PL PROJETO DE LEI 3231/2021
Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 3.231/2021
Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência
Relatório
De autoria do deputado Glaycon Franco, o Projeto de Lei nº 3.231/2021 determina que os hospitais, clínicas e postos de saúde que compõem a rede pública comuniquem formalmente ao Ministério Público casos de vestígios de maus-tratos contra a pessoa com deficiência.
O projeto foi distribuído às Comissões de Constituição e Justiça, de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência e de Saúde. Examinado preliminarmente pela Comissão de Constituição e Justiça, esta concluiu pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade da matéria na forma do Substitutivo nº 1, que apresentou.
Arquivada ao final da legislatura passada, conforme o art. 180 do Regimento Interno, a proposição foi desarquivada em atendimento ao Requerimento nº 35/2023, de autoria do deputado Lucas Lasmar, na forma do art. 180-A do mesmo diploma legal.
A pedido da Comissão de Defesa da Pessoa com Deficiência, a proposição foi baixada em diligência ao Ministério Público de Minas Gerais, para que especificasse quais dados deveriam constar da notificação a ele encaminhada, e à Secretaria de Estado de Saúde, para que informasse se há orientações para o preenchimento e encaminhamento de notificação ao Ministério Público.
Compete agora a esta comissão emitir o seu parecer, em cumprimento do disposto no art. 188, combinado com o art. 102, XX, do Regimento Interno.
Fundamentação
O projeto em análise visa exigir que os hospitais, clínicas e postos de saúde da rede pública do Estado comuniquem imediatamente ao Ministério Público, por meio de ofício, os casos suspeitos de ocorrência de maus-tratos contra pessoa com deficiência atendida pelas referidas unidades. A comunicação deverá conter o nome completo da vítima, a identificação do seu acompanhante e a cópia detalhada do boletim médico. A proposta também define as sanções em caso de descumprimento da exigência. O autor da proposição justifica a medida alegando que o poder público deve atuar de forma conjunta para implementar meios de prevenir e enfrentar a violência contra a pessoa com deficiência.
De acordo com o Ministério da Saúde1, há uma forte correlação entre violência e deficiência, seja pela contribuição da violência para a ocorrência de deficiência, seja pelo fato de pessoas com deficiência estarem mais expostas a sofrer violência. Um estudo dos casos de violência essas pessoas notificados em serviços de saúde no País2 estima que elas apresentam probabilidade 50% maior de sofrer violência, comparadas àquelas sem deficiência, uma vez que se encontram em maior vulnerabilidade nas relações de poder. Além disso, essas vítimas podem enfrentar mais dificuldades para comunicar os eventos devido às barreiras atitudinais, de comunicação e arquitetônicas ainda comuns na sociedade.
A notificação de casos de violência contra pessoas com deficiência é, portanto, um importante instrumento de proteção, contribuindo para trazer mais visibilidade a esse grave problema e para promover a adoção de medidas para o seu combate e prevenção. Desse modo, entendemos que a finalidade da proposta em análise é meritória. Porém, é necessário observar que a legislação já trata da notificação de violência contra esse público, tanto no âmbito dos serviços de saúde como órgãos externos à saúde.
Primeiramente, esclarecemos que todas as ocorrências de violências identificadas por serviços de saúde integram a Lista Nacional de Notificação Compulsória de Doenças, Agravos e Eventos de Saúde Pública (Anexo 1 do Anexo V da Portaria de Consolidação MS/GM nº 4, de 28/9/2017). Nos termos da portaria, notificação compulsória é a “comunicação obrigatória à autoridade de saúde, realizada pelos médicos, profissionais de saúde ou responsáveis pelos estabelecimentos de saúde, públicos ou privados, sobre a ocorrência de suspeita ou confirmação de doença, agravo ou evento de saúde pública” (art. 2º, VI, do Capítulo I do Anexo V). Ainda segundo a portaria, a notificação compulsória, independentemente da forma como é realizada, também deve ser registrada em sistema de informação em saúde e seguir o fluxo de compartilhamento entre as esferas de gestão do SUS estabelecido pelo Ministério da Saúde (art. 2º, VI, do Capítulo I do Anexo V).
