PL PROJETO DE LEI 2580/2011

Parecer para o 1º Turno do Projeto de Lei Nº 2.580/2011

Comissão de Constituição e Justiça

Relatório

De autoria do Deputado Pompílio Canavez, o Projeto de Lei nº 2.580/2011 “institui no âmbito do Estado políticas públicas de equidade de gênero, objetivando coibir práticas discriminatórias nas relações de trabalho urbano e rural, bem como no âmbito dos entes de direito público externo, das empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias, e dá outras providências”.

Publicado no “Diário do Legislativo” de 20/10/2011, o projeto foi distribuído às Comissões de Constituição e Justiça e de Direitos Humanos, nos termos do art. 188 do Regimento Interno.

Cumpre-nos, preliminarmente, examinar a proposição nos seus aspectos de juridicidade, constitucionalidade e legalidade, nos termos do art. 102, III, “a”, do mencionado Regimento.

Fundamentação

O objetivo do projeto em análise é estabelecer direitos, normas, mecanismos e sanções destinados a conferir efetividade ao princípio constitucional da igualdade, estabelecido na Constituição da República, amparando-se na Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, na Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, na II Conferência Mundial contra o Racimo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Conexas de Intolerância, na Convenção 111 da Organização do Trabalho e nas demais normas pertinentes à igualdade ratificadas pelo Brasil.

De acordo com a justificação do projeto, a finalidade da iniciativa é prevenir e coibir quaisquer práticas discriminatórias lesivas à dignidade das mulheres, de modo a garantir que a sua crescente inserção no mercado de trabalho ocorra em respeito às especificidades da condição feminina.

Percebe-se, portanto, que a proposição em análise tem o meritório escopo de fazer cumprir as diretrizes delineadas no texto da Carta Federal e demonstra um nítido pendor de preocupação social. Há de se considerar, no entanto, que o projeto possui alguns vícios jurídicos que podem ser contornados por meio de substitutivo ao final apresentado.

Primeiro, porque, em fidelidade ao pacto federativo delineado em nossa Constituição, o poder constituinte originário determinou competências específicas para cada ente federativo. No caso da temática em tela, qual seja o Direito do Trabalho, o art. 22, inciso I, da Constituição da República determina ser matéria sobre a qual somente a União pode legislar, não podendo os Estados elaborar normas legais sobre o assunto. Desse modo, o conteúdo dos arts. 7º, 8º e 19 do projeto ultrapassam os limites da competência legislativa do Estado. Também os dispositivos 20 e 22 do projeto - que tratam, respectivamente, da obrigação do Poder Executivo de criar um selo distintivo destinado às empresas e Municípios que se destaquem na aplicação de políticas de igualdade de tratamento e oportunidade para trabalhadoras e trabalhadores e da criação de um Cadastro de Empregadores Responsáveis por Atos Discriminatórios, relativo ao cumprimento de obrigações trabalhistas – têm como pressuposto a análise de matérias que fogem à esfera de competência estadual.

Segundo, quanto às disposições relativas ao assédio moral (arts. 23 e 24), ressaltamos que foi promulgada no Estado a Lei Complementar nº 116, de 2011, que dispõe sobre a prevenção do assédio moral na administração pública estadual. Da perspectiva jurídico-constitucional, a citada lei conforma-se aos limites da competência legislativa do Estado, na medida em que versa sobre matéria de direito administrativo, mais precisamente sobre servidores públicos, os quais poderão vir a ser responsabilizados pela prática de assédio moral no âmbito da administração pública estadual.

Terceiro, porque a Constituição da República já contém uma série de dispositivos que asseguram os fins visados pelo projeto: é o caso do "caput" do art. 5º ("Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade[...]".) e de seus incisos I ("homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição") e XLII ("a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei"); do "caput" do art. 7º, que garante a trabalhadores urbanos e rurais os mesmos direitos, e de seus incisos XXX ("proibição de diferenças de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil"), XXXI ("proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência"), XXXII ("proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos") e XXXIV ("igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso"). Vale lembrar que todos os direitos e garantias têm aplicabilidade imediata, por força do art. 5º, § 1º, da Constituição da República. Nesse sentido, cabe destacar que os arts. 2º e 3º do projeto não trazem inovações substanciais em relação ao regramento constitucional. Acrescente-se que especialistas advertem para o fato de que o cumprimento efetivo do comando constitucional em análise exige medidas que estão além do campo legislativo, relacionadas à diminuição das desigualdades de renda e a mudanças de aspectos culturais.

