CPI dos Medicamentos Falsos recebe dados preocupantes

Mesmo depois do início do escândalo dos remédios falsos no País, somente em Belo Horizonte, de 10 a 31 de agosto, a V...

10/09/1998 - 10:59

CPI dos Medicamentos Falsos recebe dados preocupantes

Mesmo depois do início do escândalo dos remédios falsos no País, somente em Belo Horizonte, de 10 a 31 de agosto, a Vigilância Sanitária municipal encontrou quase 50 mil medicamentos falsos ou com prazo de validade vencidos, principalmente o anticoncepcional Microvlar, em 310 das 873 farmácias, drogarias ou estabelecimentos semelhantes da Capital. Esta informação foi dada nesta quarta-feira (02-09) pelo chefe do Serviço de Vigilância Sanitária de Belo Horizonte, João Batista de Souza, à CPI dos Medicamentos Falsos, no primeiro dia de tomada de depoimentos. Os dados foram considerados preocupantes pelos deputados. Em Minas Gerais, cerca de 650 municípios têm uma vigilância deficiente, reconheceu o superintendente da Vigilância Sanitária Estadual, Júlio César Martins Siqueira.

João Batista de Souza ainda apresentou outros dados alarmantes à CPI. Segundo ele, das 873 farmácias, drogarias e outros estabelecimentos, 221 são clandestinos, não têm qualquer documentação; 626 estão com o alvará de funcionamento legalizado e 26 com o alvará vencido; 763 têm farmacêutico responsável; e 110 não têm farmacêutico.

Para Júlio César Martins Siqueira, o interesse na falsificação de medicamentos é resultado da grande movimentação do mercado de remédios. Ele disse que dados da Associação Brasileira de Indústrias Farmacêuticas revelam que o Brasil é o sexto maior mercado mundial, com 3% da movimentação ou R$ 3 bilhões (R$ 300 bilhões total); e responde por 2/3 da movimentação do Mercosul e 40% da América Latina.

O superintendente estadual apontou aos deputados os pontos críticos verificados no setor de medicamentos. Segundo ele, os maiores problemas são a reembalagem de amostras grátis de medicamentos e a troca de medicamentos entre as empresas que comercializam esse produto. Mas também contribui o descontrole do registro dos produtos; o transporte inadequado; o roubo de cargas de medicamentos - que hoje já está em terceiro lugar no ranking de roubo de cargas; a falta de controle sobre o destino dos medicamentos; a ausência de farmacêuticos em muitos estabelecimentos; o descarte de medicamentos vencidos; e a venda de equipamentos obsoletos para a produção de medicamentos.

Júlio César Martins Siqueira afirmou que a forma de se combater os medicamentos falsos ou com validade vencida é a descentralização da vigilância sanitária, para que a fiscalização chegue a todos os municípios mineiros. Atualmente, 250 das 853 cidades de Minas Gerais já têm algum tipo de fiscalização sanitária municipalizada, mas nas outras 653 a fiscalização é precária e feita pelo órgão estadual. O superintendente da Vigilância Sanitária estadual disse ainda que existem 44 laboratórios em Minas, todos fiscalizados rigorosamente, e 100 empresas distribuidoras de medicamentos, das quais 35 foram interditadas por irregularidades nos últimos meses.

Outras medidas necessárias para mudar a atual situação do setor, de acordo com Júlio César Martins Siqueira, é a criação do cadastro de indústrias atacadistas e de medicamentos registrados no Brasil, além da integração das autoridades policiais e fazendárias entre os Estados da Região Sudeste.

SEM NOVIDADE
O diretor da Faculdade de Farmácia da UFMG, Célio Celso, disse que a falsificação de medicamentos não é um problema novo: "é mais antigo do que se pensa". Ele afirmou que a falsificação muitas vezes é feita através de processos sofisticados e não pode ser constatada a olho nu, mas somente através de análises laboratoriais. Célio Celso ressaltou que a fiscalização sanitária é deficiente. "Os falsificadores recuaram mas estão provavelmente se reorganizando, esperando a poeira baixar para voltarem a atuar no mercado", alertou, pregando a continuidade da mobilização da sociedade e dos meios de comunicação.

Segundo Célio Celso, a criação da Agência Nacional da Saúde vai ser muito importante para o combate à distribuição de medicamentos falsos ou com data de validade vencida. Mas será necessário, em sua avaliação, que a Agência contrate pessoal qualificado para as tarefas e que os remunere bem. Além disso, observou, é preciso que a agência e os órgãos de fiscalização tenham o mesmo status da Receita Federal e estejam imunes a interferências econômicas e políticas.

O diretor da Faculdade de Farmácia apresentou várias sugestões para que a falsificação seja combatida. Para ele, são necessárias várias medidas: o estabelecimento de critérios mais rígidos para a criação de distribuidoras, de farmácias e drogarias e para a impressão de material de embalagem de medicamentos; a fiscalização permanente da presença de farmacêutico nas farmácias e drogarias; a normatização da distribuição de amostras grátis; maior rigidez nas normas para o armazenamento e transporte de medicamentos; além de outras propostas.

SELO DE LEGALIDADE
O relator da CPI, deputado Adelmo Carneiro Leão (PT) disse que os números apresentados são realmente preocupantes. Ele criticou a falta de uma política governamental mais eficaz para a vigilância sanitária. O presidente da Comissão, deputado Wilson Pires (PFL), ressaltou que a situação atual é fruto da corrupção existente no País. Já o autor do pedido de criação da CPI, deputado Irani Barbosa (PSD), defendeu a colocação de um selo identificador da situação de legalidade em todos os medicamentos em Minas como forma de enfrentar "a fúria assassina da máfia dos remédios". Todos os deputados fizeram perguntas aos chefes da vigilância sanitária estadual e municipal e ao diretor da faculdade da UFMG.

Os deputados aprovaram quatro requerimentos. Três deles foram apresentados pelo deputado Irani Barbosa, onde ele solicita da Vigilância Sanitária estadual e municipal cópia das rotinas de fiscalização das farmácias, hospitais, laboratórios e distribuidoras de medicamentos dos últimos dois anos; a lista da Secretaria da Fazenda de entidades filantrópicas que tiveram isenção de ICMS para compra de medicamentos nos últimos dois anos; e a lista da Vigilância Sanitária sobre as receitas de medicamentos controlados vendidos pela Distribuidora Dinâmica, Drogaria Dinâmica ou pela controladora, Ação Distribuidora. Outro requerimento, do deputado Adelmo Leão Carneiro, solicitou que a Assembléia pague a passagem rodoviária de Timóteo para Belo Horizonte para Joaquim Guimarães, familiar de uma vítima de medicamento falso, que vai participar de reunião da Comissão.

Participaram da reunião, ainda, os deputados Carlos Pimenta (PSDB) e Sebastião Helvécio (PPB), além do fiscal da Vigilância Sanitária de BH, Gilberto Gomes Lima. O delegado da Polícia Federal Tadeu de Moura Gomes foi convidado mas não compareceu à reunião sob alegação de que tinha outro compromisso assumido anteriormente.


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