A produção de alimentos nos municípios mineiros é um dos critérios de distribuição da Lei do ICMS Solidário - Arquivo/ALMG

ALMG lança livro sobre avaliação do ICMS Solidário

Publicação é resultado de um trabalho de três anos, que integra projeto do Direcionamento Estratégico Assembleia 2020.

08/09/2016 - 11:00 - Atualizado em 21/09/2016 - 11:10

Será lançado nesta segunda-feira (19/9/16), pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), o livro “Avaliação de Impacto da Lei do ICMS Solidário: Lei 18.030, de 2009”. A obra representa a conclusão de um trabalho de três anos, que mobilizou diversas áreas da Gerência-Geral de Consultoria Temática da ALMG e contou com a cooperação técnica da Fundação João Pinheiro (FJP). A Lei 18.030, de 2009, implantou o ICMS Solidário e instituiu regras que possibilitaram um aumento da receita financeira de 709 dos 853 municípios mineiros. 

O lançamento será às 14 horas, no Auditório da Escola do Legislativo, e incluirá uma exposição dos consultores da ALMG Júlio Bedê e Daniel Caria, organizadores da publicação. Será seguida por uma mesa de debates, com a participação das professoras Isabella Biondini (Centro de Pesquisas Aplicadas da Fundação João Pinheiro) e Márcia Soares (Departamento de Ciência Política da UFMG), e do professor Rafael Silveira e Silva (Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria do Senado Federal).

O livro avalia a qualidade dos 17 critérios de distribuição do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) estabelecidos pela Lei 18.030. A conclusão é que alguns desses critérios não têm cumprido os objetivos a que se propõem e poderiam ser revistos ou aperfeiçoados.

A norma foi a primeira escolhida para o projeto Avaliação do Impacto da Lei por se tratar de uma lei mais abrangente, que envolve grande número de políticas públicas. A iniciativa integra o Direcionamento Estratégico Assembleia 2020 e reflete o compromisso da ALMG em produzir legislação de qualidade, em sintonia com os interesses da sociedade.

Entenda o ICMS Solidário e a Lei Robin Hood

A Lei 18.030, de 2009, originou-se do Projeto de Lei (PL) 637/07, de autoria do ex-deputado Dinis Pinheiro (PP), aprovado pela Assembleia de Minas em 18 de dezembro de 2008.

A proposta inicial recebeu inúmeras contribuições, sendo tema de debates com a participação de parlamentares, especialistas, gestores públicos e entidades da sociedade civil. Um dos exemplos foi o Fórum Técnico ICMS Solidário, realizado em 2007, que resultou em mais de 100 sugestões de mudança, encaminhadas por representantes de 382 municípios, incluindo 235 prefeitos.

O objetivo do PL 637/07 era modificar os critérios de distribuição do ICMS entre os municípios mineiros, de maneira a beneficiar as cidades que recebiam um repasse desses recursos abaixo da média per capita do Estado. Ou seja, a meta era aumentar a receita financeira de municípios mais pobres.

A maior concentração de municípios beneficiados está nas regiões Norte de Minas, Jequitinhonha/Mucuri e Rio Doce, mas há exemplos em todas as regiões do Estado. Na região Central de Minas, por exemplo, que é uma das mais ricas, 75% dos municípios foram beneficiados.

Critérios – De acordo com a Constituição Federal, de todo o ICMS arrecadado no Estado, 25% destinam-se aos municípios. Desse montante, pelo menos 75% devem ser distribuídos de acordo com o Valor Adicionado Fiscal (VAF), indicador que retrata o movimento econômico de cada cidade, e até 25% conforme determinar a lei estadual. Antes do ICMS Solidário, eram 12 os critérios de distribuição, definidos na Lei 13.803, de 2000, a chamada Lei Robin Hood.

As regras implementadas em 2010 reduziram de 79,68% para 75% o valor distribuído de acordo com o VAF. Seis novos critérios foram somados aos 12 previstos na lei anterior.

