Lideranças indígenas alegam que os direitos incluídos na Constituição, agora ameaçados, custaram o sangue de milhares de guerreiros
Comissão promoveu audiência dentro da programação do Abril Indígena
Comunidades indígenas criticam a extinção de políticas para essas populações

ALMG lança frente em defesa de comunidades tradicionais

Lideranças indígenas e quilombolas denunciam desrespeito a direitos constitucionais arduamente conquistados.

08/04/2019 - 16:10

Sob a coordenação das deputadas Leninha (PT), Andréia de Jesus (Psol) e Ana Paula Siqueira (Rede) e do deputado André Quintão (PT), a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) lançou, nesta segunda-feira (8/4/19), a Frente Parlamentar de Defesa dos Povos Indígenas, Quilombolas e Demais Comunidades Tradicionais.

Em seguida, ainda dentro da programação do Abril Indígena no Parlamento mineiro, a Comissão de Direitos Humanos promoveu audiência pública sobre a situação dessa parcela da população no País.

O Abril Indígena tem a finalidade de divulgar a cultura e a tradição dos povos originários do Brasil e se firmou como um espaço de diálogo entre etnias, gestores públicos, o Poder Legislativo e entidades da sociedade civil.

Desmonte – Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Leninha destacou, em seu pronunciamento, o importante papel dos índios como guardiões de suas terras e da biodiversidade, em contraponto ao interesse comercial que parece comandar o restante da sociedade.

Ela reafirmou o compromisso da comissão e da frente parlamentar com as comunidades indígenas, principalmente neste momento em que, conforme pontuou, o governo federal promove o desmonte de políticas públicas que asseguram direitos conquistados com a promulgação da Constituição de 1988.

André Quintão ressaltou que a Assembleia apenas abraçou a criação da frente, ideia que partiu das próprias lideranças indígenas e quilombolas. “A frente, que terá uma atuação suprapartidária, surgiu em função de uma onda de retrocessos, como a Medida Provisória (MP) 870/19, que subordina órgãos ligados à questão indígena a quem tem outros propósitos. Etnias se tornaram vítimas de ataques que precisam de respostas”, explicou o deputado.

A MP, do presidente Jair Bolsonaro (PSL), que esvazia as atribuições da Fundação Nacional do Índio (Funai) e transfere para o Ministério da Agricultura a demarcação de terras indígenas, foi duramente criticada por todos os participantes da audiência.

Nesse sentido, Andréia de Jesus pontuou que as terras de índios e quilombolas estão constantemente envolvidas em disputas de poder com setores poderosos, como o agronegócio e a mineração.

Também apontando uma estratégia do novo governo de destruição de políticas sociais voltadas às comunidades tradicionais, Ana Paula Siqueira leu a carta de princípios da frente, que traz objetivos como a garantia de direitos territoriais desses povos, a valorização da sua diversidade, a preservação da sua cultura e a fiscalização das ações governamentais.

A carta de princípios da frente parlamentar conta com a assinatura de 29 deputados.

Lideranças indígenas elencam prioridades

Índios de diversas etnias, como Alexandre Pataxó, Sueli Maxakali, Paulo Tupiniquim e Domingos (Xacriabá), relataram seus temores com relação ao governo de Jair Bolsonaro, em especial no que diz respeito à demarcação de terras, à saúde e à educação indígenas.

Além da MP 870/19, o Executivo federal acenou com a extinção da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), que coordena estruturas de atendimento responsáveis pelo cuidado de cerca de 800 mil índios pelo País.

A intenção seria transferir aos Estados e, principalmente, aos municípios essa tarefa, nos locais em que eles estariam mais vinculados às áreas urbanas.

“Os direitos indígenas na Constituição custaram o sangue de milhares de guerreiros. Uma forma de exterminar a cultura indígena é tirar sua terra, é municipalizar a saúde, tirar a educação de dentro das aldeias”, desabafou o cacique Domingos.

A educação indígena enfrenta desafios como a falta de estrutura e de servidores. Segundo a deputada Ana Paula Siqueira, aproximadamente 4 mil crianças ainda estão sem aula em Minas Gerais.

Sucateamento – Representando a Funai, Pablo Camargo denunciou o sucateamento da instituição e também se mostrou crítico à municipalização da saúde indígena, o que, no seu entender, traria sérias dificuldades para o atendimento diferenciado a que eles têm direito.

Quanto à demarcação de terras, ele afirmou que a frente parlamentar pode atuar junto ao Governo do Estado para garantir a delimitação de áreas hoje pertencentes ao próprio Poder Executivo. Conforme informou, a população indígena em Minas hoje é de aproximadamente 30 mil pessoas, de cerca de 15 etnias.

Quilombolas enfrentam dificuldades semelhantes

Sandra Maria Andrade, diretora da Federação das Comunidades Quilombolas do Estado, salientou que o seu segmento também está apreensivo. Entre os principais problemas enfrentados, ela citou o fim do Ministério da Igualdade Racial, o esvaziamento da Fundação Cultural Palmares, o aumento do discurso de ódio, a interrupção da regularização de terras e a perda de profissionais do programa Mais Médicos nas comunidades.

Ritual – Antes do início da reunião, houve uma apresentação de um ritual indígena que emocionou o público presente. O vice-cacique Alexandre Pataxó presentou os parlamentares com lanças artesanais, em agradecimento pela mobilização em favor dos povos tradicionais. “A luta de indígenas e das demais comunidades tradicionais é uma só, porque o massacre é um só”, definiu.

Consulte o resultado da reunião.