CPI Carcerária discute distribuição de verbas do Funpen
A discussão dos critérios que orientaram a distribuição das verbas do Fundo Penitenciário, orçado para 1997 em R$ 9,4...
12/05/1997 - 06:10CPI Carcerária discute distribuição de verbas do Funpen
A discussão dos critérios que orientaram a distribuição das verbas do Fundo Penitenciário, orçado para 1997 em R$ 9,4 milhões, foi o principal tema da reunião da CPI do Sistema Carcerário, realizada na sexta-feira (9). A Comissão é presidida pelo deputado João Leite (PSDB). O delegado Weber Americano, representante da Secretaria de Estado da Segurança Pública no Grupo Coordenador do Fundo Penitenciário, negou qualquer influência política na partição desses recursos, defendendo que os "critérios foram puramente técnicos". O deputado Durval Ângelo (PT), vice-presidente, questionou o fato de Belo Horizonte não ter recebido nem um centavo dos recursos do Funpen, apesar de abrigar 9,7% dos 11.423 detentos em cadeia em Minas, com um excedente de 3,1 presos por vaga - já que sua capacidade é de apenas 4,3% do potencial de acolhimento do Estado, de 8.235 presos. O deputado citou dados da Secretaria de Estado da Segurança Pública demonstrando que os recursos previstos para 1997, de R$ 9,4 milhões, estão destinados à construção de cadeias públicas em 15 municípios mineiros e, para a região da Grande BH, a única verba endereçada é para a construção do Bloco Administrativo na Penitenciária Dutra Ladeira, em Neves. O deputado Durval Ângelo questionou os critérios para distribuição desses recursos, citando dados do relatório do advogado Fábio Alves dos Santos, da Pastoral Carcerária, demonstrando que os 15 municípios beneficiados, excluindo-se a Dutra Ladeira, têm uma capacidade prisional de 328 vagas, para um número de 598 presos, menos de dois presos por vaga. "Abrigam 5,2% dos presos em cadeias do Estado e recebem 98% dos recursos do Funpen para 1997. Qual a lógica dessa distribuição?", indagou o deputado. Distorções - Na sua intervenção, o deputado Durval Ângelo detalhou ainda a situação dos estabelecimentos prisionais de alguns dos municípios beneficiados com verbas do Funpen. A cidade de Cláudio, que tem quatro condenados, sendo três em regime aberto e apenas um confinado, que poderia estar abrigado em alguma cadeia da região, receberá R$ 380 mil para construção de um estabelecimento prisional. "É uma cidade com baixo índice de criminalidade, que não demanda esse tipo de investimento", ponderou o deputado. Ele citou ainda o caso de Baependi, que tem capacidade para abrigar 21 presos e está acolhendo, no momento, apenas 20, com uma vaga ociosa. Para esse município foram destinados R$ 488 mil. Para Muzambinho, cuja cadeia foi reformada recentemente, ampliando sua capacidade para 40 presos e mantendo atualmente 11 detentos, foram destinados R$ 675 mil. Outro município beneficiado é o de Cataguases, que o deputado Durval Ângelo considerou o mais escandaloso de todos, pois receberá verbas de R$ 710 mil e mais R$ 2 milhões para obras do sistema carcerário já implantado e construção de um novo estabelecimento penal. "Coincidentemente esse município representa 70% dos votos do atual secretário da Justiça, deputado Tarcísio Henriques", afirmou Durval Ângelo. O deputado ponderou que a distribuição das verbas seguiu na contramão de tudo o que a CPI do Sistema Carcerário já identificou. "Quais os critérios para a distribuição dessas verbas? Houve ingerência política na definição dos municípios beneficiados?", perguntou. O deputado João Leite (PSDB) citou outros dois municípios, Guanhães e Padre Paraíso, que receberão R$ 658 mil e R$ 250 mil, respectivamente, em detrimento de outros municípios onde a situação dos estabelecimento prisionais é mais grave. Suspensão - A CPI do Sistema Carcerário aprovou ontem requerimento de autoria do deputado Durval Ângelo (PT), solicitando ao governo do Estado a suspensão da liberação dos recursos para 10 dos 15 municípios beneficiados, até uma apuração sobre a necessidade e o provável uso político dessa verba. Nominou as cidades de Campo Belo, Malacacheta, Cláudio, Canápolis, Araçuaí, Baependi, Carlos Chagas, Muzambinho, Oliveira e Santa Rita do Sapucaí, além do montante destinado também ao município de Cataguases. Delegado nega ingerência política no Funpen O delegado Weber Americano negou qualquer ingerência política na distribuição dos recursos do Funpen. "Os critérios foram técnicos e, se houve algum erro na partição desses recursos, ele é de responsabilidade exclusiva do grupo gestor do Fundo e não provocado por pressões políticas", frisou o representante da Secretaria de Estado da Segurança Pública no Grupo Coordenador do Fundo Penitenciário. Ele adiantou ainda, aos membros da CPI, que o Estado deverá ter um superávit na arrecadação deste Fundo em torno R$ 6 milhões e que, independentemente desse resultado, já foram negociados recursos para a construção de mais três centros de reeducação no Estado - sendo um em Francisco Sá, onde o Estado já dispõe de terreno; outro em Itajubá e um terceiro em Uberaba. "Além disso, vamos construir mais três cadeias, em Betim, Contagem e Santa Luzia e mais uma unidade prisional em Belo Horizonte, num terreno de 8 mil m2, no bairro Santa Inês, para atender às necessidade da região metropolitana", afirmou Weber Americano, adiantando que, em Santa Luzia, as negociações estão mais avançadas porque o Estado dispõe de um terreno. Respondendo aos questionamentos do deputado Durval Ângelo (PT) sobre a ausência de municípios