As novas regras têm o objetivo de estimular políticas públicas voltadas para o esporte e o turismo. Oferecem também compensação financeira para municípios com áreas alagadas por hidrelétricas (recursos hídricos) ou que são sede de estabelecimentos penitenciários.

Os outros dois novos critérios, ICMS Solidário e mínimo per capita, são distribuídos de acordo com a relação percentual entre a população de cada um dos municípios com menor índice de ICMS per capita e a população total do Estado, observados conceitos detalhados na lei.

Os percentuais de distribuição do ICMS ficaram assim: VAF (75%), área geográfica (1%), população (2,7%), população dos 50 municípios mais populosos (2%), educação (2%), produção de alimentos (1%), patrimônio cultural (1%), meio ambiente (1,1%), saúde (2%), receita própria (1,9%), cota mínima (5,5%), municípios mineradores (0,01%), recursos hídricos (0,25%), municípios-sede de estabelecimentos penitenciários (0,1%), esportes (0,1%), turismo (0,1%), mínimo per capita (0,1%) e ICMS Solidário (4,14%).

Maior parte dos municípios foi beneficiada

Em uma primeira fase, correspondente à parte 1 do livro, o estudo avaliou o impacto global das novas regras de distribuição do ICMS entre os municípios, implantadas em 2010, produzindo efeitos concretos no ano seguinte.

Foram incluídos seis novos critérios, sendo que o principal foi o ICMS Solidário, que procurou beneficiar as cidades que recebiam um repasse desses recursos abaixo da média per capita do Estado. A meta era aumentar a receita financeira de municípios mais pobres.

A principal conclusão da primeira fase do estudo foi que 709 dos 853 municípios mineiros foram beneficiados. Ou seja, os valores transferidos para os municípios de acordo com o ICMS Solidário foram maiores do que seriam pelas regras anteriores.

Na segunda fase, 17 critérios foram analisados de acordo com três quesitos:

  • Qualidade da distribuição de recursos financeiros promovida, de acordo com a natureza e finalidade do critério;
  • Aderência à respectiva política pública, ou seja, se a forma de cálculo dos índices relativos a cada critério reflete as atuais prioridades da política pública;
  • Nível de governança municipal sobre os dados utilizados para o cálculo da distribuição proporcionada pelo critério, ou seja, até que ponto o município pode agir para melhorar sua participação no ICMS, referente àquela política específica.

Em cada um dos quesitos definidos, cada critério foi classificado como forte, médio ou fraco, de acordo com seu desempenho, tendo como base o banco de dados relativo ao período de 2000 a 2012.

É preciso ressalvar que nem sempre um conceito “fraco” implica em um julgamento negativo, em razão da natureza do critério avaliado. Por exemplo, o critério “área geográfica” remunera o município pelo tamanho de seu território. Portanto, receberá um conceito “fraco” no quesito governança municipal, uma vez que a prefeitura não pode alterar a área do município.

Complexidade – Uma das conclusões da equipe responsável pelo trabalho é que a Lei 18.030, se beneficiou os municípios mais carentes do Estado, também complicou as regras de distribuição do ICMS, que já não eram simples.

O principal critério de distribuição do imposto é o Valor Adicionado Fiscal (VAF), que reflete a atividade econômica do município. Até 2010, existiam outros 11 critérios, que procuravam amenizar a concentração de recursos promovida pelo VAF. A Lei do ICMS Solidário instituiu outros seis critérios e subdividiu outros, sem eliminar as regras anteriores.

Para Júlio Bedê, alguns dos critérios mais antigos já não fazem sentido. Os recursos distribuídos de acordo com a área geográfica, por exemplo, poderiam ser transferidos segundo critérios mais eficientes em compensar a concentração de recursos provocada pelo VAF. “Nem sempre um município grande é um município pobre”, afirma Bedê.

