PL PROJETO DE LEI 276/2011

PROJETO DE LEI Nº 276/2011

Altera o art. 17 da Lei nº 14.309, de 19 de junho de 2002, que dispõe sobre as políticas florestal e de proteção à biodiversidade no Estado.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º - O "caput" e os incisos IV e V do art. 17 da Lei nº 14.309, de 19 de junho de 2002, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 17 - O proprietário ou possuidor de imóvel rural fica obrigado, se necessário, a recompor, em sua propriedade ou posse, preferencialmente, ou em outra situada na mesma bacia hidrográfica e no território do Estado, a área de reserva legal, podendo optar por um dos seguintes procedimentos:

(...)

IV - compensação da área de reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema, conforme critério estabelecido em regulamento;

V - aquisição de gleba não contígua e instituição de Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN -, condicionada a vistoria e aprovação do órgão competente;".

Art. 2º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Reuniões, 17 de fevereiro de 2011.

Paulo Guedes

Justificação: A partir da edição da Lei Federal nº 4.771, de 1965 - que contém o Código Nacional Florestal - a par do grande impulso que se dava à proteção das florestas e demais formas de vegetação, surgiram intensos debates e muito descontentamento em torno das questões florestais. Alguns segmentos julgavam-se prejudicados no exercício do direito de propriedade ao se instituírem as áreas de preservação permanente e de reserva legal na forma definida na lei. Às primeiras atribuiu-se, na prática, o conceito de intocabilidade, exceto em casos de utilidade pública ou relevante interesse social, já que são necessárias à proteção dos recursos hídricos e de processos ecológicos. À reserva legal, entendida como uma área com vegetação nativa calculada em 20% da área total de cada propriedade (fora da Região Amazônica), coube um regime de utilização limitada, proibido o corte raso. Se tal código fosse seguido à risca, certamente veríamos hoje o espetáculo de rios e lagoas marginados por protetoras matas ciliares, nascentes envoltas em vegetação nativa, topos de morro e encostas com coberturas florestais, tudo contribuindo para a manutenção dos ecossistemas e da boa qualidade das águas.

No entanto, não é esse o quadro com o qual deparamos, mormente no território mineiro, onde os nossos rios estão morrendo, intensamente poluídos, em meio à degradação generalizada nas bacias hidrográficas. Cada vez mais se devastam biomas como o da mata atlântica e o do cerrado, impactados pelas mais diversas atividades antrópicas como monoculturas extensivas, uso indiscriminado de agrotóxicos, pastagens, mineradoras, indústrias e seus efluentes tóxicos, descargas de esgotos nos corpos d'água e garimpos.

Constatado o avanço da degradação ambiental, é evidente que instrumentos como a Lei nº 14.309, de 2002, que estabelece a política florestal e de proteção à biodiversidade no Estado, consolidam diretrizes e instrumentos estabelecidos pelo Código Florestal, a exemplo da Reserva Legal, e tornam-se uma segura base sobre a qual o poder público e a sociedade em geral demandam ajustes, controle e execução de normas de proteção ambiental.

Assim, o conceito inicial de reserva legal, que servia quase que para o uso exclusivo do proprietário, dentro dos limites estabelecidos, passa a adquirir a conotação de um recurso ambiental necessário ao equilíbrio ecológico e à proteção da biodiversidade. Esse atual ponto de vista, a despeito de contrariar a ideia de se ter uma reserva estratégica para a exploração (sustentada) por parte do proprietário, tem merecido calorosas defesas e está, de fato, consolidado pelas modificações introduzidas na legislação florestal.

A Medida Provisória nº 2.166-67, de 24/8/2001, que altera dispositivos da Lei Federal nº 4.771, define reserva legal como "necessária ao uso sustentável dos recursos naturais" (passível de exploração, como por meio do manejo florestal sustentável) e "à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas". Corroboram seu valor estratégico para o equilíbrio ambiental as condições preconizadas para a sua localização, que deve ser decidida conforme os seguintes requisitos: aprovação pelo órgão ambiental estadual competente; cumprimento da função social da propriedade; adequação aos seguintes critérios e instrumentos, quando houver: plano de bacia hidrográfica; plano diretor municipal; zoneamento ecológico-econômico; outras categorias de zoneamento ambiental; proximidade com outra reserva legal, área de preservação permanente, unidade de conservação ou outra área legalmente protegida.