como Ipatinga e Montes Claros na distribuição das verbas do Funpen, o delegado lembrou que, em Ipatinga, a administração municipal passada, liderada pela legenda do PT, reagiu de forma contrária ao projeto que estava sendo negociado para a cidade. "Só agora, com o apoio do empresariado, estamos conseguindo viabilizar esse investimento, que já prevê uma nova concepção para as unidades prisionais, desenvolvida em convênio com a Escola de Arquitetura", informou. Para Montes Claros o delegado confirmou que não deverão ser feitos novos investimentos agora, pois a unidade penitenciária prevista para a região ficará em Francisco Sá, onde o Estado já dispõe de terreno. Ele explicou que a distribuição de verbas do Fundo obedeceram, basicamente, a essa visão mais humanizada da recuperação dos detentos. "Em primeiro lugar, cadeia não é lugar para preso. Então não devemos continuar investindo em novas construções, mas direcionar recursos para as unidades penitenciárias, onde pode-se fazer um trabalho de reeducação". Ele argumentou ainda que, independentemente dessa visão, a Polícia Civil teria dificuldades para reivindicar essas verbas para a RMBH, pois ela mesma está carente de recursos. Dos 19 distritos hoje existentes na Capital, 14 funcionam em prédios alugados. "Como vamos investir na ampliação desses prédios, se eles não nos pertencem?", perguntou. Weber Americano ponderou também que não faz sentido construir uma cadeia em cada cidade, embora fosse esse o desejo de alguns juízes - que não aceitam detentos de outras cidades na sua Comarca. "É por isso que, mesmo não tendo problemas, a cidade de Cláudio receberá investimentos, para atender às demandas da região", justificou. O delegado citou ainda o prazo ideal dos indicadores de crescimento que devem ser considerados nas obras públicas, que é de 50 anos. "Diante das dificuldades financeiras do Estado estamos trabalhando hoje com um prazo de 30 anos, para projetar as demandas da região. Mas nem é o ideal. Então, não podemos ter uma visão muito imediatista da realidade, para avaliar esses investimentos", ponderou. Deputado questiona delegado sobre as torturas O deputado João Batista de Oliveira (sem partido) questionou o delegado sobre as denúncias de tortura e a existência de tribunais de exceção no sistema prisional do Estado, condenando e executando detentos que não foram nem mesmo julgados pela Justiça. Weber Americano defendeu a Polícia Civil, argumentando que existem distorções pessoais em qualquer setor da atividade humana. "Sabemos que existem casos com essas características, mas não refletem o comportamento da instituição e nem são assmilados por ela, pois a nossa Corregedoria tem agido com rigor e firmeza em todos os casos constatados". Respondendo ao deputado João Batista de Oliveira, Weber Americano concordou que há necessidade de criar espaços diferenciados para presos com diferentes níveis de periculosidade. "E precisamos fazer muito mais. Temos de repensar o sistema como um todo", defendeu. Quando questionado pelo deputado João Leite (PSDB) sobre a distorção de papéis hoje exercidos pela Secretaria de Segurança Pública, que se especializa cada vez mais na gestão dos presos e menos na administração da Justiça e investigações de processos, Weber Americano ponderou que essa é uma tendência histórica. "Data do império e só quando repensarmos o sistema como um todo esses descaminhos serão corrigidos", justificou. Agenda da CPI inclui novos depoimentos A CPI do Sistema Carcerário irá se reunir novamente na próxima quarta-feira (14), às 14 horas, para ouvir o presidente da Associação Criminalística do Estado de Minas Gerais, Levy Eduardo dos Santos, que vai falar sobre ameaças que vem recebendo desde que prestou depoimento na Comissão de Direitos e Garantias Fundamentais da Assembléia. Esse convite foi formalizado a partir de requerimento do deputado Ivair Nogueira (PDT), relator da CPI. Joé Antônio de Moais, corregedor geral de Polícia, também será ouvido nesse horário. Ainda na quarta-feira, os membros da CPI vão ouvir o depoimento do superintendente de Organização Peniténciária, Ediraldo Brandão, e de Vânia Maria Souza Melo, superintendente de Finanças da Secretaria da Fazenda. Na reunião de sexta-feira foi aprovado ainda outro requerimento, também do deputado Ivair Nogueira, solicitando à Corregedoria da Polícia Civil cópia dos depoimentos das peritas Érica e Acidália, responsáveis pelo primeiro laudo de vistoria na "Igrejinha", sala de tortura do Deoesp. Repercussão da CPI O deputado João Leite (PSDB), presidente da CPI do Sistema Carcerário, respondeu ontem às críticas do delegado Weber Americano, de que os trabalhos da Comissão estariam motivando o aumento de rebeliões de detentos em todo o Estado, argumentando que a CPI foi criada a partir de denúncias do agravamento desse quadro e não o contrário. O deputado João Leite citou declarações de delegados da Furtos e Roubos, no início de abril, antes da constituição da CPI, advertindo sobre a retomada da Ciranda da Morte nas celas dessa unidade. Citou ainda as freq"uentes rebeliões em unidades prisionais do interior, como Divinópolis e Ipatinga, todas anteriores à formação da Comissão Parlamentar de Investigação. A CPI recebeu ainda essa semana o apoio da sociedade, através de um abaixo-assinado, com 5 mil assinaturas. Todas as pastorais carcerárias também manifestaram seu apoio ao trabalho dos parlamentares e à sua continuidade e conclusão das investigações.
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