PL PROJETO DE LEI 2955/2012

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 2.955/2012

Comissão de Minas e Energia

Relatório

De autoria do Deputado Antônio Carlos Arantes, o projeto de lei em epígrafe dispõe sobre a outorga coletiva do direito de uso de recursos hídricos e dá outras providências.

Publicada no "Diário do Legislativo" de 15/3/2012, foi a proposição distribuída às Comissões de Constituição e Justiça e de Minas e Energia. A Comissão de Constituição e Justiça, em sua análise prévia da proposição, concluiu por sua juridicidade, constitucionalidade e legalidade na forma do Substitutivo nº 1, que apresentou.

Cumpre agora a esta Comissão emitir o seu parecer, nos termos do art. 188, combinado com o art. 102, XVIII, do Regimento Interno.

A requerimento do Deputado autor do projeto, aprovado em Plenário no dia 24/10/2012, a matéria será encaminhada em seguida à Comissão de Política Agropecuária e Agroindustrial, que também emitirá parecer quanto ao mérito.

Fundamentação

O projeto de lei em exame discorre sobre instrumentos de participação social na gestão de recursos hídricos, alçando ao ordenamento legal dispositivos sobre outorga coletiva de direito de uso de recursos hídricos, alocação negociada de água, sazonalidade da outorga e parceria público-privada em obras de uso múltiplo de águas. Conforme justificação que acompanha o projeto de lei, os dispositivos têm como base as discussões e demandas apresentadas na elaboração do Plano Estadual de Agricultura Irrigada de Minas Gerais - PAI-MG - e na atualização do Plano Estadual de Recursos Hídricos, ambos de 2011.

A Comissão de Constituição e Justiça, em análise preliminar, baixou o projeto em diligência à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável - Semad - e ao Instituto Mineiro de Gestão das Águas - Igam -, inquirindo-os sobre a adequabilidade do projeto às políticas públicas de gestão de recursos hídricos praticadas pelo Estado. Findo o prazo para o envio da resposta à diligência, a referida Comissão optou por aprovar parecer concluindo pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do projeto de lei na forma do Substitutivo nº 1, que propôs. Esse substitutivo realiza ajustes em dispositivos do projeto quanto à juridicidade e à técnica legislativa e o reconstitui estruturalmente na forma de um projeto de lei modificativo das Leis nºs 13.199, de 1999, que dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos, e 14.868, de 2003, que dispõe sobre o Programa de Parcerias Público-Privadas do Estado de Minas Gerais.

O projeto de lei foi, em seguida, encaminhado a esta Comissão para parecer quanto ao mérito. Nesse ínterim, chegou a esta Casa a resposta da Semad à diligência, analisando o projeto de lei em sua forma original. A diligência apresenta vários questionamentos quanto à compatibilidade do projeto de lei com as políticas públicas atualmente executadas por essa Secretaria. Alguns desses questionamentos foram reparados pelo Substitutivo nº 1, da Comissão de Constituição e Justiça, enquanto outros serão tratados neste parecer.

O Substitutivo nº 1, conforme se depreende de sua nova ementa, leva em conta o fato de a proposição não ser um projeto estrito de criação de um instrumento autônomo de outorga coletiva do direito de uso da água, mas, sim, um aprimoramento da política de recursos hídricos já existente, do qual a outorga coletiva seria parte, assim como a alocação negociada da água, a sazonalidade da outorga e a parceria público-privada para obras de uso múltiplo de águas. Dessa forma, mantém-se a unidade do ordenamento jurídico da gestão das águas e das parcerias público-privadas, não se criando instrumentos paralelos aos já existentes.

Os dispositivos de outorga coletiva e alocação negociada de uso da água remetem a práticas atualmente executadas pela Agência Nacional de Águas e por vários Estados, inclusive por Minas Gerais. Trata-se de um método de negociação e de alocação da água em situações de conflito ou escassez iminente, conciliando otimização do uso múltiplo de águas e legitimidade social. Todavia, tais práticas ainda carecem de base normativa. Ao incorporar a previsão legal desses instrumentos na Lei nº 13.199, de 1999, o Substitutivo nº 1 os valoriza e traz estabilidade e segurança jurídica para a continuidade de sua aplicação. Por tratar-se de uma previsão legal, abstrata e relacionada estritamente à definição conceitual, mantém-se o caráter discricionário necessário para que o Poder Executivo exerça sua competência reguladora infralegal.

