor de R$ 20,24 para as debêntures emitidas, na época do primeiro empréstimo; e a R$ 23,14, no segundo empréstimo, tendo fixado o valor de R$ 23,65 para as debêntures, que depois foram convertidas em ações (cujos detentores têm direito a voto).
Marcelo Correia afirmou, ainda, aos deputados que a MGI teria comprado ações PN da Cemig (sem direito a voto) por R$ 30,90, tendo vendido essas mesmas ações a R$ 46,09, um dia depois do Edital do leilão público de 33% das ações da companhia, obtendo um lucro de 49% nessa operação. "A MGI tinha informações privilegiadas, especulou na Bolsa de Valores, e o Estado sabia disso. Será que outros também fizeram o mesmo?", questionou, em entrevista após a reunião da CPI.
OUTROS DEPOIMENTOS
Além de Marcelo Correia, falaram também o coordenador-geral e o ex- coordenador-geral do Sindieletro, Lúcio Guterres e Maurílio Chaves dos Santos; Alexandre Lisboa, também representante dos trabalhadores no Conselho de Administração da Cemig; e Ayres Mascarenhas, presidente do Clube dos Investimentos dos Empregados da Cemig (Clic).
Respondendo a indagações do deputado Adelmo Carneiro Leão (PT), Lúcio Guterres afirmou que a empresa norte-americana Southern teve acesso à empresa meses antes do período determinado pelo Edital do leilão público para venda das ações. O edital, publicado em março de 1997, determinava que as empresas concorrentes ao leilão teriam 10 dias para solicitar ao BNDES reuniões ou visitas à MGI e Cemig. Cinco empresas foram qualificadas para o leilão.
Marcelo Correia reafirmou, ainda, as denúncias já feitas pelos trabalhadores de que, com a venda das ações, o Estado perdeu o controle da empresa - que agora cabe aos sócios estrangeiros, chamados também de estratégicos ou minoritários. Segundo ele, o Estado não tem mais autonomia para alterar estatuto, vender ações, tratar da composição e funcionamento dos órgãos da companhia, dependendo, para isso, do voto dos estrangeiros. No caso do Conselho de Administração, com 11 integrantes, quatro são representantes dos estrangeiros. É preciso quórum de oito votos favoráveis para realização de contratos, alienação de bens e ativos superiores a R$ 1 milhão, entre outras ações.
"O diretor-presidente deixou de definir ações, estratégias e o plano quinqüenal de negócios. Agora ele só desenvolverá essas ações. Já o diretor- vice-presidente passou a ser responsável pela elaboração do plano e do orçamento. O presidente virou rainha da Inglaterra e agora quem manda é o vice", afirmou, referindo-se a Davi Travesso Neto, representante dos sócios estratégicos.
Alexandre Lisboa, também representante dos trabalhadores no Conselho de Administração da Cemig, afirmou que outra "marca" dos sócios estrangeiros é a velocidade de retirada dos dividendos da empresa. "Essas retiradas estão sendo feitas às custas do programa de investimento da Cemig", afirmou, referindo-se a cláusula do Acordo de Acionistas que autoriza a retirada, pelas partes, de 50% do lucro (dividendo complementar), desde que o balanço da companhia tenha patrimônio líquido não inferior ao existente em 1996.
DEFESA E QUESTIONAMENTOS
O presidente do Clube dos Investimentos dos Empregados da Cemig (Clic), Ayres Mascarenhas, indagado pelos deputados Bilac Pinto (PFL) e Amilcar Martins (PSDB), entre outros, afirmou que, para o Clube, é bem-vinda a presença dos sócios estrangeiros. Acrescentou que os princípios dos novos sócios são convergentes com os do Clube: lutar por uma empresa rentável, conquistar novos mercados e dividendos. Segundo Mascarenhas, o Clube foi constituído em dezembro de 1996, mas apenas cerca de quatro meses depois passou a adquirir ações. "Quando começamos a nos mobilizar, as regras do leilão já estavam estabelecidas", afirmou. Mascarenhas, que ocupa cargo de direção na Gasmig, destacou também que o país vai precisar de geração térmica, pois o aproveitamento hidroelétrico é caro e caminha para o esgotamento. Segundo ele, a Southern, integrante do consórcio que comprou as ações da Cemig, é "agressiva" no processo de geração de energia térmica. Os sete mil cotistas do Clube têm hoje 0,03% do capital da companhia.
