Reunião cumpre determinação de lei federal sobre normas de fiscalização das despesas com saúde, que prevê apresentação de relatórios pelo gestor do SUS no Estado
Servidores da SES e candidatos aprovados em concurso de 2014 lotaram o Auditório

Somente 9 entre 133 hospitais receberam recursos do Estado

Atrasos em repasses para atenção básica chegam a oito meses, segundo relatório apresentado a deputados nesta sexta (1º).

01/07/2016 - 16:47

Somente nove dos 133 hospitais que deveriam ter sido beneficiados receberam recursos do Estado nos primeiros quatro meses deste ano. Os atrasos no repasse do Pro-Hosp, programa estadual de atenção hospitalar, às instituições chegam a R$ 54 milhões no período. No programa Saúde em Casa, de incentivo à atenção básica em todos os municípios mineiros, os atrasos nos repasses vem desde o ano passado, acumulando uma dívida de R$ 240 milhões nos dois últimos quadrimestres.

Os dados foram divulgados por gestores da Secretaria de Estado de Saúde (SES) em reunião da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizada nesta sexta-feira (1º/7/16). Requerida pelo presidente da comissão, deputado Arlen Santiago (PTB), a reunião cumpre determinação prevista no artigo 36, parágrafo 5°, da Lei Complementar Federal 141, de 2012, que dispõe sobre normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde. A norma prevê a apresentação de relatórios quadrimestrais pelo gestor do Sistema Único de Saúde (SUS) no Estado.

“O cenário é de lamúria financeira”, admitiu a subsecretária de Inovação e Logística da SES, Adriana Araújo Ramos. Segundo ela, a pasta estaria sem qualquer possibilidade no momento atual de falar em perspectivas. “Podemos replanejar, mas não vamos prometer o que não poderá ser cumprido. O secretário de Saúde não é o ordenador de despesas e hoje sequer consegue saber o que está no fundo da saúde”, admitiu.

À frente da pasta desde o dia 6 de maio, o secretário Sávio Souza Cruz justificou sua ausência em mensagem à comissão, por estar em compromisso no Ministério Público relacionado a ajustes na política de saúde em função de medidas judiciais.

Segundo acrescentou a subsecretária, chegam ao conhecimento da SES, diariamente, entre 50 a 60 mandados de segurança envolvendo ações de judicialização da saúde, quando pacientes recorrem à Justiça por atendimento ou medicamentos.

“Não dormimos, não há noite na secretaria”, desafabou ela quanto à preocupação com os compromissos da pasta e com a intensa agenda junto a prefeitos e secretários municipais que têm procurado o governo em busca de respostas. “Estamos aguardando um posicionamento das secretarias da Fazenda e do Planejamento e do próprio governador”, frisou.

Segundo a representante da SES, a nova gestão assumiu a pasta com uma dívida de cerca de R$ 1,5 bilhão de restos a pagar, compromissos assumidos que não foram quitados, sendo que hoje há, na área de saúde, um descolamento entre o orçamento e o financeiro de quase R$ 3 bilhões, ou seja, entre aquilo que foi previsto e o efetivamente realizado.

Risoleta Neves - Com seu desabafo sobre as dificuldades da pasta, a subsecretária descartou a possibilidade de atender a curto prazo reivindicações feitas durante a reunião por deputados e entidades de classe, entre elas a de que fossem feitas intervenções para impedir o fechamento do atendimento pediátrico do Hospital Risoleta Tolentino Neves, em Venda Nova, Belo Horizonte (RMBH). Por falta de recursos, a unidade anunciou que a desativação deverá ocorrer a partir da próxima quarta-feira (6/7/16).

O hospital, explicou ela, não faz parte da rede da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), mas o Estado contribuiu com 60% para o funcionamento da unidade. “Estávamos em dia até o mês passado, mas este mês não temos de onde tirar os R$ 7 milhões de nossa contrapartida mensal. Não existe o dinheiro, e estamos sem perspectivas por parte da Fazenda”, disse.

Manifestações - Da mesma forma, embora ressaltando que fosse um desejo, a representante da SES não adiantou prazos para a nomeação de concursados ou questões relacionadas à carreira dos efetivos, também reivindicados na reunião, mas disse que levaria as demandas ao secretário.

Durante a reunião, servidores da SES e candidatos aprovados em concurso realizado em 2014 lotaram o Auditório da ALMG postando faixas e balões com pedidos como a valorização da carreira, a nomeação dos concursados e ainda mudanças na gestão da Fundação Ezequiel Dias (Funed).

Também foi cobrado, por representantes de entidades dos servidores, que o governo cumpra a redução da jornada de trabalho semanal, de 30 para 40 horas, que teria sido prometida durante a campanha eleitoral do governador, abrindo o diálogo com a categoria.

Implantação de hospitais regionais ainda distante

Ainda dentro da política estadual de atenção hospitalar, além do baixo repasse aos hospitais, a implantação de hospitais regionais teve execução física de apenas 7%: da programação orçamentária para o quadrimestre, de R$ 108,496 milhões, a despesa liquidada foi de aproximadamente R$ 8,9 milhões.

