Pacote fiscal é criticado por autoridades na Assembléia

O impacto do pacote fiscal do Governo Federal nas contas públicas estadual e municipais foi o tema da reunião promovi...

14/12/1998 - 13:53

Pacote fiscal é criticado por autoridades na Assembléia

O impacto do pacote fiscal do Governo Federal nas contas públicas estadual e municipais foi o tema da reunião promovida ontem (5/11) pela Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária, que teve a participação do assessor especial da Secretaria de Estado da Fazenda, Luiz Schwarcz, e o secretário municipal da Fazenda de Belo Horizonte, Fernando Pimentel. Eles avaliaram os reflexos das mudanças econômicas e concluíram que os estados e municípios vão perder ainda mais. Pimentel acusa o governo federal de lançar um pacote com o objetivo de remunerar o capital internacional.

A reunião foi realizada a requerimento do deputado Durval Ângelo (PT), que justificou o convite às autoridades pela necessidade de o Legislativo avaliar as conseqüências do pacote nas finanças do Estado e dos municípios. O parlamentar chamou a atenção para as alterações que o pacote promove nos repasses do governo federal para os outros entes da Federação e acrescentou que a questão tributária vai refletir nas condições sociais da população.

REFORÇO DE CAIXA
O assessor Luiz Schwarcz fez uma análise da situação dos estados hoje, em contraposição ao período em que o país convivia com a inflação. "Naquela época, a receita tinha uma certa dianteira em relação à despesa com pessoal. Com a estabilidade econômica, o custo de pessoal passou a ter crescimento real, e o Estado passou a ter necessidade de buscar meios de aumentar a receita, para acompanhar o crescimento da folha de pagamentos. As principais fontes de receita do Estado - o ICMS, o IPVA e o ITCD - estariam comprometidas hoje em cerca de 90% com a folha de pessoal".

Schwarcz disse que o governo federal "só vai fazer reforma para reforçar o caixa da União". A criação da CPMF, segundo Schwarcz, não foi feita para aumentar os investimentos em saúde, mas para liberar o Tesouro de arcar com aqueles custos. O Fundo de Estabilização Fiscal (FEF) e o Cofins, que incide sobre o faturamento das empresas, são outros instrumentos de que o governo federal dispõe para aumentar a arrecadação. Tampouco, continuou o assessor, o governo federal gosta de dividir receitas com os estados e municípios. Ele aumenta as contribuições do FEF, da CPMF e do IOF, impostos que não são partilhados, e para compensar, pode reduzir o Imposto de Renda, imposto que é partilhado com os estados e municípios. Esta atitude gera perdas para os estados e municípios e reflete nas ações voltadas para a sociedade, concluiu Schwarcz.

O assessor especial da Secretaria da Fazenda abordou também o aspecto internacional da crise. Para a manutenção da inflação próxima de zero e segurar os preços, o governo tem recorrido aos produtos importados. A importação é estimulada e, para mantê-la, o governo aceita a entrada de qualquer tipo de capital, atraídos pelos juros altos. "O país está chegando a um impasse porque somente a rentabilidade não é atraente para o capital estrangeiro, se não houver segurança de liquidez", advertiu Schwarcz. As altas taxas de juros têm como reflexo interno a retração da economia e, conseqüentemente, interfere na arrecadação dos Estados que, por outro lado, têm custos crescentes.

A saída encontrada para o ajuste das contas dos Estado e que está sendo proposta pelo governo é a redução de salários, através do aumento de impostos ou de contribuição, já que não há como demitir servidores públicos na quantidade suficiente para equilibrar as contas públicas. Num processo de recessão, caem o IPI e o ICMS, e o custo da folha deverá crescer ainda mais, finalizou Luiz Schwarcz.

CAPITAL ESTRANGEIRO
O secretário municipal da Fazenda de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, disse que a discussão sobre o pacote tem sido "pobre e mal detalhada" e esconde a realidade do significado do ajuste fiscal proposto pelo Governo. O secretário disse que o governo não totaliza mais o déficit público (produzido por gastos maiores que a arrecadação) e que os últimos dados, de maio deste ano, situam o déficit na casa dos R$ 60 bilhões. Esse valor deve ser dividido em duas partes. São R$ 7 bilhões de déficit primário, déficit real, e R$ 53 bilhões são juros da dívida pública. Fernando Pimentel disse que o governo está atacando apenas a parte menor, os R$ 7 bilhões. Não há, no pacote, medidas voltadas para atacar os juros.