Após as exposições, o deputado Amilcar Martins (PSDB) fez diversas intervenções e perguntas aos representantes dos trabalhadores, sendo sua fala marcada pela defesa do processo de venda das ações. "De uma maneira geral, ficamos chovendo no molhado. Não houve nada de novo", comentou, referindo-se às denúncias e à documentação apresentada pelo Sindieletro. O deputado mostrou dados relativos à qualidade do atendimento da Cemig e à satisfação do consumidor, questionando os trabalhadores, que tinham denunciado a queda de qualidade dos serviços. Segundo Amilcar Martins (PSDB), o índice de satisfação subiu de 89%, em 1995, para 92,5%, em 1998. Para o ex-coordenador-geral do Sindieletro, Maurílio Santos, os números refletem a opinião dos consumidores das áreas de comércio e indústria, não a dos consumidores em geral. "O problema é de metodologia", afirmou, referindo-se à pesquisa.
O deputado apresentou, ainda, números sobre a eletrificação rural, destacando que, em 1995, 41% das propriedades rurais do Estado eram eletrificadas; e, em 1998, esse número tinha subido para 80%. Esses números também foram questionados, desta vez pelo coordenador-geral do Sindieletro, Lúcio Guterres. Amilcar Martins (PSDB) também questionou os representantes dos trabalhadores sobre a Forluz, fundo de previdência e aposentadoria dos funcionários da Cemig; sobre o salário médio na companhia; e sobre as demissões que ocorreram na empresa. Ele afirmou que essas demissões foram conseqüências de programas de desligamento voluntário e incentivado, além das solicitações de aposentadoria. Acrescentou que a Cemig continua gerando empregos. Já Lúcio Guterres replicou que o plano de desligamento incentivado foi uma forma de "mascarar" as demissões em massa. O relator da CPI, Antônio Andrade (PMDB), encerrou as discussões afirmando que os assuntos que estavam sendo tratados não tinham relação direta com a CPI.
INFOVIAS
O presidente da CPI, deputado Adelmo Carneiro Leão (PT), indagou de Alexandre Lisboa, representante dos trabalhadores no Conselho de Administração, se o processo de criação da empresa Infovias teria alguma relação com o leilão de venda das ações. A empresa Infovias foi criada em 29 de dezembro do ano passado, para atuação em telecomunicações, sendo que os sócios estrangeiros detêm 49,75% das ações, e o governo, 48,75%. "A presença majoritária dos sócios estrangeiros indica que este foi um negócio pensado por eles, aproveitando a estrutura da Cemig, mas com o controle de tudo", criticou Alexandre Lisboa.
O debate sobre a empresa Infovias, subsidiária da Cemig, foi objeto, ainda, de questão de ordem do deputado Amilcar Martins (PSDB). Segundo ele, o assunto não é objeto da CPI. O presidente Adelmo Carneiro Leão (PT) afirmou ao deputado que a questão será respondida após consulta à assessoria técnica. Caso haja um entendimento sobre a relação entre a Infovias e o objeto de investigação da CPI, a questão será abordada pela comissão, afirmou o presidente. Amilcar Martins (PSDB) acrescentou que tinha protocolado requerimento solicitando que o debate sobre a Infovias ocorresse no Plenário da Assembléia, com a participação do presidente da Cemig, Djalma Morais; do vice-presidente, Davi Travesso Neto; e do ex-presidente José da Costa Carvalho.
REQUERIMENTOS APROVADOS
Na próxima semana, a CPI deverá ouvir o professor da UFRJ Luiz Pinguelli Rosa e Fernando César Maia, da Agência Nacional de Energia Elétrica. Foram aprovados, ainda, os seguintes requerimentos:
* do deputado Amilcar Martins (PSDB), solicitando ao Tribunal de Contas cópia do parecer final tratando do uso, pelo governo de Minas, dos recursos provenientes da venda das ações da Cemig; e solicitando à Secretaria de Estado do Planejamento a cópia da ata de reunião da Comissão de Desestatização realizada no dia 24 de janeiro de 1997.
* da Comissão, convocando a procuradora do Estado Carmem Lúcia Antunes Rocha para comparecer à Assembléia e prestar esclarecimentos sobre a venda das ações da Cemig.
* do deputado Adelmo Carneiro Leão (PT), convocando o professor Luiz Pinguelli Rosa, da UFRJ, a prestar informações à Comissão.
* do deputado Antônio Andrade (PMDB), convocando o advogado José Luiz Ladeira a prestar esclarecimentos sobre a venda das ações.
PRESENÇAS
Compareceram à reunião os deputados Adelmo Carneiro Leão (PT), que a presidiu, Amilcar Martins (PSDB), Chico Rafael (PSB), Bilac Pinto (PFL), vice- presidente; Antônio Andrade (PMDB), relator; Eduardo Daladier (PDT), Rogério Correia (PT), Antônio Roberto (PMDB), Ermano Batista (PSDB), Dalmo Ribeiro Silva (PSD) e Eduardo Brandão (PL).
Responsável pela informação: Fabiana Oliveira - ACS - 031-2907715