Outra conclusão da equipe da ALMG é que qualquer modificação da lei deveria recompensar as prefeituras com mais iniciativa, que perseguem a melhoria de seus serviços e políticas públicas. Afinal, tratam-se de recursos que pertencem aos municípios e, para melhor orientar a iniciativa dos prefeitos, é desejável que as regras sejam simplificadas.

Distribuição espacial comparativa entre Lei Robin Hood e Lei do ICMS Solidário 2011/12

Equipe vê possibilidades de mudanças em parâmetros da lei

Com relação ao critério do ICMS Solidário, a conclusão da pesquisa é que ele cumpriu seu objetivo redistribuitivo, com a ressalva de que apresenta um grau de governança municipal muito pequeno.

A pequena influência da governança municipal sobre esse índice tem seu lado positivo, pois ela é que garante que os municípios mais pobres, mais carentes de políticas públicas, serão beneficiados pela redistribuição dos recursos.

No entanto, uma sugestão da equipe da Assembleia é que parte dos recursos proporcionados por esse critério poderia ser condicionada a metas de melhoria nos serviços públicos, de forma que as prefeituras pudessem buscar um repasse financeiro maior. Isso manteria o caráter redistribuitivo desse critério, mas estimularia a melhoria dos serviços públicos.

A análise de alguns critérios que apresentaram um desempenho ruim com relação aos quesitos definidos na pesquisa indicam outros aperfeiçoamentos possíveis:

Educação - Critério criado em 1995, observou-se que ele não acompanhou as mudanças da realidade do setor e suas prioridades atuais. Ele ainda reflete, em grande parte, o número de matrículas escolares, apesar de a educação já estar praticamente universalizada no Estado.

Esportes - Observou-se é que os municípios acabam sendo beneficiados pela execução de programas ou eventos esportivos estaduais ou privados. Isso não incentiva a realização de projetos municipais no setor.

Com relação à distribuição dos recursos, observou-se que apesar de o número de municípios beneficiados ter aumentado de 94 (2011) para 354 (2014), há grande concentração de recursos, pois apenas 10% dos municípios receberam 50% do montante atribuído ao critério, sendo eles concentrados nas regiões Central, Mata e Sul de Minas.

Cota mínima - Esse critério corresponde à parcela a ser distribuída em igual valor para todos os municípios, garantindo assim um valor mínimo de distribuição. As análises mostraram que sua importância nas receitas municipais vem diminuindo e que ele acaba por tratar municípios com realidades diferentes da mesma forma.

O diagnóstico aponta que a cota mínima pode, eventualmente, ser suprimida, substituída por outros critérios mais eficientes.

Produção de alimentos - São várias as deficiências apontadas nos quesitos que definem seu cálculo. Entre outras críticas, verifica-se que o quesito “pequenos produtores” despreza o conceito de agricultor familiar estabelecido na legislação federal.

O apoio à produção é apurado sem padrão fixo, incluindo qualquer atendimento realizado a produtores rurais. O que se conclui é que os quesitos atuais da produção de alimentos não refletem as políticas públicas e promovem uma distribuição de recursos com fraca qualidade, com a frequente utilização de dados desatualizados.

Importância de se preservar avanços da lei atual

Por outro lado, os técnicos da Assembleia de Minas também consideram importante preservar diversos avanços da lei atual, como o caráter distribuitivo do ICMS Solidário.

Um forte exemplo positivo, entre outros, é o critério do patrimônio cultural. “Minas Gerais foi o único Estado que conseguiu municipalizar a política de patrimônio cultural, em grande parte graças à adoção desse critério”, avalia Daniel Caria.

Essas regras beneficiaram, sobretudo, municípios de menor porte, viabilizando a identificação de riquíssimos acervos locais que poderiam permanecer desconhecidos e desprotegidos sem o estímulo proporcionado pelo critério de distribuição do ICMS.