Ex-procurador do Incra denuncia pagamentos milionários
O relato feito pelo ex-procurador regional do Incra em Minas Gerais, Ivan Sebastião Barbosa Afonso, sobre fazendas de...
27/11/1997 - 03:35Ex-procurador do Incra denuncia pagamentos milionários
O relato feito pelo ex-procurador regional do Incra em Minas Gerais, Ivan
Sebastião Barbosa Afonso, sobre fazendas desapropriadas com indenizações
milionárias, superiores em até 30 vezes o valor avaliado, deixou perplexos,
nesta quarta-feira (26), deputados e visitantes que participaram da reunião da
Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial da Assembléia. Essas
denúncias teriam motivado o afastamento de Ivan Barbosa do cargo. Todo esse
episódio levou o deputado Adelmo Carneiro Leão (PT) a formular o requerimento
que deu origem à reunião, que teve ainda a presença do superintendente
regional do Incra, Melchior Augusto de Melo, que pôs o seu cargo à diposição
após o afastamento do procurador.
O ex-procurador Ivan Barbosa fez uma exposição emocionada dos seus
compromissos, como procurador, com a reforma agrária, que, segundo ele,
tornou-se uma aspiração de toda a sociedade. Disse que a propriedade da terra
é uma concessão da sociedade para um proprietário e que esse título implica
obrigações para com a sociedade. Quando essas obrigações, como a de fornecer
alimento e desenvolvimento para a região, não são cumpridas, a sociedade não
deve ser obrigada a tolerar essa relação. No Brasil, disse ele, acontece o
contrário. O dono da terra é que se julga detentor de todos os direitos.
Função implica resistência contra latifúndios
O ex-procurador lembrou que sua função implicava uma série de
"conjugações de atores e fatores" e uma resistência contra os latifúndios.
Essa resistência deve se dar no campo jurídico, destacou Ivan Barbosa,
garantindo que o Incra de Minas Gerais é um dos poucos que cumprem seu papel
de intermediador de conflitos, tendo como objetivo encontrar soluções
jurídicas adequadas a cada caso. "É no Judiciário que o Incra encontra a sua
força", disse ele, acrescentando que esta é a maneira de se construir uma
reforma agrária democrática.
Ivan Barbosa disse também que Minas Gerais é o único Estado que vem
aplicando a lei do rito sumário, que torna mais ágil o processo de reforma
agrária, ao permitir em poucos dias a emissão liminar da posse da terra,
transferindo a titularidade para o órgão expropriante: o Incra. Este mesmo
artifício legal dá ao juiz a possibilidade de designar audiência de
conciliação, para que se faça um acordo, democrático de fato, e sem as
supervalorizações da terra. A ausência do rito sumário, pela demora que impõe
aos processos, decorrente da estrutura do Poder Judiciário, acaba elevando os
custos da propriedade, em função de juros de mora, honorários advocatícios e
outros dispositivos que são usados para aumentar os valores da terra.
Governo deve R$ 800 milhões por área avaliada em R$ 25 milhões
O ex-procurador citou vários casos de fazendas cujo valor foi calculado
em R$ 25 milhões, mas cuja indenização devida alcança até R$ 800 milhões.
Disse ainda que, como procurador do Incra, passou a propor ações rescisórias,
quando então começou a encontrar dificuldades, até a sua exoneração.
Ivan Barbosa sugeriu uma série de medidas para aprimorar o processo de
reforma agrária, como a descentralização e a busca de parcerias com empresas e
universidades que possam contribuir nos assentamentos. Também condicionou a
sua permanência no órgão, depois de ter sido convidado a permanecer como
assessor, pelo presidente da autarquia, Milton Seligman, a uma série de
medidas, entre as quais o avanço da reforma agrária, em seus aspectos sociais,
econômicos, jurídicos e morais; e a atuação do Incra intermediando os
conflitos agrários, com a participação do Judiciário e das autoridades
estaduais.
As outras medidas são: que seja submetido à apreciação do Conselho de
Diretores do Ministério Público Federal o parecer proferido a respeito da
Fazenda Araguaia, no Estado do Tocantins, e, se aprovado, que seja proposta a
desistência da ação de desapropriação; que tal procedimento seja estabelecido
como norma geral para, em 1998, atingir todos os processos de desapropriação
duvidosos; que todas as denúncias de corrupção já apresentadas, ou que venham
a ser, sejam apuradas por grupo de trabalho diretamente ligado à presidência,
com a participação do Ministério Público Federal, da Associação dos
Funcionários e dos trabalhadores; que a descentralização seja realizada com o
respeito e a participação dos técnicos competentes e honrados da casa; que o
Orçamento do Incra seja participativo, com a discussão pela superintendências
e pelos trabalhadores.
Maior parte dos assentamentos em Minas ocorreu em 96/97
O superintendente regional do Incra, Melchior Augusto de Melo, mostrou os
números referentes aos assentamentos durante sua gestão. Segundo ele, apesar
das dificuldades para implementação da reforma agrária, principalmente para a
implantação da infra-estrutura, foram assentadas, desde 1986, 5.641 famílias
em 89 projetos, das quais 3.070 famílias (55 projetos) apenas no biênio 96/97,
o equivalente a 62% do total.
