Notificações de casos de injúria racial têm crescido gradualmente a cada ano, o que mostra também que as pessoas estão mais encorajadas a denunciar
Nilmário Miranda falou do Minas sem Racismo, programa que envolve diversas áreas do governo estadual

Homicídios de negros superam em quatro vezes os de brancos

A informação refere-se à Capital e foi apresentada pela Polícia Civil em audiência sobre crimes raciais.

21/08/2017 - 19:08 - Atualizado em 23/08/2017 - 12:00

O número de homicídios de negros nos últimos quatro anos em Belo Horizonte tem sido, pelo menos, quatro vezes maior que o de brancos, segundo dados das delegacias especializadas. O dado foi apresentado por José Gonçalves Coelho Neto, inspetor da Cordenação de Direitos Humanos da Polícia Civil.

Ele participou de audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) na tarde desta segunda-feira (21/8/17). Solicitada pelo deputado Rogério Correia (PT), a reunião teve como objetivo discutir o aumento dos crimes raciais e de intolerância contra a população negra.

José Neto detalhou que, em 2014, foram apurados 313 assassinatos de negros para 70 de brancos. Em 2015, 227 negros e 56 brancos morreram assassinados. Já em 2016, para 195 vítimas afrodescendentes, foram mortos 57 brancos. Os números se referem a Belo Horizonte.

Racismo - José Neto explicou que o número de notificações de casos de injúria racial tem crescido gradualmente a cada ano na Capital. Em 2011, foram apenas 43 casos; em 2014, foram 141; e, em 2016, passou para 289 casos. Essa curva crescente de notificação, segundo o inspetor, revela também que as pessoas estão mais encorajadas a denunciar quando sofrem racismo.

Com o objetivo de minimizar o problema, a Polícia Civil está criando uma delegacia especializada para atender o cidadão LGBT e as vítimas de crimes de racismo e intolerância. A informação foi passada pela chefe do Departamento de Investigação, Orientação e Proteção à Família da instituição, Carla Cistina Santos Vidal.

O deputado Cristiano Silveira (PT), presidente da comissão, reforçou que os números sobre assassinatos são alarmantes: para cada jovem branco assassinado, 2,6 negros são mortos. A cada 23 minutos, um jovem negro é morto, sendo que o homicidio continua sendo a principal causa de mortes desse segmento nas periferias.

Violência recai mais sobre mulheres negras

De todas as quase 2.200 denúncias de violência na Região Metropolitana de Belo Horizonte registradas pela Central da Secretaria de Estado de Direitos Humanos (Sedpac), 70% foram feitas por mulheres negras. Desse percentual, apenas 4% conseguem associar a violência sofrida ao fato de pertencerem a esse grupo étnico e social.

A constatação é da coordenadora da Central de Denúncias e Recebimento, Monitoramento e Avaliação em Direitos Humanos da Sedpac, Barbara Amelise Costa. Ela acrescentou que o perfil de atendidos é de mulheres negras, com ensino fundamental incompleto e renda de até três salários mínimos.

Diante disso, a coordenadora defendeu políticas públicas de proteção integral, de modo que essas vítimas tomem consciência do exercício de seus direitos.

Prioridade - Nesse sentido, Nilmário Miranda, responsável pela pasta, afirmou que a defesa dos direitos humanos é uma prioridade da Sedpac. Uma das ações definidas, segundo ele, é a criação do programa Minas sem Racismo, que envolve diversas áreas do governo.

Nilmário explicou que também está em curso projeto de núcleos em escolas públicas para discutir o racismo, criado pela Secretaria de Estado de Educação. Na área da cultura, foram criados editais específicos para os negros.

Na avaliação do deputado Rogério Correia, a intolerância contra a população negra é preocupante. "Movimentos racistas vieram à tona nos Estados Unidos. Felizmente a reação tem sido grande, o que nos traz esperança, mostrando que esse preconceito é de minorias, mas precisa de combate eficaz", alertou.

Para o parlamentar, o problema também é grave no Brasil. "O crescimento de ideias racistas nos preocupa: acoplado ao preconceito racial está o preconceito religioso e social contra os negros", advertiu. Ele considera importante tratar da repressão policial, que atinge a população negra de modo mais profundo.

Momento político - Já Cleide Hilda Souza, subsecretária de Estado de Igualdade Racial, avalia que o racismo tem crescido no Brasil em virtude do atual momento político. Para ela, o racismo "à brasileira" é perverso e invisível. "Aqui, ninguém é racista, mas muitos são contra as cotas nas universidades; e a juventude negra continua morrendo", disse.

Corregedoria investiga eventuais desvios de PMs

O assessor de Direitos Humanos da Polícia Militar, capitão Ricardo Amorim Gontijo, concordou com a ausência do Estado no atendimento aos negros, mas ponderou que menos de 2% dos homicídios registrados têm relação com a PM. "Não se pode imputar o genocídio do jovem negro às polícias", afirmou.

Ele acrescentou que a PM tem buscado seguir as normas da ONU com relação a direitos humanos. Os manuais da corporação postulam que nenhuma pessoa pode ser colocada sob suspeita em virtude de sua cor, raça ou orientação sexual, segundo ele.

O representante da PM ponderou que eventuais desvios cometidos por policiais não podem ser confundidos com a conduta da instituição. "A Polícia Militar não apoia nenhum ato irregular. Qualquer desvio será informado à Corregedoria, para que o policial seja responsabilizado", concluiu.

Consulte o resultado da reunião.