Funcionários da Samarco e servidores do Sistema Estadual de Meio Ambiente, em greve há mais de 30 dias, participaram da audiência
Carlos Eduardo criticou a proposta da Samarco de construir novo dique em Bento Rodrigues
Rogério Correia colheu amostras da água no Rio Gualaxo e no dique S-3, em dias diferentes

MP afirma que política de segurança da Samarco é paliativa

Deputados receberam relatório com conclusões do Ministério Público sobre causas do rompimento de barragem em Mariana.

23/06/2016 - 16:59

As políticas de segurança adotadas pela mineradora Samarco são paliativas e apenas emergenciais, sem que se ofereça garantias ao risco inerente às atividades da empresa. Essa foi a posição defendida pelo Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) em reunião nesta quinta-feira (23/6/16) da Comissão Extraordinária das Barragens da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O objetivo do encontro foi discutir a tragédia provocada pelo rompimento da barragem de rejeitos de minério de Fundão, localizada no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana (Região Central).

A audiência pública atendeu a requerimento dos deputados Agostinho Patrus Filho (PV) e Rogério Correia (PT), respectivamente presidente e relator da comissão; e, ainda, João Magalhães (PMDB), Celinho do Sinttrocel (PCdoB), Cássio Soares (PSD), Gustavo Valadares (PSDB), Gustavo Corrêa (DEM), Thiago Cota (PMDB), Gil Pereira (PP), Bonifácio Mourão (PSDB) e a deputada Celise Laviola (PMDB).

O coordenador-geral das Promotorias de Meio Ambiente por Bacias Hidrográficas do Estado e coordenador do Núcleo de Resolução de Conflitos Ambientais (Nucam), Carlos Eduardo Ferreira Pinto, entregou à comissão cópia de um relatório técnico de conclusão a respeito das causas do rompimento da barragem. A ALMG foi a primeira instituição a receber o documento. Segundo ele, mais importante que apontar responsabilidades no caso, o relatório aponta para a construção de novas legislações, para que tragédias como essa não se repitam.

No relatório, critica-se, em especial, o tratamento que a Samarco dá às medidas de segurança na atividade mineratória. “A empresa transforma em situação emergencial a sua própria ineficácia”, destacou Carlos Eduardo. Ele disse que a disposição de rejeitos no futuro deve ter garantias de auditoria externa e de segurança. O promotor afirmou ainda que o MP não é favorável à construção de diques, medida cogitada pela Samarco, em visita recente feita por deputados à região atingida pela tragédia, como aposta principal da mineradora para impedir novo vazamento.

Carlos Eduardo também criticou, em especial, o dique S-4, proposta da empresa para Bento Rodrigues. “Quais alternativas técnicas a empresa oferece para a construção desse novo dique para que justifique esta ser a única alternativa para conter esse material?”, questionou.

O novo dique não alagaria a área onde se erguiam as casas de Bento Rodrigues, destruídas pela avalanche de lama que comprometeu toda a Bacia do Rio Doce até o Oceano Atlântico. Mas o lago, segundo os técnicos da Samarco, poderia chegar a até 10 metros dos restos da Capela de São Bento, de 1718, edificação de maior importância histórica do povoado.

Projeto de lei - O promotor contou, ainda, que, em 5 de julho, quando já terão sido finalizados os trabalhos referentes à tragédia de Mariana, o MP vai sugerir à Assembleia um projeto de lei para estabelecer padrões adequados de segurança para as barragens mineiras.

Segundo Carlos Eduardo, no relatório também critica-se o fato de ter não ter havido, quase oito meses após a tragédia, a retirada, em suas próprias palavras, “de nenhum metro cúbico” de rejeitos do local impactado. “Dizem que não fazem a retirada, pois não têm onde colocar. Mas é claro que têm. Só viabilizar um aterro e levar para lá os rejeitos”, ressaltou.

Ainda de acordo com Carlos Eduardo, as propostas de recuperação apresentadas pela empresa são sempre “genéricas” e voltadas para a bacia como um todo. “Não podemos tratar de questões apenas gerais, sem cuidar dos impactos locais”, frisou.

MP aguarda resposta em requisitos para retomada das atividades

O reinício das atividades da Samarco também foi discutido na reunião. “O caos social da paralisação da empresa é muito maior que o acidente em si”, afirmou Gustavo Corrêa. Para o deputado, o MP tem que criar força-tarefa para analisar o mais rápido possível essa retomada, que foi também cobrada por funcionários da mineradora presentes na reunião.

