Audiência foi realizada pela Comissão de Prevenção e Combate ao Uso de Crack e Outras Drogas
Aloísio Andrade lembrou que as bebidas alcoólicas estão entre as drogas que mais geram danos à saúde

Repúdio à publicidade de cerveja marca audiência de comissão

Anúncios abusivos foram condenados em reunião que defendeu campanha “Cerveja também é álcool”.

26/06/2017 - 20:20 - Atualizado em 27/06/2017 - 11:40

“É pelo corpo que se reconhece a verdadeira negra”. Claramente racista e machista, a frase, acompanhada do desenho de uma mulher negra, sensual, com traje sexualmente sugestivo, ilustra publicidade de conhecida marca de cerveja, com o objetivo de vender a bebida na modalidade escura. Outro anúncio de conhecido fabricante exibe outra linda mulher, grávida, em trajes sumários, pernas e barriga à mostra, tendo por objetivo vender cerveja sem álcool.

Considerados “criminosos” pelos participantes de audiência pública da Comissão de Prevenção e Combate ao Uso de Crack e Outras Drogas, realizada na tarde desta segunda-feira (26/6/17), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), os anúncios, exibidos durante a reunião, serviram como exemplos negativos, visando mobilizar a sociedade numa ampla campanha contra a publicidade de cerveja.

Destinada a debater os impactos do consumo de drogas lícitas sobre a sociedade, a reunião atendeu a requerimento do deputado Antônio Jorge (PPS) e deu sequência a outra atividade realizada na parte da manhã, no Hall do Palácio da Inconfidência, na ALMG, quando foi feita a coleta de assinaturas para apresentação de projeto de lei federal de iniciativa popular, chamado “Cerveja também é álcool”.

O objetivo do projeto é restringir a publicidade de cerveja nos meios de comunicação. A iniciativa é da Associação Nacional pela Restrição da Propaganda de Bebida Alcoólica e conta com o apoio da comissão e da Assembleia.

Convidados defendem regulamentação e conscientização

O parlamentar e todos os convidados repudiaram esse tipo de publicidade e defenderam mudanças na legislação que sejam capazes de, pelo menos, regulamentar os anúncios de cerveja de forma a impedir abusos. Os participantes manifestaram especial preocupação com os segmentos mais vulneráveis do público, como crianças e adolescentes.

O deputado Antônio Jorge recordou a bem-sucedida campanha antitabaco realizada nos anos 1990 e que impediu a publicidade de cigarros e similares nos meios de comunicação. “Criamos uma consciência, vencemos uma batalha e mudamos de atitude”, disse. Ele defendeu uma nova mobilização, desta vez contra o consumo de cerveja, destacando que sua postura não se baseia em questões morais ou religiosas, mas na indignação de um cidadão, considerando os males provocados pelo consumo abusivo de cerveja.

Segundo o parlamentar, bastam apenas 30 segundos para uma marca influenciar uma criança. "A criança brasileira é a que mais assiste à TV no mundo, uma média de cinco horas diárias", disse. Por isso, ele também se manifestou contrário à exposição, no comércio, de cervejas e refrigerantes nas mesmas gôndolas.

Ele condenou a chamada "coisificação da mulher” por meio de peças publicitárias “ofensivas e de péssimo gosto" e criticou também artistas que se prestam a posar como modelos para esse tipo de anúncio.

Open bar - O parlamentar afirmou que a Assembleia tem, hoje, em tramitação, três projetos de lei que versam sobre o consumo de álcool. E lamentou que não tenha prosperado na Casa uma proposição do deputado Roberto Andrade (PSB): o Projeto de Lei (PL) 704/15, que proíbe a realização de eventos abertos ao público com cobrança de ingresso e o consumo liberado de bebidas alcoólicas, mais conhecidos como eventos open bar. Na ocasião, disse, apenas ele e o autor do projeto foram favoráveis à matéria. 

Elder Marcos Felício, psicólogo, relatou que em recente festa open bar em Alfenas (Sul de Minas), do meio-dia até as 22 horas, foram consumidas oito carretas de cerveja.

Participantes também condenam volta de bebidas aos estádios

A liberação da venda de bebidas alcoólicas nos estádios também mereceu repúdio dos participantes da audiência. Entre os críticos da medida, além do deputado Antônio Jorge, estava o presidente do Conselho Estadual de Políticas Sobre Drogas (Conead), Aloísio Andrade. Ele lembrou que as bebidas alcoólicas estão entre as drogas que mais geram danos à saúde e gastos hospitalares na rede de saúde pública.

Para os convidados, tanto em nível estadual, com a liberação do álcool nos estádios, como em nível nacional, com a liberação de medicamentos como as anfetaminas, o poder público retrocedeu no combate às drogas.

Michelle Ralil, membro do Centro de Referência em Drogas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), citou estudos segundo os quais não existe fronteira entre uso, abuso e dependência de álcool. “A condição clínica resulta da interação da substância com a vulnerabilidade fisiológica e social de cada um”, afirmou, ressaltando que o álcool potencializa problemas psiquiátricos e déficits cognitivos.

Usuários - Cloves Benevides, diretor de Articulação da Secretaria Nacional de Política sobre Drogas, mencionou relatório da Organização das Nações Unidass (ONU) informando que há 250 milhões de usuários de álcool no mundo todo, movimentando mais de R$ 1 bilhão em publicidade por ano.

Ana Luíza César Viana, delegada regional da Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas (Febract), também criticou as políticas de “retrocessos” tanto em nível estadual como federal. “O consumo aumenta, a gravidade dos impactos aumenta e a política não acompanha com o mesmo rigor”, lamentou.

Consulte resultado da reunião.