Entre outros dados do relatório apresentados pela assessora de Planejamento da SES, Poliana Cardoso Lopes, ela destacou que, para arcar com ações judiciais para o fornecimento de medicamentos, foi empenhado um valor que supera R$ 47 mihões no primeiro quadrimestre, além de outros R$ 6 milhões empenhados para arcar com ações relativas a atenção hospitalar.

Em outro exemplo, foi citado que o programa de assistência farmacêutica cumpriu no quadrimestre 78% de sua meta física, atendendo 674 municípios da totalidade dos 853 previstos.

No programa de atenção básica à saúde foram contempladas 5.174 equipes de Saúde da Família, mais do que as 4.901 previstas, ainda que com atrasos em pagamentos dos incentivos financeiros para cofinanciamento. Os atrasos teriam sido em função de modificações feitas por resolução da SES para readequar critérios do programa.

Quanto ao programa redes de atenção à saúde, ações como a implementação e apoio à atenção especializada e de apoio e fortalecimento da Rede Cegonha alcançaram 100% da meta física no período, percentual que foi de 70% para a ação apoio e fortalecimento da rede de cuidado com a pessoa com deficiência.

Quanto à assistência farmacêutica, o fornecimento de medicamentos básicos não alcançou os 853 municípios como previsto, abastecendo 674 deles.

Participantes falam em apagão da saúde

Também presentes à reunião, gestores de hospitais criticaram a situação quanto à falta de repasses de recursos do Estado e à defasagem da tabela de procedimentos pagos pelo SUS, mencionando, ainda, que estados e municípios estariam assumindo a responsabilidade pela saúde em detrimento da União.

O diretor do Instituto Mário Penna, Paulo José de Araújo, afirmou que mais de 80% dos atendimentos prestados por suas unidades são voltados para pacientes do SUS, o que, segundo ele, dimensiona o impacto dos atrasos nos repasses de recursos públicos para fazer frente à demanda.

"Temos um apagão na saúde. E quando deixarmos de pagar a folha de pessoal,  a saúde cairá como um castelo de cartas", comparou o procurador-geral do Hospital Ibiapaba, em Barbacena (Região Central do Estado), Luiz Eduardo Grisolia de Oliveira. Expondo dificuldades que a unidade estaria enfrentando para manutenção e funcionamento de alas como as de tratamento intensivo, ele afirmou que o segmento estaria acumulando dívidas impagáveis e reivindicou que organismos como o BNDES viabilizem formas de financiamento e subsídios para o segmento.

Financiamento – O presidente da Associação Médica de Minas Gerais, Lincoln Lopes Ferreira, acrescentou que a destinação de recursos à saúde não deve ser vista pelos gestores públicos como gasto, e sim como investimento. Já o presidente do Conselho Regional de Medicina, Fábio Augusto de Castro Guerra, afirmou que os hospitais estão se organizando para pensar em ações e formas para resgatar o financiamento do setor.

Nesse sentido, o deputado Geraldo Pimenta (PCdoB), vice-presidente da comissão, defendeu a volta da CPMF para injetar recursos na saúde. "A saúde precisa de dinheiro novo, carimbado para a área e dividido com estados e municípios", afirmou, defendendo, ainda, que impostos sobre as grandes fortunas do País sejam regulamentados para destinação ao financiamento da área.

Por sua vez, o deputado Carlos Pimenta (PDT) defendeu que o Estado priorize os hospitais regionais para a destinação de recursos e cobrou a nomeação dos concursados. Segundo ele, o governo estaria recorrendo ao limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) no Estado como "desculpa" para não efetuar as nomeações, uma vez que haveria milhares de terceirizados no Estado.

Já o deputado Doutor Jean friere (PT), que reiterou as falas quanto à necessidade de nomeação de concursados, defendeu que as discussões sobre a situação da saúde no Estado e dificuldades da área sejam "despartidarizadas".

Visita - Diante do relato de representante da SES, o presidente da comissão anunciou que vai propor aos deputados uma visita à Secretaria de Estado da Fazenda, juntamente com os titulares da SES e da Secretaria de Estado do Planejamento e Gestão (Seplag), para tratar da situação da saúde e reivindicar regularização de repasses aos hospitais, bem como as nomeações dos concursados. Segundo Arlen Santiago, a SES teria mais de 2,5 mil servidores terceirizados.

O deputado também criticou o atraso de pagamentos a prestadores de serviços e o desmatelamento que estaria ocorrendo em vários programas e serviços de saúde do Estado. Ele afirmou, por exemplo, que o programa de câncer de mama teve exames de biópsia interrompidas no novo governo e que exames de mamografia teriam tido o serviço móvel de atendimento paralisado, esbarrando, ainda, em equipamentos obsoletos em vários centros do programa Viva Vida.

Consulte o resultado da reunião.