Convidados da audiência propuseram a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar os diversos tipos de tratamentos para autistas
Romerito concorda com a instalação de uma CPI

Pais denunciam tratamentos desumanos contra autistas

Militantes dos direitos dos autistas criticam experimentos sem evidência científica e pedem instalação de CPI.

08/05/2017 - 18:59 - Atualizado em 23/05/2017 - 14:59

Aplicação de células-tronco no cérebro, isolamento doméstico, pílula à base de fezes e intervenções com medicamentos via anal são alguns dos experimentos que vêm sendo feitos com pacientes autistas sem comprovação científica de eficácia. A denúncia foi feita na tarde desta segunda-feira (8/5/17) em audiência da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Na reunião, os convidados advertiram que, ao contrário do que julga o senso comum, o autismo não é doença, mas uma condição neurológica que foge à padronização aceita pela sociedade. Eles propuseram a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os diversos tipos de tratamentos desumanos e degradantes que vêm se multiplicando.

Eles também defenderam a integração das políticas públicas, a capacitação dos profissionais que lidam com esse segmento e a divulgação de informações seguras sobre o autismo.

Segundo o vice-presidente da Associação Brasileira para Ação por Direitos das Pessoas com Autismo (Abraça), Maurício da Silva Moreira Júnior, que é pai de duas crianças autistas, desde 2010 multiplicaram-se em todo o mundo os estudos determinando tratamentos diversos para os autistas. Sem evidência científica e sem garantia de segurança, esses tratamentos estariam sendo prescritos indiscriminadamente.

“É um problema de saúde pública. Há tratamentos que geram risco até de grave lesão cerebral”, denunciou. “Além disso, muitas crianças com diagnóstico de autismo são imersas em terapias de alto risco, como a aplicação de células-troncos no cérebro, que já vem sendo feita nos Estados Unidos”, advertiu.

Os pais de autistas defendem as intervenções nos déficits gerados pela condição e denunciam a ausência de profissionais qualificados, como terapeutas ocupacionais, na rede pública.

Desconhecimento leva a equívocos

Defensora da instalação de uma CPI para apurar esses tipos de tratamento, Adriana Torres, voluntária e mãe de criança autista, informou que os responsáveis pelos tratamentos experimentais usam como base um suposto desinteresse da indústria farmacêutica na "cura do autismo", mostrando apenas desconhecimento do tema.

“Os autistas precisam de reconhecimento, respeito e amor. Precisam ter seus ambientes naturalmente modelados para garantir as suas competências e habilidades”, afirmou Adriana. Ela e outros convidados mencionaram a Lei Brasileira de Inclusão (Lei 13.146, de 2015), que condena todo tipo de tratamento desumano e degradante.

“Não existe o normal; existe a diferença. A normalidade vem de um padrão imposto”, disse a jornalista Selma Suely Silva. Mãe de Victor Mendonça, 20 anos, estudante de jornalismo diagnosticado como autista aos 11 anos de idade, Selma, já adulta, descobriu também ser autista.

Com sua experiência em rádio e comunicação, ela e seu filho criaram, há um ano e meio, um canal no YouTube e uma página no Facebook denominados Mundo Asperger, que abordam a síndrome categorizada dentro do espectro autista.

“Autismo é uma maneira diferente de ouvir e processar as informações, tanto do ponto de vista motor como cognitivo. Não tem cura porque não é uma doença”, disse Victor Mendonça. “O que é diferente não significa que é inferior. O autista foge ao padrão, mas nem por isso deve ser extirpado da sociedade”, concluiu.

Presidente de conselho defende políticas intersetoriais

Romerito Costa Nascimento, presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência, defendeu políticas públicas intersetoriais. “A sociedade quer enquadrar todo mundo dentro do que se convencionou como padrão. Mas as políticas de direitos humanos pressupõem que as pessoas são iguais mas também são diferentes”, disse.

Lembrando que a Lei de Inclusão não admite que ninguém seja submetido a situação degradante, Romerito também defendeu a instalação de uma CPI para apurar as denúncias sobre tratamentos desumanos para os autistas.

Mariana Resende Batista, da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência da OAB-MG, afirmou que a pessoa com deficiência ou com autismo tem direito a uma vida digna e se colocou à disposição dos interessados, divulgando o e-mail deficiencia@oab.org.br.

Parlamentares dão apoio à causa

O deputados André Quintão (PT) pediu informações aos convidados no tocante ao atendimento aos autistas nos órgãos públicos do Estado e sobre o posicionamento dos conselhos profissionais no processo de validação desses tratamentos, de forma que a comissão possa atuar mais efetivamente junto ao poder público.

“Depoimentos dessa natureza, de pessoas que vivem direta ou indiretamente essa situação, dizem muito mais do que teses, relatórios ou estudos”, afirmou.

O presidente da comissão, deputado Duarte Bechir (PSD), condenou os experimentos com os autistas sem que se tenha antes o cuidado de se comprovar a sua eficácia. “Nessas situações, as crianças acabam sendo cobaias”, lamentou.

Ele defendeu também que o Estado, em parceria com os órgãos e entidades ligadas ao tema, promova a divulgação de informações seguras para orientar as famílias. “Às vezes, por falta de conhecimento, os pais submetem seus filhos a tratamentos desumanos e degradantes”, lamentou.

Consulte resultado da reunião.