Comissão de Combate ao Crack debateu a adequação das comunidades terapêuticas com vistas à sua atuação no acolhimento de adolescentes
Para o promotor, a maioria dos adolescentes precisa apenas de atendimento psicossocial

Internação de adolescentes usuários de drogas gera polêmica

Carências dos serviços públicos e divergências sobre o atendimento impedem assistência adequada a esse público.

24/05/2017 - 19:53 - Atualizado em 25/05/2017 - 12:11

O drama de famílias para lidar com adolescente usuário de drogas foi o tema discutido nesta quarta-feira (24/5/17) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Autoridades, especialistas e parlamentares participaram do debate organizado pela Comissão de Prevenção e Combate ao Uso de Crack e Outras Drogas, atendendo requerimento de seu presidente, deputado Antônio Jorge (PPS).

As carências dos serviços públicos de atendimento e as divergências entre representantes das diversas instituições relacionadas ao tema ficaram evidentes na reunião. O encontro abordou também a operacionalização da Lei 22.460, de 2016, que fixa diretrizes para as comunidades terapêuticas, mas não contempla a internação de adolescentes. Ela é fruto de projeto do deputado Antônio Jorge.

De acordo com o promotor Márcio Rogério de Oliveira, coordenador do Centro de Apoio Operacional da Criança e do Adolescente, existem hoje de 5 mil a 6 mil adolescentes apreendidos na Capital por atos infracionais e a maioria deles relata uso de drogas. O promotor diz que não sabe como encaminhar esses adolescentes para um apoio eficiente.

“Há uma incapacidade do Estado de promover uma medida protetiva eficaz”, afirmou o promotor. Na avaliação dele, a estrutura dos Centros de Atenção Psicossocial da Prefeitura de Belo Horizonte não é adequada, por não oferecer um atendimento específico. “Eles dizem que não vão para aquele lugar porque não são doidos”, relatou.

Em sua visão, a maioria dos adolescentes não precisa de atendimento de saúde, só de um atendimento psicossocial. “Só que não há isso. Temos que ter programas adequados às expectativas do adolescente”, defendeu Márcio Rogério.

Internação em comunidades terapêuticas

Uma alternativa à rede de saúde poderia ser as comunidades terapêuticas, que trabalham com internamento provisório, mas isso também é visto com ressalva pelo promotor. “A presença de adolescentes em comunidades terapêuticas afronta a primazia do direito à convivência familiar, complica o desenvolvimento escolar e pode criar uma demanda forçada, a pretexto de proteger os adolescentes”, advertiu.

Argumentos parecidos foram apresentados pelo coordenador municipal de Saúde Mental de Belo Horizonte, Arnor José Trindade Filho. “É fundamental que o adolescente seja acompanhado pela família. Temos que pensar mais em uma metodologia, e não em um lugar”, afirmou Trindade.

Preconceito - O consultor técnico da Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas (Febract), Ronaldo Vitelli Viana, afirmou que os argumentos contrários à atuação dessas instituições na assistência aos adolescentes revela um preconceito.

Ele argumentou que a rede pública de saúde inclui serviços que preveem a internação de adolescentes, tais como as residências terapêuticas provisórias (casas que abrigam grupos de usuários dos serviços de saúde) ou unidades de acolhimento voltadas exclusivamente para adolescentes entre 10 e 18 anos.

O representante da Febract argumentou que há muitas comunidades terapêuticas que apresentam condições de atendimento superiores às das unidades públicas de acolhimento infantil, mas não são credenciadas ou não recebem recursos públicos. 

Comunidades especializadas - Representantes das duas comunidades especializadas no atendimento de adolescentes em Minas falaram sobre a metodologia de trabalho e os resultados. Uma delas está em Divinópolis (Centro-Oeste de Minas), e a outra em Contagem (RMBH). Essa última paralisou as atividades em dezembro, por falta de recursos.

O promotor Márcio Oliveira se disse satisfeito com os relatos, mas reiterou que uma política segura deve estar legitimada, inserida na lei. Antônio Jorge concordou e afirmou que o trabalho das comunidades terapêuticas precisa ser reconhecido, ainda que sua atuação no caso dos adolescentes dependa de adequações técnicas e legais.

Antônio Jorge também ressaltou que essas entidades trabalham com internações voluntárias, algo que traz complicações no caso dos menores de idade, uma vez que eles são subordinados à autoridade familiar.

Faltam vagas para adolescentes dependente químicos

Na prática, as divergências legais e terapêuticas levam a uma quase inexistência de vagas públicas formais para atendimento a adolescentes dependentes químicos.

De acordo com o representante da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas, Clóvis Benevides, existem hoje em Minas mais de 700 vagas para internação provisória e tratamento de adultos usuários de drogas, mas apenas 21 vagas desse tipo são destinadas para adolescentes.

Clóvis Benevides considera viável a internação provisória de adolescentes nessa situação, mas sempre vinculada a medidas protetivas judiciais. Representantes do Estado também defenderam regras específicas para a internação dos adolescentes.

Ação educativa - O coordenador de Saúde Mental da Secretaria de Estado de Saúde, Humberto Verona, defendeu a metodologia adotada nos equipamentos públicos, embora, segundo ele, haja carência de recursos. Ele anunciou o início de uma ação educativa, que vai chegar às 28 Regionais de Saúde de Minas. Ao final, serão criados fóruns permanentes de discussão nas regionais.

Deputado denuncia apologia da maconha

Durante a reunião, o deputado Léo Portela (PRB) apresentou uma denúncia ao promotor Márcio Oliveira a respeito da Prefeitura de Belo Horizonte. Segundo o relato, um grupo de frequentadores do Centro Referencial da Juventude estaria confeccionando o “maior baseado do mundo”, para ser utilizado em uma marcha. “É dinheiro do contribuinte sendo usado para apologia ao uso de drogas”, criticou.

São Paulo - O deputado Bosco (PTdoB) aproveitou o debate para criticar a operação da Prefeitura de São Paulo na região conhecida como “Cracolândia”. A ação utilizou a polícia para retirar os usuários de drogas, sendo que a demolição de um prédio chegou a ser iniciada com pessoas dentro do local.

O deputado Dilzon Melo (PTB) cobrou uma política pública voltada para a prevenção, com estratégias e diretrizes. Ele também defendeu o reconhecimento das comunidades terapêuticas pelo Estado, na forma de investimentos.

Consulte o resultado da reunião.