É bom lembrar que essas são normas gerais, que balizam a legislação estadual, que deve, certamente, complementá-las, mas não contrariá-las frontalmente ou liberalizá-las demasiadamente. O documento federal prevê, também, a possibilidade de recomposição da reserva legal, quando não houver a correspondente cobertura nativa nas áreas reservadas para tal. São várias as opções, de acordo com critérios estabelecidos pelo órgão ambiental competente: recomposição, pelo proprietário ou possuidor de imóvel rural, da reserva legal mediante plantio, a cada três anos, de no mínimo 1/10 da área total necessária à sua complementação, com espécies nativas; condução da regeneração natural da reserva legal; compensação da reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na mesma microbacia. Essa última determinação poderá ser abrandada, se necessário, na forma indicada pelo § 4º do art. 44 do Código Florestal, ou seja: "Na impossibilidade de compensação da reserva legal dentro da mesma microbacia hidrográfica, deve o órgão ambiental estadual competente aplicar o critério de maior proximidade possível entre a propriedade desprovida de reserva legal e a área escolhida para compensação, desde que na mesma bacia hidrográfica e no mesmo Estado, atendido, quando houver, o respectivo plano de bacia hidrográfica (...)”.

A Lei Florestal mineira (Lei n° 14.309, de 2002), considerando as peculiaridades de nosso Estado e procurando atender à dinâmica das atividades rurais, criou, no seu art. 17, possibilidades novas para a recomposição, considerando-se sempre a correspondência com o total da área de reserva legal ou da área a ser reconstituída e a vistoria e a aprovação do órgão competente, nas seguintes formas: implantação e manejo de sistemas agroflorestais; isolamento total da área a ser recomposta e adoção de técnicas adequadas à condução de sua regeneração; aquisição e incorporação à propriedade rural de gleba contígua correspondente à da reserva legal a ser recomposta; compensação da área de reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na mesma microbacia, conforme critérios estabelecidos em regulamento; aquisição de gleba não contígua, na mesma bacia hidrográfica, e instituição de Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN -; aquisição, em comum com outros proprietários, de gleba não contígua e instituição de RPPN, cuja área corresponda à área total da reserva legal de todos os condomínios ou co- proprietários; aquisição de cota de Certificado de Recomposição de Reserva Legal - CRRL - de Reserva Particular de Recomposição Ambiental - RPRA -, em quantidade correspondente à área a ser reconstituída.

Como se pode constatar, pelo exposto nos itens VI e VII, a não referência ao âmbito geográfico delimitado para os respectivos critérios de recomposição dá margem para a interpretação de que pode haver recomposição em áreas situadas fora da bacia hidrográfica onde se localizam os imóveis rurais com reservas legais deficitárias. Ao que tudo indica, essa posição já está sendo acatada pelo Instituto Estadual de Florestas - IEF -, que é o órgão competente para a gestão das questões florestais no Estado. Tal abertura preocupa, pois pode ignorar a destinação ecológica de tais áreas na necessária conservação da biodiversidade, da flora e da fauna, com repercussão negativa para a proteção dos ecossistemas.

Entende-se que cada bacia hidrográfica responde naturalmente por características ecológicas específicas, próprias aos ecossistemas ali desenvolvidos. Se em determinada bacia hidrográfica, por diversos motivos, inclusive pela exploração agrícola e pela atividade agropecuária, falta a vegetação nativa das reservas legais, a sua recomposição fora da bacia ou em outras regiões de diferentes biomas em nada contribui para a recuperação e proteção do ecossistema original já atingido. Perpetuam-se, assim, os casos de degradação já existentes. Não se pode, por exemplo, proteger áreas do cerrado, em detrimento da recuperação de parcelas da mata atlântica em áreas protegidas em lei.

São considerações como essas que levaram os participantes do fórum técnico "Cerrado Mineiro: Desafio e Perspectivas", promovido pela Assembleia Legislativa, a aprovarem a proposta de que deve ser evitado que as reservas legais sejam compensadas fora da mesma bacia hidrográfica. O escopo do projeto de lei ora apresentado é exatamente garantir que a recomposição das áreas de reserva legal pelos critérios já definidos se dê obrigatoriamente dentro da mesma bacia hidrográfica onde se situam as propriedades deficitárias, independentemente da análise e da aprovação do órgão ambiental. Dessa forma, o que estamos propondo é apenas o cumprimento das diretrizes já existentes na legislação federal, que devem prevalecer ante a legislação estadual. Entendemos a primeira como o fórum legítimo para a edição da norma geral, base sobre a qual a segunda deve se apoiar, complementando-a, no que for pertinente, mas não confrontando-a diretamente, nos seus princípios e diretrizes básicas. Com isso, estaremos fortalecendo esse que é ainda um dos poucos instrumentos com os quais o Estado pode, de fato, intervir para garantir a efetiva proteção dos nossos recursos ambientais.

Originária do Projeto de Lei nº 1.829/2004, esta proposição incorpora as alterações propostas no processo de tramitação, em especial as emendas feitas pela Comissão de Constituição e Justiça.

- Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça e de Meio Ambiente para parecer, nos termos do art. 193, c/c o art. 102, do Regimento Interno.