Autoridades se revezam na defesa e ataques à privatização da Vale

Na fase destinada ao debate entre os oradores do Ciclo de Debates "A Vale do Rio Doce na Economia Nacional", as autor...

21/03/1997 - 10:00

Autoridades se revezam na defesa e ataques à privatização da Vale



     Na fase destinada ao debate entre os oradores do Ciclo de Debates

"A Vale do Rio Doce na Economia Nacional", as autoridades se revezaram

na defesa  e no ataque à privatização da Companhia. Os discursos foram

interrompidos diversas  vezes em função das manifestações ocorridas na

galeria do Plenário, contrárias à posição do governo.

     A primeira  oradora foi a senadora Júnia Marise (PDT), que fez um

histórico das  "grandes mobilizações  cívicas do  regime democrático".

Segundo a  senadora, essas  manifestações também  acontecem  quando  o

governo tenta impor a sua vontade para promover a desestatização. Para

a senadora, a venda da estatal não se justifica por qualquer critério,

seja técnico, político, financeiro ou estratégico. Citou os estudos de

um grupo de professores do Rio de Janeiro, que condenam a forma como o

governo quer  vender a  Vale e questionou a lisura da venda, em função

do envolvimento  do banco  Merrill Lynch,  consultor  do  processo  de

privatização, com  uma empresa  da África  do Sul, uma das mais fortes

candidatas à compra da Vale.

     Em seguida, discursou o presidente da Federação das Indústrias do

Estado de  Minas Gerais  (Fiemg), Stefan  Bogdan Salej,  defendendo  o

processo de  privatização. Segundo ele, é preciso definir o que será o

Brasil do século XXI e qual o padrão de qualidade de vida que se quer.

Por esta razão, disse, o País tem de reorganizar os setores produtivos

de sua  economia a  partir de  um modelo que a torne mais competitiva,

evitando que seja massacrada no processo de globalização. O presidente

da Fiemg disse que esse processo não passa só pelo setor privado e que

o Estado  também deve  se organizar  e ter o direito de dizer onde vai

ser mais  eficaz. Criticou  a Cia.  Vale  do  Rio  Doce  por  não  ter

investido seus  lucros em  Minas Gerais  e defendeu a sua privatização

para que  com os  recursos obtidos  o Estado seja capaz de investir em

áreas essenciais, como na saúde e na educação.

     Em oposição  ao discurso  do  presidente  da  Fiemg,  o  deputado

federal João  Fassarela condenou  o argumento  de  que  o  Estado,  ao

privatizar a  Vale,  passaria  a  ser  regulador  da  economia  e  das

atividades da  empresa. Segundo  ele, a  Vale do  Rio  Doce  tem  sido

eficiente e,  ao contrário,  o governo  não exerce  com eficácia o seu

poder regulatório.  O deputado  disse que  um dos  grandes problemas a

serem resolvidos  diz respeito  às pesquisas  minerais  em  andamento.

"Como vamos preservar as pesquisas?", perguntou, criticando a proposta

do BNDES.  "Não podemos  vender aquilo que não conhecemos", completou.

Ainda segundo  Fassarela, é  preciso que  o País  se integre  ao mundo

globalizado, "com  soberania, sem  cair  de  joelhos,  renunciando  ao

controle de  nossas decisões".  Disse, ainda, que a Vale e a Petrobrás

são as  duas grandes  empresas que asseguram ao Brasil uma inserção no

mundo globalizado  com  soberania  e  capacidade  de  ditar  regras  e

procedimentos.

     Também o  brigadeiro Ivan Frota atacou o processo de privatização

da Vale. Ao fazer uma avaliação do encontro promovido pela Assembléia,

o brigadeiro  defendeu as manifestações oriundas da galeria como sendo

conseqüência de  um sentimento  de revolta dos setores que se opõem ao

governo e  que não  têm  as  mesmas  condições  de  se  manifestar  na

imprensa, como  faz o governo. O brigadeiro revelou uma pesquisa feita

pelo Clube  Militar, segundo  a qual  69% dos  oficiais da  ativa e da

reserva são  contrários à  venda da  empresa e 70% seriam favoráveis a

uma participação  do  próprio  Clube  Militar  na  campanha  contra  a

privatização.

     Já o  deputado Roberto  Brant fez uma defesa veemente da venda da

Companhia Vale do Rio Doce. Segundo ele, a Vale "pode" ser privatizada

porque não  é necessária  a presença  do Estado  na  formação  do  seu

capital. "Pelo  contrário, o  Estado é  um empecilho  para que  a Vale

cresça, já  que a  União está proibida por lei de aumentar seu capital

na empresa".  Disse que  a Vale  "deve" ser  vendida porque  apresenta

baixa lucratividade  em relação ao seu imenso patrimônio - cerca de 4%

ao ano.  Ainda segundo  Brant, a  capacidade do governo de investir em

pesquisas minerais é limitada. O total de investimentos passaria de R$

34 milhões  para R$  80 milhões  por ano,  na eventualidade de ela ser

privatizada.

     O deputado  lembrou também  que os  benefícios sociais da Vale no

Estado foram  nulos. Citou  as regiões  do Vale  do Jequitinhonha e do

Vale do Rio Doce, onde ela tem atuação, como as mais pobres do Estado.

Ainda segundo  Roberto Brant, enquanto o Estado gasta cerca de 15% dos

lucros da  empresa para  pagar juros  de uma dívida contraída ainda na

época dos governos militares, ganha em dividendos menos de 1%.

     Nessa mesma  linha, o  presidente do  Instituto Liberal,  Aloísio

Garcia, disse que é importante que o Estado reveja o seu papel e o seu

tamanho. São  papéis do Estado, de acordo com a avaliação do Instituto

Liberal, defender  a soberania  nacional, fazer  a defesa  da moeda  e

manter a  liberdade e  autonomia do  Poder Judiciário  e, em  seguida,

garantir saúde, educação e infra-estrutura à população. Para Garcia, a

venda da  Vale se  justifica porque a presença do Estado ali extrapola

os limites  de suas  funções para  alavancar  o  desenvolvimento.  Ele

admitiu que a Vale é uma empresa eficiente, mas condenou o destino dos

resultados dessa  eficiência, que,  segundo ele, servem para alimentar

um excesso  de corporativismo. "O que a Vale dá aos seus acionistas, o

povo brasileiro?", questionou, elencando, por outro lado, uma série de

benefícios a que têm direito os funcionários da empresa.

     Presente ao  debate, o  arcebispo de  Mariana e  ex-presidente da

Confederação Nacional  dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Luciano Mendes

de Almeida, foi convidado a compor a mesa e a transmitir sua mensagem.

Dom Luciano criticou a pressa como o governo vem acelerando o processo

de privatização.  Segundo ele,  o Executivo  tem de ouvir a população,

assim como  o legislativo deve estar aberto para ouvir e discutir. Sem

essa discussão,  acrescentou,  não  há  tempo  para  que  a  população

assimile as  mudanças e  os significado  da proposta.  Ele disse que a

pressa com  que o  governo conduz  o processo  se traduz  em "medo  do

povo".

     O Ciclo  de Debates  teve ainda mais uma fase, com a abertura dos

debates aos  oradores inscritos, em que várias autoridades e o público

geral puderam falar e questionar os componentes da mesa.

Responsável pela informação: Rodrigo Lucena - GCS - 031-2907800