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Capacitação de profissionais e atenção individualizada podem facilitar inclusão de autistas

Nesta quinta (25), representantes da iniciativa privada e do terceiro setor falaram dos desafios para inserção das pessoas com TEA no mercado de trabalho.

25/04/2024 - 19:50 - Atualizado em 26/04/2024 - 15:24
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A maior inserção de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e com outros transtornos do neurodesenvolvimento no mercado de trabalho passaria pela capacitação de profissionais que possam detectar as potencialidades desse público e reter esses talentos nos estabelecimentos empregadores. Agregado a isso, estariam a disposição real para a inclusão e o respeito, garantindo uma atenção individualizada a cada indivíduo.

As reflexões são de representantes de entidades de indústria, comércio, serviços e do terceiro setor que atuam na perspectiva da inclusão da pessoa com deficiência. Eles participaram de audiência da Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social, nesta quinta-feira (25/4/24), que faz parte de uma série de reuniões que a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) está realizando em abril, mês de conscientização sobre o autismo.

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Segundo Grazielle Pinheiro, do Coletivo Autistas Adultos e da Associação Unidas Pelo Autismo, há uma crença de que as pessoas com TEA teriam uma capacidade reduzida, o que não é verdade. Também autista, com nível 1 de suporte, ela completou que são necessários profissionais qualificados, especialmente os terapeutas, para descobrir as potencialidades

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Grazielle completou que muitas empresas abrem suas portas para contratação de pessoas com deficiência (PCDs) no início, mais para cumprir a quota legal desse público. “Depois, deixam a pessoa num canto só para ganhar o selinho de empresa amiga da pessoa com deficiência”, lamentou, exigindo respeito e qualidade de vida para o segmento.

Ex-servidora da Prefeitura de Contagem, Grazielle registrou que foi aposentada em função do dano provocado pelo assédio moral que sofreu no trabalho. Hoje, com 43 anos, ela avalia que o trabalho tanto pode contribuir para o crescimento da pessoa quanto para levá-la ao chão. Com diagnóstico recente de TEA, concluiu que ele foi importante para conhecer suas limitações e dificuldades, além das potencialidades e, com isso, relacionar-se melhor na sociedade.

Inserção de forma individualizada

Mariana Dias, analista de recursos humanos da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), disse que trabalhar com inclusão faz parte da essência da entidade. Segundo ela, a inserção da PCD de forma individualizada, levando em conta as necessidades de cada um, é discutida com assistentes sociais, terapeutas ocupacionais e pessoal de recursos humanos da entidade. Há também uma preocupação com a realização de processos seletivos, que devem ser adaptados às necessidades desse público, para que cada indivíduo possa mostrar suas potencialidades.

Juliana Resende, coordenadora de diversidade, equidade e inclusão do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), registrou que a preocupação é com a inclusão tanto do público interno (professores) quanto do externo (alunos). Divulgou que são acompanhados 3 mil alunos nas 40 escolas do Senac e que são providenciadas adaptações para melhor atender as PCDs. E destacou que a entidade busca ampliar a acessibilidade em suas unidades, tanto arquitetônica quanto atitudinal e comunicacional.

Já Gilsane Rodrigues, gerente de saúde do Serviço Social do Comércio (Sesc), anunciou que será inaugurada em breve uma unidade na Capital dotada de todos os equipamentos e profissionais para atender pessoas com deficiência. O deputado Cristiano Silveira (PT), que solicitou a audiência, agradeceu à gestora e lembrou que a proposta surgiu em uma reunião na ALMG.

Alessandra Rubim, analista de Projetos Sociais da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), afirmou que falar de diversidade e inclusão é falar de engajamento, o que impõe lutar contra o preconceito e pela mudança de cultura.

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Retenção de talentos

Alexandre Dolabella, assessor de Relações Institucionais da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo de Minas (Fecomércio/MG), falou da diferença entre o chefe e o líder. “O líder vê o que cada pessoa tem de bom e tenta tirar dela o melhor", disse. Ele realçou que o Sesc emprega vários autistas, a maioria na área de tecnologia.

