Omissão do poder público estimula degradação da Serra do Elefante
Em visita da Comissão de Meio Ambiente a Mateus Leme, foram observados impactos ao solo e às águas na unidade de conservação e seu entorno.
A omissão da Prefeitura e da Câmara Municipal de Mateus Leme (Região Metropolitana de Belo Horizonte) está contribuindo para a degradação ambiental de várias áreas do Monumento Natural da Serra do Elefante. Em visita nesta sexta-feira (5/9/25), a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável pôde confirmar as irregularidades relacionadas ao uso e à ocupação do solo na região.
A atividade foi solicitada pela deputada Lohanna (PV), como desdobramento de audiência pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) sobre o tema em abril deste ano. Naquela ocasião, moradores e representantes de entidades fizeram denúncias de especulação imobiliária e tentativas de alteração de leis para ocupação da Zona de Amortecimento (ZA) da unidade.
Conforme apontado na reunião - e confirmado na visita -, empreendimentos imobiliários têm ocupado diversas áreas da Zona de Amortecimento, promovendo desmatamento e poluição, além de comprometer o equilíbrio do ecossistema. Tudo com o conhecimento do Executivo municipal, que estaria protelando o funcionamento de instâncias fundamentais para a normatização e fiscalização das atividades que promovem impacto ambiental na cidade.
A ZA é a área no entorno da Unidade de Conservação (UC) protegida por regras para a implantação de atividades econômicas. Enquanto a UC busca proteger o meio ambiente de seu território, a ZA faz o mesmo em relação ao bioma dos locais ao redor.
Licenciamento está com município
Em Mateus Leme, já foi feita a descentralização do licenciamento ambiental, o que dá ao município autonomia para fiscalizar e licenciar atividades, sem a necessidade de licença de órgãos estaduais e federais. Valendo-se disso, a prefeitura local, de acordo com membros da Associação Amigos da Serra do Elefante, estaria atrasando a reimplantação do Conselho Consultivo Municipal, inativo desde outubro de 2024. Entre outras atribuições, a instância é a responsável pela elaboração e aprovação do plano de manejo ambiental do município.
A presidente da associação, Virgínia Aguiar, detalhou que o Executivo até tentou criar o conselho, mas desrespeitando normas ambientais na elaboração do edital, o que levou a entidade a questionar judicialmente a medida. O vácuo na normatização está permitindo que vários empreendimentos imobiliários se instalem na ZA do Monumento Natural Serra do Elefante, sem nenhuma fiscalização municipal.
Liminar tenta barrar intervenções, mas empresas desobedecem
A primeira parada da visita foi em frente ao Condomínio Horizonte de Minas, com sua sede já em fase de construção em área da Zona de Amortecimento. Segundo Virgínia Aguiar, em função desse e de outros empreendimentos irregulares na região, a associação entrou com uma ação civil pública junto ao Ministério Público, no fim de 2023, embargando todas as intervenções. Como o condomínio tentou retomar as obras, a entidade conseguir barrá-las por meio de um mandado de segurança e de uma liminar, em janeiro de 2024.
O problema, de acordo com a associação, é que as empresas não têm respeitado as medidas judicais interpostas e continuam realizando intervenções, com a conivência da prefeitura. “O condomínio se aproveita de feriados prolongados para destruir e desmatar, abrindo estradas e descampando áreas”, disse Aguiar, acrescentando que moradores próximas denunciaram o uso do agrotóxico Roundup, à base de glifosato, para secar árvores.
Os participantes visitaram ainda o loteamento irregular Reservas da Serra, formado por 355 lotes de 200 m², autorizado pela prefeitura, apesar de também estar na ZA. Em ruas já traçadas, há casas sendo construídas e lotes com intervenções que precedem o início das obras, além de lixo em terrenos baldios e desmatamento generalizado.
Decreto da UC foi alterado
Durante a visita, a deputada Lohanna lembrou que, na audiência pública sobre o tema, o prefeito Renilton Coelho, ausente no evento, enviou carta afirmando que todos os empreendimentos locais estariam dentro da legalidade, uma vez que se situavam fora da UC.
No entanto, o documento da prefeitura foi contestado judicialmente por membros da Associação. Eles explicaram que o decreto original de criação do Monumento Natural Serra do Elefante previa uma área de 800 hectares e ainda, a ZA correspondente com perímetro de mais de 2,4 mil hectares. Em 2025, novo decreto municipal alterou a legislação para excluir a Zona de Amortecimento.
Em março deste ano, um acordo entre prefeitura e MP foi assinado para restaurar a área da unidade de conservação e restabelecer a zona de amortecimento.
Nascentes poluídas e erosão do solo
Em passagem por uma fazenda na ZA em processo de loteamento, a equipe da Comissão de Meio Ambiente constatou o desmate de áreas de preservação, traçado de novas estradas e construção de ponte sobre um córrego. De acordo com Alexandre Araújo, membro da Associação Amigos da Serra do Elefante, existem 38 nascentes catalogadas na área, das quais 20 estão poluídas.
Além disso, atividades que degradam o meio ambiente tanto na Zona de Amortecimento quanto na própria Unidade de Conservação vêm sendo realizadas com aval do poder público. Exemplos disso são a construção de pistas de voo de asa delta e de saltos de parapente, além de trilhas para motocross e downhill (forma de ciclismo que consiste em descer o mais rapidamente possível um dado percurso). A última etapa da visita se deu justamente nessas áreas, localizadas no alto da serra.
Devido à falta de normatização e fiscalização para o exercício das duas modalidades, observam-se vários trechos de erosão no terreno. Com a proximidade do período chuvoso, é possível que as áreas erodidas se transformem em vossorocas (grandes sulcos ou buracos no solo, formados por erosão onde há pouca vegetação).
Reunião no MP
Ao final da visita, a deputada Lohanna fez um balanço positivo da atividade. “Temos que dar um basta a esse processo, senão, essa área verde, uma das últimas preservadas na Região Metropolitana, será completamente antropizada”, disse. Uma área antropizada é aquela modificada pela ação humana.
Como encaminhamentos, a parlamentar propôs que o Ministério Público local realize uma perícia para verificar a veracidade da denúncia do uso de glifosato em árvores na ZA. Anunciou ainda que marcará uma reunião com o promotor local, Diego Dutra Oliveira, com a participação da Associação Amigos da Serra do Elefante, para tratar das irregularidades verificadas na visita.