Em segundo lugar, o art. 26 a Lei Federal nº 13.146, de 2015 – Lei Brasileira de Inclusão das Pessoas com Deficiência – assegura que os casos de suspeita ou de confirmação de violência contra a pessoa com deficiência sejam objeto de notificação compulsória pelos serviços de saúde públicos e privados à autoridade policial e ao Ministério Público, além dos Conselhos dos Direitos da Pessoa com Deficiência.
Em âmbito estadual, identificamos normas que tratam da notificação de violência contra públicos específicos. A Lei nº 15.218, de 2004, cria a Notificação Compulsória de Violência contra a Mulher, e a Lei nº 17.249, de 2007, cria a Notificação Compulsória da Violência contra o Idoso.
Em sua análise, a Comissão de Constituição e Justiça não identificou óbices constitucionais, porém avaliou necessário promover ajustes na proposta. A comissão considerou que o atendimento de pessoas com deficiência nos serviços de saúde não parece, a priori, apto a identificar episódios de maus-tratos, mas pode identificar eventuais indícios de violência contra elas. Além disso, observou que essência do comando do art. 1º do texto original já integra a Lei Brasileira de Inclusão. Assim, apresentou o Substitutivo nº 1, estabelecendo informações a serem encaminhadas pelos serviços de saúde ao Ministério Público do Estado, para que apure os casos de violência suspeita ou confirmada contra pessoa com deficiência.
Considerando que a legislação federal já prevê a notificação ao Ministério Público, pelos serviços de saúde, de casos de violência contra a pessoa com deficiência, e com a finalidade de obter informações que orientem a aplicação dessa medida pelos órgãos envolvidos, esta comissão baixou o projeto em diligência à Secretaria de Estado de Saúde e ao Ministério Público de Minas Gerais.
Em resposta, o Ministério Público do Estado manifestou o entendimento de que a proposta estadual acompanhasse as previsões da legislação federal, ampliando, portanto, a exigência de notificação para os serviços privados, além de determinar que a notificação seja feita a outros agentes de proteção. Considerou, ainda, que a comunicação deve conter os dados necessários à identificação da suposta vítima e do endereço para sua localização, para eventuais diligências posteriores, assim como os motivos ou elementos que levantaram suspeitas ou demonstraram a ocorrência de violência.
Avaliamos que a proposta da comissão que nos precedeu aprimorou a matéria. Porém, em face das informações prestadas em resposta à diligência solicitada, avaliamos oportuno efetuar modificações quanto à referência aos órgãos a serem notificados e aos dados a constarem da notificação. Para tanto, apresentamos ao final deste parecer o Substitutivo nº 2.
Conclusão
Em face do exposto, opinamos pela aprovação do Projeto de Lei nº 3.231/2021, no 1º turno, na forma do Substitutivo nº 2, a seguir redigido.
SUBSTITUTIVO Nº 2
Estabelece as informações a serem incluídas na notificação compulsória dos casos de suspeita ou confirmação de violência contra pessoa com deficiência, de que trata a Lei Federal nº 13.146, de 6 de julho de 2015.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – A notificação compulsória, pelos serviços de saúde públicos e privados, dos casos de suspeita ou de confirmação de violência praticada contra pessoa com deficiência, nos termos do art. 26 da Lei Federal nº 13.146, de 6 de julho de 2015, incluirá as seguintes informações:
I – identificação e endereço da pessoa com deficiência atendida;
II – identificação do acompanhante, se houver;
III – motivo do atendimento;
IV – descrição dos elementos que levaram à suspeita ou à comprovação de violência.
Art. 2º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Comissões, 2 de maio de 2023.
Dr. Maurício, presidente – Enes Cândido, relator – Doutor Paulo.
1BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Violência interpessoal contra pessoas com deficiência/transtorno no Brasil. In: Boletim Epidemiológico, v. 51, n. 46, Brasília, nov. 2020. Disponível em: <https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/boletins-epidemiologicos/edicoes/2020/boletim_epidemiologico_svs_46.pdf>. Acesso em: 20 abr. 2023.
2Mello, N.F. et al. Casos de violência contra pessoas com deficiência notificados por serviços de saúde brasileiros, 2011-2017. Epidemiologia e Serviços de Saúde. v. 30, n. 3. Disponível em: <https://scielosp.org/article/ress/2021.v30n3/e2020747/>. Acesso em: 20 abr. 2023.