O professor Willian Zenon, da área de projetos especiais da Faculdade Anhanguera, destacou a importância de projetos em empresas voltados para a retenção de talentos também das pessoas com TEA. “O cidadão é contratado para determinada função, mas a empresa descobre que ele tem aptidão para outra área”, explicou, completando que, detectada essa distorção, busca-se realocá-lo. Reforçou ainda que na realidade tecnológica atual, há acessibilidade para todo ser humano, inclusive o autista. 

Carlos Augusto Cateb, presidente da Associação Profissionalizante do Menor (Assprom), lembrou que, em 48 anos, a entidade acolheu cerca de 150 mil adolescentes carentes, muitos com alguma limitação, oferecendo-lhes uma oportunidade no mercado de trabalho. “Temos 86 pessoas com deficiência trabalhando na Assprom e aprendendo, sentindo-se gente, como todos os outros funcionários”, deu seu depoimento. 

Por outro lado, lamentou que grande parte dos empresários se recusa a fazer esse mesmo acolhimento e defendeu campanhas de sensibilização para que isso mude. Cenário parecido, apontou ele, observa-se no serviço público, com raro acolhimento de PCDs.

Kelly Pires, técnica administrativa da Assprom, mãe e tia de autistas, reforçou as palavras de Cateb, ao dizer que a inclusão precisa ser mais efetiva, inclusive com contratação de mais pessoas qualificadas e capacitadas para lidar com os autistas.

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Depoimentos

O autista Arthur Campos, de 23 anos, deu seu depoimento, afirmando que trabalha há cinco anos na Asprom, nas áreas de atendimento e auxiliar de escritório. Ele já fez cursos de digitação, informática, atendimento, português e inglês. 

Gustavo Rocha, coordenador do projeto Montando um Time, defendeu a criação, por parte dos governos, de políticas de incentivo à inclusão do autista no mercado de trabalho. Pai de cinco filhos, sendo duas crianças autistas, afirmou que o problema da empregabilidade não o atinge diretamente, mas já o aflige, pois enfrentou dificuldades para colocar seus dois filhos na mesma escola dos outros irmãos.

Nessa perspectiva, Cynthia Abi Habib, da Associação da Síndrome de Asperger, afirmou ter encontrado uma fundação dinamarquesa que faz a ponte entre grandes empresas e pessoas com autismo dispostas a trabalhar. “A SAP tem interesse de incluir 1 milhão de autistas no mundo; também a Intel e o Itaú querem contratar”, declarou.

Cerca de 85% dos autistas estão fora do mercado

Carlos Calazans, superintendente regional do Trabalho e Emprego em Minas Gerais, disse que o órgão faz duas reuniões anuais com empresários de todos os setores para discutir o cumprimento das quotas de vagas para PCDs. Ele informou que, no País, 85% dos autistas, cerca de 1,7 milhão de pessoas, estão fora do mercado de trabalho. Além disso, 546 mil PCDs estão empregadas atualmente, sendo 341 mil homens e 204 mil mulheres. Em média, essas pessoas receberiam 20% menos que as sem deficiência.

O deputado Leleco Pimentel (PT) valorizou a audiência como meio de abordar relações éticas, humanas e das condições de sobrevivência das pessoas. “O mundo do trabalho é que nos dá a possibilidade de recorrer aos benefícios da Previdência Social e, antes de mais nada, de sermos reconhecidos nesse mercado”, avaliou.

Ao final da reunião, Cristiano Silveira anunciou requerimentos de providências a entidades diversas, a serem aprovados na próxima reunião. Vai solicitar ao Ministério do Trabalho a criação de um grupo de trabalho com o objetivo de estudar medidas a serem adotadas pelo governo federal para fomentar a empregabilidade de pessoas com autismo. Também solicitará à Fiemg e à Fecomércio a realização de campanhas de incentivo à contratação de pessoas com TEA pelas empresas.

“Os autistas têm hiperfoco e se dedicam muito quando descobrem qual é sua vantagem competitiva; é preciso conhecer as pessoas antes de dizer onde ela pode chegar.”
Grazielle Pinheiro
Representante do Coletivo Autistas Adultos e da Associação Unidas Pelo Autismo
Áudio
O desafio da inclusão no mercado de trabalho das pessoas com transtorno do espectro autista foi o tema da audiência pública da Comissão do Trabalho TV Assembleia

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