Reconhecendo a importante contribuição da Comissão de Constituição e Justiça para o aprimoramento do projeto de lei, mas atentando para a necessidade de adequação das demais questões apresentadas na resposta da Semad à diligência, propomos o Substitutivo nº 2. Esse novo substitutivo incorpora o texto do Substitutivo nº 1, porém acrescenta as modificações a seguir apresentadas. Em primeiro lugar, atendendo à sugestão da diligência da Semad, reajustamos o texto proposto a fim de que a outorga a pessoa jurídica composta por usuários de água (como associações e cooperativas) seja apenas uma das opções possíveis decorrentes da alocação negociada do uso da água.

Na definição de alocação negociada, também atendemos à sugestão de que a área de conflito não seja delimitada apenas como sub-bacia. Dessa forma, caberá à instância competente decidir se utilizará a delimitação por bacia hidrográfica, aquífero, trecho de rio de preservação permanente ou outro critério pertinente, trazendo maior flexibilidade para sua instalação. De forma análoga, também nos coadunamos com a resposta da diligência ao tornarmos mais flexível a definição da disponibilidade da água, de modo a não estabelecer se será usada a vazão ou o volume como critério de avaliação.

Em virtude da posição, expressa nessa resposta, de frisar a não adoção da outorga sazonal como modalidade de outorga para o Estado, optamos pela retirada desse dispositivo do projeto de lei.

O art. 4º do projeto de lei utilizava os termos “compensação”, “ajuste compensatório” e “regularização”, que poderiam ser interpretados de forma ambígua, ora referindo-se à vazão dos rios, ora aos custos para adequação legal do usuário de água junto ao órgão de gestão dos recursos hídricos. A segunda interpretação, referente aos custos de adequação, foi questionada na resposta à diligência. De forma a corrigir essa ambivalência conceitual no projeto de lei, substituímos o termo “regularização” por “incremento de vazão” e os termos “compensação” e “ajuste compensatório” por “ajuste de vazão outorgada”.

Ainda em referência ao art. 4º do projeto de lei original, a resposta à diligência observa que, para que houvesse compensação financeira quanto à cobrança pelo uso da água, seria necessário que essa possibilidade já tivesse sido proposta pelo comitê de bacia, no processo de aprovação da metodologia de cobrança para a respectiva bacia hidrográfica, nos termos da legislação vigente. De forma a tornar essa possibilidade coerente com o arcabouço normativo, movemos essa previsão para o art. 25 da Lei nº 13.199, de 1999, o qual especifica os critérios da metodologia de cobrança que será realizada pelos comitês. Também acrescentamos que o comitê deve aprovar previamente o investimento do usuário, trazendo maior controle social e segurança contábil ao procedimento.

No que toca ao termo de rateio das obras de uso múltiplo, compartilhamos a posição da resposta à diligência de que ao Estado não cabe intervir com sanções em contratos firmados entre particulares. Tal ação feriria o princípio da relatividade dos efeitos do contrato, o qual estatui que a avença (termo de rateio) vincula apenas as partes que nela intervieram, não aproveitando a terceiros. De forma a tornar o dispositivo adequado aos princípios do direito contratual, consideramos necessário prever que as sanções especificadas no texto legal apenas poderão ser aplicadas nos casos em que o poder público for participante do termo de rateio. Tal alteração não prejudica a intenção original do projeto de trazer um ambiente de maior segurança jurídica para as parcerias público-privadas em obras de uso múltiplo das águas.

Por fim, em uma análise geral, consideramos que as questões levantadas pela Semad foram fundamentais para o aprimoramento do projeto. Suas observações, que levaram à apresentação do Substitutivo nº 2, corrigem aspectos importantes do projeto de lei e possibilitam uma maior harmonia com as políticas públicas atualmente executadas pelo Estado.

Conclusão

Em face do exposto, somos pela aprovação do Projeto de Lei nº 2.955/2012 na forma do Substitutivo nº 2, a seguir redigido. Com a aprovação do Substitutivo nº 2, fica prejudicado o Substitutivo nº 1, da Comissão de Constituição e Justiça.