O ajuste fiscal, segundo Pimentel, tem o objetivo de tranqüilizar os investidores estrangeiros, pois o capital internacional percebeu que o governo pode não honrar os compromissos, como já ocorreu de outras vezes. "Desenha-se aí um novo pacto e não é o pacto federativo nem o pacto social. É o estado brasileiro defendendo interesses do capital internacional e, para isso, impondo um sacrifício brutal ao cidadão", disse o secretário. Ele acrescentou que as medidas propostas não produziram os resultados esperados pelo governo, pois o capital externo continua deixando o país num montante de 400 a 500 milhões diários. "O governo pretende mostrar aos investidores que as contas públicas estão em ordem, mas o pacote não vai restaurar a credibilidade porque não resolve o problema real do país", advertiu Pimentel.

Outra parte do problema está, para o secretário da Fazenda, na questão cambial. "Com uma balança deficitária, o governo montou uma espécie de corrente da felicidade, buscando dinheiro novo para honrar velhos compromissos. A crise virá pelo lado cambial, que é o lado verdadeiro dela", disse. Um controle rigoroso do câmbio, segundo o secretário, preservaria as reservas brasileiras, que estão na casa dos R$ 40 bilhões e já foram de R$ 70 bilhões. "A conversão de real em dólar é financiada pelo povo", sentenciou.

Pimentel defendeu a redução da taxa de juros, da média anual de 25%, para 10%, quando a média mundial é de 7%, como fator que permitiria o reaquecimento da economia.

PERDAS
O secretário municipal da Fazenda lamentou que os cortes propostos para a redução do déficit público terão reflexos nas áreas da saúde, educação, até nos serviços como de coleta de lixo. Sobre a situação do município, disse que Belo Horizonte, que perde hoje com o FEF cerca de R$ 6 milhões ao ano, perderá cerca de R$ 25 milhões, o que equivale a três meses de limpeza da cidade.

O secretário alertou também que a reforma tributária é uma ameaça aos estados e municípios. O exemplo vem em números. O maior imposto brasileiro e maior fonte de arrecadação, o ICMS, gera 60 bilhões ao ano, enquanto que o IPI gera 17 bilhões, e o Imposto de Renda arrecada 32, 33 bilhões. "A União sonha em ser sócia dos estados e municípios e apropriar-se desses tributos, ao propor a criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA)". Este imposto reuniria o ICMS, o ISS e o IPI..

Outra situação dramática, apontada por Pimentel, será gerada com a perda do ISS, que em Belo Horizonte representa 20% da arrecadação, maior que o IPTU. "Esta perda será fatal para os municípios, e terá reflexos sobre os 300 maiores municípios do país, que reúnem metade da população do país". A redistribuição da receita desse imposto, segundo o secretário, criaria grandes injustiças, dando tratamento igual a realidades bastante diferentes. Para se ter uma idéia, o município de São Paulo arrecada R$ 1 bilhão 500 milhões com o ISS. "O governo pretende recentralizar a arrecadação, com prejuízos para os estados e municípios", criticou o secretário.

Pimentel finalizou sua exposição com duras críticas ao governo que, na sua opinião, pretende remunerar o capital internacional com os recursos obtidos através do ajuste fiscal. Ele considera o momento de extrema gravidade para a vida republicana. "Este pacto fiscal é entre as elites e o capital internacional às custas do sacrifício da população brasileira", disparou.

Os convidados responderam ainda a questões formuladas pelos deputados Sebastião Navarro Vieira (PFL) e Durval Ângelo. Participaram da reunião os deputados Kemil Kumaira (PSDB), que preside a Comissão, Sebastião Navarro Vieira (PFL) e Durval Ângelo (PT).


Responsável pela informação: Francisco de Morais