Mesa de diálogo foi apontada como meio de encontrar soluções dignas para questão da habitação popular
Nice de Paula denunciou a truculência com que moradores de ocupações são tratados
Conflitos de terras estão sem mediação em Minas

Moradores de ocupações querem manter Mesa de diálogo

Eles lamentaram a suspensão de negociações e pediram fim de despejos. Governo garantiu retomada dos trabalhos.

11/04/2019 - 15:30

Moradores e apoiadores de ocupações e de movimentos pela habitação popular lotaram o Auditório José Alencar, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta quinta-feira (11/4/19), reivindicando a reinstalação da Mesa Estadual de Diálogo e Negociação Permanente com Ocupações Urbanas e Rurais.

Eles participaram de audiência pública da Comissão de Direitos Humanos, onde manifestaram o receio de que essa instância de negociação, criada em 2015, venha a ser extinta com a reforma administrativa do governador Romeu Zema.

Segundo denunciaram, o funcionamento da Mesa foi suspenso depois que o novo governo assumiu, interrompendo o diálogo entre os moradores e o Estado e facilitando processos de despejo de várias ocupações.

Representantes do governo presentes à audiência, contudo, contestaram a informação de que a Mesa será extinta, alegando que os trabalhos foram suspensos apenas para reanálise e devido ao processo de transição entre secretarias.

A autora do requerimento para realização da audiência e vice-presidenta da comissão, deputada Andréia de Jesus (PSOL), destacou a importância de manter a Mesa de negociação e defendeu “a cultura do diálogo”, reivindicando que o Estado busque soluções alternativas que passem longe dos despejos e da repressão.

Para o deputado Virgílio Guimarães (PT), a implantação, em 2015, da Mesa de Diálogo e Negociação “foi até tardia”. O parlamentar salientou que é papel do Estado mediar conflitos fundiários, apontando para a necessidade de legalização da posse e tomada de decisões relacionadas a financiamentos e outras providências.

A vereadora Bella Gonçalves (PSOL), da Câmara Municipal de Belo Horizonte, destacou que “a questão de moradia é um tema social, que não pode ser tratado como caso de polícia”. Ela fez um histórico sobre as ocupações na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), destacando como marco a ocupação Dandara, no bairro Céu Azul. Segundo ela, as ocupações na RMBH resultaram em mais de 30 mil casas. “Que governo conseguiu isso?”, indagou.

Minas Gerais têm mais de 100 mil famílias em ocupações

Minas Gerais é um dos estados brasileiros com mais alto índice de sem teto, denunciou o coordenador da Comissão Pastoral da Terra de Minas Gerais, frei Gilvander Luis Moreira, acrescentando que mais de 70 mil famílias na cidade e mais de 30 mil no campo vivem, hoje, em cerca de 300 ocupações.

Nice de Paula, representante de ocupações da região de Isidora, como Rosa Leão, Esperança, Vitória e Helena Greco, denunciou que os moradores são vítimas de “truculência da polícia” e defendeu o restabelecimento da Mesa de diálogo. “Não pedimos nada além do que está na Constituição, só queremos nossos direitos”, frisou.

Lacerda dos Santos Amorim, coordenador do Movimento Luta Popular, denunciou que o País vive uma conjuntura de retrocesso, com reforma da previdência e dificuldade de acesso à saúde e à educação. "A quantidade de gente morando na rua, hoje, em Belo Horizonte, é superior à população de 40% dos municípios de Minas”, disse.

Vanderley Rossi Júnior, da ocupação Chico Rei, em Ouro Preto (Região Central), relatou que dezenas de famílias estão desalojadas na cidade histórica, sofrendo perseguição por parte da PM e da Prefeitura.

A promotora Janaína de Andrade Dauro, da Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos, Apoio Comunitário e Conflitos Possessórios Urbanos, cobrou do governador a reimplantação da Mesa, "para que a comunidade possa se manifestar e construir soluções para situações que muitas vezes a lei e a justiça não conseguem resolver".

A defensora pública Ana Cláudia da Silva Alexandre Storch, da Defensoria Especializada em Direitos Humanos, Coletivos e Socioambientais, também destacou a importância da Mesa. "Temos compromisso com a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais e a Mesa de diálogo serve para encontrar soluções alternativas dignas e não com uma visão apenas patrimonial". 

Mesa mediou mais de 120 conflitos

Fernando Tadeu Davi, ex-coordenador da Mesa de Diálogo e Negociação, contou que desde 2015 a instância governamental mediou mais de 120 conflitos. Com a suspensão dos trabalhos, a mediação de outros 180 foi paralisada, lamentou.

Ele também criticou a ausência da Polícia Militar na audiência, "uma oportunidade para que a corporação fosse questionada sobre a quantidade de despejos executados desde janeiro de 2019". Propôs ainda que, se a instância governamental não for reinstalada, a Assembleia, junto com o Ministério Público e a Defensoria Pública, reassuma esse trabalho. 

As representantes da Secretaria de Estado de Governo, Verônica Ildelfonso Coutinho, e da Superintendência de Direitos Humanos, Maria Gabriela de Araújo Diniz, garantiram que os trabalhos serão retomados, dependendo apenas de "uma reanálise e de questões normativas".

Balanço - Ao fazer o balanço da audiência, a deputada Andréia de Jesus ressaltou a importância do debate, mas se mostrou preocupada com as ordens de despejo já emitidas. "Precisamos de uma resposta efetiva do governo de que essas desocupações serão suspensas imediatamente, até que se restabeleça a Mesa de diálogo", disse. Verônica Idelfonso se comprometeu a levar o pedido ao governo.

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