SUBSTITUTIVO Nº 2

Altera a Lei nº 13.199, de 29 de janeiro de 1999, que dispõe sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos, e a Lei nº 14.868, de 16 de dezembro de 2003, que dispõe sobre o Programa Estadual de Parcerias Público-Privadas.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º - Ficam acrescentados à Lei nº 13.199, de 29 de janeiro de 1999, os seguintes arts. 18-A e 22-A, o inciso X do art. 25, os §§ 3º, 4º e 5º do art. 30 e, na Subseção VIII - Do Rateio de Custos das Obras de Uso Múltiplo de Interesse Comum ou Coletivo -, o art. 30-A:

“Art. 18-A - Nas áreas de conflito, será adotada a alocação negociada do uso de recursos hídricos.

§ 1º - Para os fins desta lei, considera-se:

I - área de conflito a área demarcada pelo poder público mediante constatação técnica de que a demanda pelo uso de recursos hídricos é superior à disponibilidade para a outorga de direito de uso;

II - alocação negociada do uso de recursos hídricos o procedimento participativo por meio do qual se pactua proposta relativa aos direitos de uso múltiplo das águas entre os usuários de um sistema hídrico.

§ 2º - Na alocação negociada, poderá ser pactuada a concessão de outorga de direito de uso de recursos hídricos a pessoa jurídica composta por usuários interessados, os quais administrarão coletivamente o uso da vazão outorgada.

(...)

Art. 22-A - O poder público poderá acordar ajustes na vazão outorgada em benefício dos usuários que realizarem investimentos que levem ao incremento da disponibilidade de recursos hídricos.

(...)

Art. 25 - (…)

X - a compensação financeira dos usuários relativa a investimentos, previamente aprovados pelo comitê de bacia, que levem ao incremento da disponibilidade de recursos hídricos.

(...)

Art. 30 - (…)

§ 3º - O rateio dos custos inerentes às obras de uso múltiplo de recursos hídricos, de interesse comum ou coletivo, quando celebrado entre particulares e o poder público, será firmado por meio de termo de rateio que especificará as obrigações dos usuários beneficiários e as sanções a eles aplicadas nos casos de inadimplência ou descumprimento dos deveres acordados.

§ 4º - Entre as obrigações a que se refere o § 3º, inclui-se o rateio dos custos de implantação, manutenção e modernização dos serviços e das infraestruturas coletivos.

§ 5º - No termo de rateio a que se refere o § 3º, constarão expressamente as sanções por inadimplência ou descumprimento dos deveres nele acordados, as quais consistirão, de acordo com a gravidade da infração, em:

I - advertência;

II - multa em percentual previamente definido;

III - suspensão da outorga do direito de uso de recursos hídricos e do acesso aos serviços e infraestruturas coletivos;

IV - rescisão unilateral do termo de rateio.

Art. 30-A - Para os fins desta lei, entendem-se como obras de uso múltiplo de recursos hídricos aquelas destinadas à implantação, à manutenção e à modernização de infraestruturas de reserva e distribuição de água, com o objetivo de incrementar a disponibilidade dos recursos hídricos para fins econômicos e sociais, de forma a beneficiar coletivamente os usuários e a assegurar a manutenção dos ecossistemas.

Parágrafo único - Entre as obras de uso múltiplo, incluem-se:

I - barramentos e seus reservatórios;

II - transposição de bacias;

III - infraestruturas de reúso das águas;

IV - perímetros de irrigação;

VI - demais infraestruturas coletivas que beneficiem mais de um usuário dos recursos hídricos.”.

Art. 2º - Fica acrescentado ao “caput” do art. 5º da Lei nº 14.868, de 16 de dezembro de 2003, o seguinte inciso VII:

“Art. 5º - (...)

VII - as obras de uso múltiplo de recursos hídricos, nos termos dos arts. 30 e 30-A da Lei nº 13.199, de 29 de janeiro de 1999.”.

Art. 3º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Comissões, 13 de dezembro de 2012.

Sávio Souza Cruz, Presidente - Carlos Henrique, relator - Antônio Carlos Arantes - Zé Maia.