Em quarto lugar, cabe ainda ressaltar que cumpre à União, na qualidade de representante da República Federativa do Brasil, manter relações com outros Estados estrangeiros, por meio da celebração de tratados internacionais (art. 21, I, da CRFB). Ressalte-se que as três convenções citadas no art. 1º do projeto já foram incorporadas ao direito interno brasileiro, tornando-se aplicáveis no Brasil e obrigando, portanto, todos os entes da Federação. Seria, portanto, desnecessário repetir comandos já previstos na legislação integrada ao nosso ordenamento, tal como ocorre em relação a dispositivos do art. 3º do projeto, que seguem as diretrizes do art. 11 da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres.

Por fim, cabe ressaltar que está em tramitação no Congresso Nacional projeto de lei com o mesmo objetivo do projeto em análise. Trata-se do Projeto de Lei nº 136/2011, de autoria do Senador Inácio Arruda, que cria mecanismos para prevenir, coibir e punir a discriminação contra a mulher, estabelecendo medidas de proteção e garantias de igual oportunidade de acesso, permanência e remuneração nas relações de trabalho no âmbito rural e urbano.

Apesar das considerações acima, é necessário destacar que a matéria certamente tem clara preocupação social, razão pela qual apresentamos, em seguida, substitutivo que busca preservar a intenção original do autor. Para fins de sistematização da matéria, introduziremos as modificações na Lei 11.039, de 1993, que impõe sanções a firma individual e a empresa jurídica de direito privado em cujo estabelecimento seja praticado ato vexatório, discriminatório ou atentatório contra a mulher e dá outras providências.

Conclusão

Pelo exposto, concluímos pela juridicidade, constitucionalidade e legalidade do Projeto de Lei nº 2.580/2011, na forma do Substitutivo nº 1, a seguir.

SUBSTITUTIVO Nº 1

Altera a Lei nº 11.039, de 1993, que impõe sanções a firma individual e a empresa jurídica de direito privado em cujo estabelecimento seja praticado ato vexatório, discriminatório ou atentatório contra a mulher e dá outras providências.

A Assembleia do Estado de Minas Gerais decreta:

Art. 1º - A Lei 11.039, de 1993, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 4-A:

“Art. 4º-A - Cabe ao Estado criar mecanismos, políticas públicas e ações positivas visando acelerar a igualdade de fato entre mulheres e homens, bem como prevenir, coibir e eliminar todas as formas de discriminação contra as mulheres.

§ 1º - Para efeito do disposto no “caput” deste artigo, serão instituídas políticas bem como programas e ações:

I - de enfrentamento do sexismo, do racismo e da violência em face da orientação sexual, para assegurar a incorporação da perspectiva de raça, etnia e orientação sexual nas políticas públicas direcionadas às mulheres;

II - de inclusão da perspectiva de gênero nas políticas públicas relacionadas às mulheres.

§ 2º - As ações assecuratórias do princípio da igualdade entre mulheres e homens decorrentes do previsto no “caput” deste artigo incidirão sobre os processos seletivos e sobre os critérios de avaliação, formação e capacitação profissional, inclusive para efeito de promoção e exercício de cargos de direção, de confiança, de chefia ou gerência, nas relações de trabalho, vedada toda e qualquer forma de preterimento e discriminação.

§ 3 - Considera-se prática de discriminação indireta aquela que, por atitude, critério, disposição ou norma interna, mesmo que aparentemente neutros, coloque trabalhadoras e trabalhadores em situação de desvantagem, em comparação, ressalvados os atos que se justifiquem pelo exercício de diferentes funções na hierarquia da empresa ou como ação positiva adotada para compensar situação desigual e alcançar a igualdade de tratamento.”.

Art. 2º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Comissões, 19 de junho de 2012.

Sebastião Costa, Presidente - Bruno Siqueira, relator - Luiz Henrique - Duarte Bechir - André Quintão.