Ele informou que o órgão precisaria de aproximadamente R$ 30 milhões para
atender aos 95 projetos de assentamento, envolvendo desde a topografia até a
eletrificação rural, mas estão previstos para o próximo ano apenas R$ 7
milhões (R$ 5 milhões segundo informação do deputado Adelmo Carneiro Leão), do
total de R$ 2,5 bilhões previstos no Orçamento do próximo ano (a maior parte
para pagamento das indenizações e benfeitorias, segundo o superintendente).
Apesar disso, o superintendente acredita que as metas do Incra de Minas
de assentar cerca de 2,5 mil famílias, atendendo a toda a demanda do Estado
(se não houver novos acampamentos), poderá ser cumprida em 1998.
Deputados endossam posição do ex-procurador
Na fase de debates, os deputados Paulo Piau (PFL), presidente da
Comissão; Adelmo Carneiro Leão (PT), João Leite (PSDB), e Maria José Haueisen
(PT) se solidarizaram com o ex-procurador e demais dirigentes regionais do
Incra, elogiando o trabalho do órgão pela reforma agrária em Minas Gerais.
Também se disseram "assombrados" com os valores relatados por Ivan Barbosa,
aprovando requerimento do deputado Adelmo Carneiro Leão em que solicitam a
manifestação da Assembléia, junto ao Ministério Extraordinária para a Reforma
Agrária e ao presidente da República, apoio às posições manifestadas pelo ex-
procurador.
Também aprovaram requerimento, do mesmo deputado, solicitando audiência
pública com os vários grupos e organizações ligados à questão da reforma
agrária e da produção no campo, para discutir a formulação de uma política de
desenvolvimento do setor rural. Além dos parlamentares já citados,
participaram da reunião os deputados Marcos Helênio (PT) e Wanderley Ávila
(PSDB).
Requerimentos
Ainda na reunião de ontem, a Comissão de Política Agropecuária e
Agroindustrial aprovou os seguintes requerimentos:
- Da deputada Elbe Brandão (2378/97), requer seja denominado Projeto
Betinho o projeto de assentamento rural de Engenheiro Dolabela, no município
de Bocaiúva;
- do deputado Paulo Piau (2397/97), requer a regulamentação da Lei
12.596, de 30/07/97;
- da Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial (2405/97 e
2406/97), requer ao presidente do Bemge, ao governador do Estado e ao
secretário de Agricultura a realização de gestões junto ao presidente do Banco
Central, para resolver a situação econômica dos produtores rurais que
contraíram financiamento com a MinasCaixa por meio do Proagro;
- do deputado Roberto Amaral (2411/97), requer seja formulado apelo ao
presidente do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais, Marcos Raymundo
Pessoa, para conclusão do estudo de proposta de financiamento e/ou
refinanciamento da dívida dos irrigantes do projeto Jaíba, que se encontra em
tramitação nessa instituição.
E, ainda:
- do deputado Dimas Rodrigues, requer ao presidente da Assembléia seja
realizado um Fórum de Debates na Casa enfocando a fruticultura mineira, dando
ênfase aos projetos irrigados, levantando as potencialidades mineiras e
abordando aspectos ligados à cadeias produtivas;
- da deputada Elbe Brandão, requer marcar audiência entre um
representante da Comissão com o presidente do Banco do Nordeste do Brasil,
doutor Byron da Costa Queiroz; que sejam convidados os presidentes da
Associação dos Bananicultores do Norte de Minas (Abanorte), Nuno Casassanta, e
da Cooperativa dos Pequenos Produtores de Frutas do Norte de Minas (Coofrut),
Edson Bernardinho, para discutir a suspensão das cobranças dos empréstimos
contraídos pelos produtores rurais da região através do FNE e a prorrogação
dos prazos de pagamento;
- do deputado Dimas Rodrigues, requer seja realizada visita dos membros
da Comissão de Agropecuária e Política Rural a Janaúba, com a finalidade de
avaliar a situação vivida pelos produtores de banana, principalmente no que
diz respeito às questões ligadas à falta de mercado para o produto e aos
prejuízos com os quais estão arcando os produtores devido às elevadas contas
de energia elétrica, além de outros pontos;
- do deputado Paulo Piau, requer seja convidado a participar dos
trabalhos da Comissão o presidente do Sindicato Rural de Sacramento, João
Osvaldo Manzan, a fim de falar sobre Orçamento Participativo da Prefeitura de
Sacramento e seus efeitos sobre a Agropecuária no município; e o presidente do
Sindicato Rural de Uberaba, Atayde Fatureto, para falar sobre o Conselho
Municipal de Desenvolvimento Agropecuário, além de uma série de autoridades;
- do deputado Gilmar Machado, requer sejam feitos apelos aos gerentes das
agências do Bemge, do Bradesco e do Banco do Brasil da cidade de Centralina,
com vistas à prorrogação do vencimento dos financiamentos de securitização dos
produtores rurais do referido município;
- do deputado Marco Régis, requer realização de reunião conjunta das
Comissões de Educação, Cutlura, Ciência e Tecnologia, de Saúde e de Meio
Ambiente e Recursos Naturais, para discutir a aplicação indiscriminada de
agrotóxicos em todo o Estado.
Ainda na reunião, o PL 1203/97, da deputada Maria José Haueisen, foi
redistribuído ao deputado João Leite (PSDB) para emitir parecer.
Responsável pela informação: Rodrigo Lucena - GCS - 031-2907800