Trabalhadores, familiares e amigos das vítimas lotaram a galeria do Plenarinho IV da Assembleia e pediram justiça
Relator destacou o caráter coletivo e colaborativo do documento
A emoção marcou a leitura dos nomes dos mortos na tragédia

Emoção marca entrega de relatório da CPI da Barragem

Parentes das vítimas chegaram às lágrimas ao ouvirem nomes de mortos e desaparecidos na tragédia provocada pela Vale.

12/09/2019 - 16:35

Familiares das vítimas do rompimento da Barragem B1, da Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho (Região Metropolitana de Belo Horizonte), se comoveram às lágrimas, nesta quinta-feira (12/9/19), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), ao ouvirem a leitura dos nomes dos 270 mortos na tragédia.

O fato ocorreu durante a reunião de encerramento dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Barragem de Brumadinho que, após seis meses de investigações, aprovou seu relatório final. Durante a reunião, foi lida uma síntese do documento. A íntegra, de cerca de 340 páginas, será entregue à Mesa da Assembleia e publicada oficialmente na próxima semana.

A própria deputada Beatriz Cerqueira (PT), que fez a leitura dos nomes, como homenagem póstuma da comissão, comoveu-se várias vezes e encerrou sua fala aos prantos. Os nomes foram ouvidos atentamente e com reverência, também, pelos demais parlamentares que compunham a mesa e outros que participaram da reunião.

Com faixas, fotografias e camisetas alusivas à tragédia, considerada criminosa pelos membros da CPI, os familiares das vítimas lotaram a sala de reunião e a galeria do Plenarinho IV. A eles, somavam-se vereadoras da Capital, líderes comunitários e militantes de movimentos sociais, como o dos trabalhadores sem terra (MST) e o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

A presença mais marcante, contudo, era dos integrantes da Associação dos Familiares das Vítimas de Brumadinho (Avabrum).

A reunião foi aberta pelo presidente da comissão, deputado Gustavo Valadares (PSDB), que em seguida passou a palavra ao relator, deputado André Quintão (PT). Após a leitura da síntese do relatório, ele agradeceu ao presidente da Assembleia, deputado Agostinho Patrus (PV), pelo apoio dado à CPI, e aos colegas do Parlamento, ao corpo técnico da Casa e aos funcionários de gabinete, que auxiliaram na elaboração do documento, destacando o caráter coletivo na construção da peça.

“Conseguimos fazer um trabalho colaborativo, separando questões partidárias e secundárias”, afirmou André Quintão, acrescentando que, a partir de agora, “quem vai avaliar o relatório serão os demais parlamentares, que vão votar, e a sociedade”.

O relator agradeceu também “as instituições parceiras, os movimentos sociais e a imprensa e seus profissionais, que retrataram os trabalhos de maneira fidedigna”. O agradecimento especial dedicou às famílias das vítimas e aos trabalhadores da Vale que colaboraram e acompanharam o trabalho da CPI.

“Foi um trabalho isento, técnico, fundado em oitivas, documentos e análises, mas que teve também enorme envolvimento emocional e afetivo”, disse, afirmando que a Assembleia, agora, vai criar uma instância de grupo de trabalho para acompanhar as recomendações.

“Fizemos o melhor e o mais justo, inclusive identificando a responsabilidade do ex-presidente da Vale e seus diretores e queremos externar nossa total solidariedade às famílias das vítimas. Foi um relatório inspirado no sofrimento. Que essa tragédia criminosa não volte a ocorrer”, disse.

Com mais de 110 recomendações, o relatório aponta para a responsabilização penal da direção da Vale e de vários colaboradores, sob a alegação de dolo eventual, porque “tinham ciência do risco e ainda assim se conformaram com sua ocorrência”.

O presidente da CPI, deputado Gustavo Valadares, parabenizou o relator pelo “excepcional trabalho”, destacando a competência da Consultoria e da Assessoria da Assembleia.Também agradeceu a constante presença dos familiares ao longo dos trabalhos, manifestando a solidariedade de todos os membros da comissão. “Tudo o que fizemos foi por conta da presença constante de vocês”, disse.

Relatório foi considerado “marco histórico”

“Foi um marco histórico nessa Casa”, disse, sobre o relatório, o vice-presidente da comissão e primeiro signatário do requerimento que levou à instalação da CPI, deputado Sargento Rodrigues (PTB). Ele também agradeceu aos colegas e ao corpo técnico da Casa e citou os nomes de alguns envolvidos na tragédia presentes à reunião, entre eles o sobrevivente Sebastião Gomes.

O parlamentar também fez questão de citar os nomes dos indiciados, “criminosos e assassinos” em suas palavras, afirmando que eles mereceriam a pena de morte, se ela fosse legalizada no País. “O que me moveu o tempo todo nesse trabalho foi a dor de vocês”, disse, dirigindo-se aos parentes das vítimas e pedindo que se mantenham mobilizados. “Não podemos deixar que essa tragédia criminosa perpetrada pela Vale, reincidente, caia no esquecimento”, afirmou.

A deputada Beatriz Cerqueira (PT) considerou “exímio” o relatório e sua apresentação, fruto de construção coletiva. Defendeu a continuidade da luta e o enfrentamento aos projetos minerários predatórios e ressaltou a importância de se cuidar da memória das vítimas, alegando que “quando a gente não sente a dor do outro, se desumaniza”.

Em seguida, passou à leitura dos nomes das vítimas, comovendo-se várias vezes e emocionando muitos dos presentes.

Deputado critica falhas nos licenciamentos e danos ao meio ambiente

Na condição de presidente da Comissão de Meio Ambiente, o deputado Noraldino Júnior (PSC) focou o seu discurso na defesa da fauna e da flora e na crítica às falhas de licenciamento.

Após destacar a “seriedade e competência do relator”, agradeceu aos colegas, funcionários da Casa e familiares das vítimas, e disse que a CPI serve também para cobrar “rígida punição a todos os responsáveis diretos e indiretos pelo dano ambiental irreparável”.

“Que o relatório sirva para que novos crimes não venham a ocorrer”, disse, afirmando que, para ele e para todos, participar da CPI foi “uma experiência dolorosa mas enriquecedora do ponto de vista técnico”.

O deputado Bartô (Novo), suplente da CPI, manifestou “total solidariedade às famílias das vítimas diretamente atingidas” e também parabenizou a Assembleia, os colegas e o corpo técnico da Casa. “Me sinto honrado de ter feito parte desse trabalho. A CPI traz à luz vários questionamentos, que levamos à sociedade", declarou.

Ele defendeu a atividade minerária conduzida com seriedade e disse que é preciso “penalizar as pessoas e não as empresas” pelos “procedimentos sorrateiros que negligenciaram fatores de risco em favor do lucro”. Encerrou fazendo a leitura dos nomes dos indiciados.

Membro da comissão, o deputado Glaycon Franco (PV) também saudou o presidente da Assembleia por ter acatado o apelo dos deputados e da sociedade pela criação da CPI e cumprimentou o corpo técnico, “que deu arcabouço necessário ao relator”. Também manifestou solidariedade aos familiares.

A deputada Andréia de Jesus (Psol) ressaltou a importância de a CPI contar com a participação de uma mulher entre seus representantes, referindo-se à colega Beatriz Cerqueira. A parlamentar também lembrou de outras cidades mineiras “que estão vivendo esse velório permanente de Brumadinho”, em razão de riscos de rompimento de barragens. “Sabará (RMBH) também pede ajuda para impedir a chegada da mineração na Serra da Piedade”, disse.

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