O promotor de Justiça do Nucam, Felipe Faria de Oliveira, afirmou que o reinício das operações depende “quase que inteiramente” da própria Samarco e de suas controladoras, as multinacionais da mineração Vale e BHP. “Os requisitos mínimos para essa volta já foram apresentados há mais de um mês e até hoje não obtivemos resposta”, afirmou.

Ainda de acordo com Felipe Faria, o MP não se coloca contrário à retomada das atividades. “Mas vemos a necessidade de adoção de medidas de segurança e de um cronograma de recuperação ambiental. Há ansiedade e precipitação”, avalia.

A assessora do Gabinete Adjunto da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Zuleika Torquetti, informou que a Samarco sequer apresentou, até o momento, pedido formal para essa retomada. “Não foi apresentada nenhuma documentação formal para a licença de operação para reinício das atividades”, reforçou.

Zuleika Torquetti afirmou que a Samarco vem falhando na apresentação de alternativas de intervenção na área afetada. “A empresa sempre apresenta soluções que ela mesma escolhe, sem dar possibilidade para nossa comissão técnica avaliá-las”, criticou.

Sobre o dique S-4, ela disse que é a questão mais delicada em todo o rol de soluções apresentadas. Segundo ela, até agora, não há documentação formalizada junto a órgãos ambientais para que se possa opinar sobre a sua construção.

Agilidade - A representante da Semad alertou, no entanto, que é preciso agir de modo rápido, uma vez que a contenção dos rejeitos precisa ser feita até o próximo período chuvoso, para que estes não sejam levados para fluxos de água e provoquem ainda mais danos ambientais e sociais.

A assessora lembrou, também, que, após a tragédia de Mariana, o Governo do Estado reuniu seus órgãos ambientais, de novembro de 2015 a abril de 2016, para que fossem debatidas medidas que evitem novos desastres. “Em nossa discussão, ficou evidente que é necessária mudança com relação a auditorias de segurança das barragens”, salientou.

Relatório da comissão será apresentado no dia 30 de junho

O deputado Rogério Correia contou que essa foi a última audiência pública antes da leitura do relatório final da comissão, no dia 30 de junho. Está acertado, também, que a aprovação desse relatório será no dia 7 de julho. “Foram cerca de sete meses trabalhando nessa questão”, pontuou o parlamentar. O deputado Agostinho Patrus Filho afirmou que o relatório será amplamente estudado e discutido com todos membros da comissão, antes de ser votado.

Rogério Correia adiantou ainda que uma das sugestões contidas no relatório será a proibição do tipo de barragem construída em Bento Rodrigues. “Será apresentado, em anexo ao relatório, um projeto de lei especificando que novas barragens devam ser feitas de concreto, que são mais caras, mas mais seguras. Além disso, o tratamento dos rejeitos terá que ser feito a seco”, afirmou.

Sobre a retomada das atividades, o parlamentar disse que a empresa deve, primeiro, apresentar um planejamento que privilegie a segurança. Ele reforçou, também, que a Samarco cometeu um crime e merece ser punida.

O parlamentar criticou, ainda, a ameaça de demissão de funcionários da mineradora. A empresa inicia, no dia 26 de junho, um programa de demissão voluntária (PDV). A meta é reduzir em 1,2 mil o número atual de trabalhadores, 3 mil. O prazo do PDV vai até julho. “A empresa teve lucro de quase R$ 4 bilhões em 2015. Com esse valor, não devia demitir ninguém”, destacou.

Entendimento - O deputado Thiago Cota disse que apoia um entendimento “de forma ágil” para que seja possível retomar com zelo as atividades da Samarco. A deputada Celise Laviola criticou a forma como está sendo feito o acolhimento pela empresa dos atingidos pela tragédia. “Os que mais precisam não estão recebendo o atendimento adequado”, ressaltou. Já a deputada Marília Campos (PT) criticou o fato de ainda não haver proposta adequada de limpeza e recuperação dos cursos d'água atingidos.

Também esteve presente na reunião o deputado Gustavo Valadares. Todos os participantes da audiência pública se solidarizaram com os funcionários da Samarco presentes na reunião, bem como com os servidores do Sistema Estadual de Meio Ambiente (Sisema), em greve há mais de 30 dias, também presentes na audiência.

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