Audiência conjunta das Comissões de Proteção dos Animais e de Meio Ambiente contou com a participação de especialistas
O professor da UFV relatou iniciativas desenvolvidas em Viçosa

Grupo de estudos vai propor formas para manejo de capivaras

Sugestão foi feita em reunião para discutir como prevenir novos casos de febre maculosa em regiões como a Pampulha.

26/10/2016 - 20:03 - Atualizado em 27/10/2016 - 11:32

Repúdio ao extermínio de animais e defesa do manejo ético da população de capivaras como forma de prevenir a transmissão da febre maculosa marcaram audiência pública realizada nesta quarta-feira (26/10/16) pelas Comissões Extraordinária de Proteção dos Animais e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Houve, contudo, divergências quanto à melhor forma de fazer o manejo para controlar a proliferação de capivaras em Belo Horizonte e outros centros urbanos, o que deverá resultar na criação de um grupo de trabalho para estudar o assunto, com participação de deputados, pesquisadores e órgãos públicos.

A sugestão foi anunciada pelo deputado Noraldino Júnior (PSC), presidente da Comissão Extraordinária de Proteção dos Animais. O objetivo do grupo será estudar medidas eficazes de controle das capivaras e, consequentemente, dos casos de febre maculosa.

O assunto voltou à tona após a morte, em agosto passado, do estudante Thales Martins Cruz, de 10 anos. A criança havia frequentado o Parque Ecológico da Pampulha, onde vivem capivaras, seis dias antes de morrer por complicações da febre maculosa. A doença é transmitida pela picada do carrapato estrela, presente na capivara. Esse parasita pode abrigar a bactéria Rickettsia rickettsi, causadora da febre maculosa.

Especialista adverte para novos riscos

"A situação na Pampulha é de alerta e casos como o do Thales podem ser considerados como de morte anunciada", afirmou o pesquisador Romário Cerqueira Leite, ao defender ações contínuas e urgentes para evitar novas vítimas da febre maculosa em ambientes povoados por capivaras. Professor de doenças parasitárias da Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o pesquisador disse que o maior problema é a epidemiologia da febre maculosa, segundo ele extremamante complexa.

Confrontado com experiência de manejo desenvolvida em Viçosa (Zona da Mata), que foi relatada na audiência com a aprovação de muitos dos presentes, Romário Leite fez ressalvas e mencionou o combate ao carrapato feito com borrifações naturais em Belo Horizonte, por ocasião de eventos como os Jogos Olímpicos, mas cuja eficácia demandaria três anos.

"A ideia não é ruim. Concordo com o manejo, mas em alguns momentos ele tem que ser bem estudado e informado sobre quanto vai custar e qual será a estrutura, porque a prefeitura sozinha não dá conta”, alegou ele, lembrando a extensão da lagoa da Pampulha, cuja orla tem 18 km.

Viçosa tem experiência de sucesso

O professor de medicina veterinária da Universidade Federal de Viçosa (UFV), Tarcízio Antônio Rego de Paula, explicou que a capivara é um animal que adota um "sistema de creche", em que uma ou duas mães ou mesmo tias tomam conta de filhotes de outras fêmeas, sendo que poucas delas reproduzem de fato.

Já os machos marcam território e são os "reis" de seu grupo, embora apenas 60% dos filhotes geralmente sejam do "rei". O estudo desse comportamento da espécie norteou o manejo feito em três pequenos lagos em Viçosa, por meio da vasectomia em machos e da ligadura em fêmeas.

“Inicialmente houve a perda de 30% da população naturalmente”, disse ele. De três grupos com cerca de 30 capivaras que viviam na região, hoje restam apenas cinco animais, informou o professor da UFV. Além da esterilização, ele acrescentou que foram usados cavalos no meio ambiente das capivaras, servindo de iscas para os carrapatos, que eram retirados ao final de cada dia.

Tarcízio salientou que o manejo adequado ainda pode contribuir para preservar uma barreira sanitária natural à proliferação da febre maculosa. Isso porque o exemplar adulto, uma vez que teve a febre maculosa, se torna imune à doença, deixando de contaminar o carrapato e interrompendo, assim, o ciclo da transmissão ao homem.

Apoiando experiências de manejo, a veterinária e presidente do Instituto Vivendi, Flávia Quadros Campos Ferreira, ainda advertiu que, mesmo que fosse desconsiderada a ética, a matança de capivaras não resolveria o problema da saúde humana, já que o animal se reproduz em escala geométrica e tem curto período de gestação.

Promotora quer população informada

Liliam Marotta, representante da Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde de Minas Gerais, chamou atenção especialmente para a necessidade de se prestar informação clara à população sobre a situação, inclusive dentro do parque da Pampulha.

Ela também cobrou a identificação de áreas de risco, definição clara de formas de controle e retomada de ações de saúde e conscientização junto aos carroceiros, uma vez que os cavalos também são hospedeiros do carrapato.

Solução - A deputada Marília Campos (PT), autora do requerimento da reunião juntamente com os deputados Inácio Franco (PV), Antônio Jorge (PPS) e Noraldino Júnior, manifestou preocupação com o fato de a região da Pampulha ser muito frequentada pela população, especialmente o Parque Ecológico, e defendeu a proteção da saúde humana.

Os deputados Cássio Soares (PSD) e Inácio Franco, respectivamente presidente e vice da Comissão de Meio Ambiente, ressaltaram a importância da audiência. “O intuito da Assembleia é, a partir daí, contribuir com sugestões a um assunto que vem se arrastando”, frisou Cássio Soares.

Consulte o resultado da reunião.