Três comissões debateram prejuízos que mudanças na lei sobre o Parque da Serra de Ouro Branco podem causar, já que a região é abastecida por manacial da serra
Letícia explicou que a área do parque está em fase adiantada de recuperação
Deputados aprovaram requerimento para que Cristiano Silveira seja designado relator de projeto em comissão

Moradores de Ouro Branco são contrários à redução de parque

Projeto de lei quer retirar de parque estadual área que possui jazidas de minério de ferro e manganês.

03/06/2016 - 11:44 - Atualizado em 03/06/2016 - 17:25

Sete anos após conseguirem a criação do Parque Estadual Serra do Ouro Branco, por meio de um processo que incluiu um abaixo-assinado com 5 mil assinaturas, os moradores do município de Ouro Branco (Região Central do Estado) lotaram, na noite desta quinta-feira (2/6/16), um dos principais auditórios da cidade, em uma mobilização que pediu a rejeição, pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), de projetos de lei que podem reduzir o parque ou alterar sua destinação.

Cerca de 700 moradores participaram da audiência pública conjunta de três comissões da ALMG, que só terminou à meia-noite, após quatro horas e meia de apresentações e debates. O requerimento é de autoria dos deputados Fred Costa (PEN), presidente da Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização, e Cristiano Silveira (PT), que preside a Comissão de Direitos Humanos. A reunião também incluiu a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.

O principal alvo das críticas de moradores, deputados e outras autoridades foi o Projeto de Lei (PL) 3.043/15, do ex-deputado João Alberto (PMDB), que promove a exclusão (desafetação) de 856,32 hectares do parque, que equivalem a aproximadamente 800 campos de futebol. Na justificativa, o autor argumenta que estudo realizado pela ONG Terra Brasilis, para criação do parque, atesta que a área a ser excluída já foi alterada pela atividade humana.

A área total do parque é de 7.520 hectares, ou seja, o PL 3.043/15 retira 11,3% desse território. O projeto não indica qual seria a destinação dessa fração. No entanto, a suspeita dos moradores é de que a intenção é destiná-la à mineração. É o que teme a gerente do parque e servidora do Instituto Estadual de Florestas (IEF), Letícia Dornelas Morais.

Letícia demonstrou, por meio de mapas, que a área a ser excluída coincide com as áreas de direito minerário de duas empresas que possuem direito de lavra na região: a Mineração Geral do Brasil e a Somifra. As duas áreas constam em processos que tramitam no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). Apesar de datarem de 1936, os processos estão vigentes, em fase de concessão de lavra, que não pode prosseguir se os terrenos não forem excluídos do parque.

Empresas têm interesse em minerar ferro e manganês

De acordo com a gerente do IEF, as empresas manifestaram interesse em explorar, no local, ferro, manganês, topázio, argila e dolomito (um tipo de rocha sedimentar relacionada ao mármore). Letícia admite que a área já sofreu intervenção humana no passado, mas está em fase adiantada de recuperação e, além disso, é adjacente a uma das formações mais importantes do parque, a Gruta da Igrejinha.

Tanto Letícia quanto o professor da Universidade Federal de Viçosa Cláudio Coelho de Paula atestaram que a Gruta da Igrejinha é a segunda maior gruta de mármore dolomítico do Brasil. A exploração mineral na área a ser excluída, por ser vizinha à gruta, não teria como não afetá-la, na avaliação do professor.

Cláudio Coelho acrescentou que o parque fica em uma região de transição entre a Mata Atlântica e o Cerrado, apresentando ainda um outro ecossistema valioso, o dos campos rupestres, com espécies vegetais e animais ameaçadas de extinção. A vegetação inclui orquídeas e bromélias raras, além das canelas de ema, sendo que há pelo menos um exemplar dessa última, no parque, com mais de 500 anos de idade, uma planta com a idade do Brasil.

O PL 3.043/15 está hoje anexado ao 1.839/15, do deputado Anselmo José Domingos (PTC), que aguarda parecer da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Este último transforma o parque estadual em uma estação ecológica, que restringe o acesso à área. Enquanto o parque permite o turismo ecológico, uma estação apenas liberaria o acesso para pesquisa científica. Por essa razão, apesar de não ameaçar a integridade do parque, essa proposta também enfrenta oposição dos moradores e autoridades de Ouro Branco e do IEF.

O deputado Anselmo José Domingos ainda é autor do PL 3.009/15, que também está anexado ao 1.839/15. Esse terceiro projeto obriga o Estado a criar e a instituir o plano de manejo do parque, que é o instrumento legal de zoneamento e gestão de uma área de preservação. A gerente Letícia Morais, no entanto, afirmou que esse plano já está em elaboração desde 2013, deve ser aprovado no segundo semestre e não se justificaria aprovar um projeto para determinar algo que já está sendo feito.

Outro motivo para impedir a mineração na atual área do parque, segundo os participantes da audiência pública, é a preservação dos mananciais responsáveis pelo abastecimento de água da região. O representante da Copasa, Elcimar de Oliveira, afirmou que a preservação da Serra de Ouro Branco é essencial para garantir o abastecimento da cidade.

Um estudo realizado pela Copasa indica que estão na área tanto o atual manancial de abastecimento da empresa, o Córrego do Veríssimo, quanto a principal opção para nova captação, o Ribeirão Água Limpa. Essa reserva garante o abastecimento para cerca de 40 mil pessoas.

Deputados e governo prometem agir contra projetos

O deputado Fred Costa, presidente da Comissão de Assuntos Municipais, e o deputado Rogério Correia (PT) lembraram que a mesma proposta de exclusão dessa área do parque já foi rejeitada pela ALMG em legislatura anterior. "É inadmissível que tenhamos mais uma vez um projeto desse tipo na Assembleia. Será possível que, a cada legislatura, teremos que ver a mesma proposta, só mudando o autor?", criticou Fred Costa. O autor da proposta anterior foi o ex-deputado Célio Moreira.

O deputado Rogério Correia disse que a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável já emitiu nota técnica contra o PL 3.043/15. “O governo é contra os três projetos e o governador (Fernando) Pimentel já disse que, se eles passarem na Assembleia, ele veta”, afirmou Rogério Correia.

O presidente da Comissão de Direitos Humanos, Cristiano Silveira, que também integra a Comissão de Constituição e Justiça, disse que solicitará a relatoria do PL 1.839/15, a fim de recomendar a rejeição dos projetos, sobretudo o que prevê a desafetação (3.043/15). Os três deputados aprovaram requerimento para que o presidente da CCJ, Leonídio Bouças (PMDB), designe a relatoria a Cristiano Silveira. “Em Minas, as grandes mineradoras é que estão determinando como elas vão atuar”, criticou Cristiano Silveira, cobrando firmeza do Governo do Estado.

A prefeita de Ouro Branco, Maria Aparecida Junqueira Campos, cobrou ainda mais agilidade na aprovação e implantação do plano de manejo do parque e na sua regularização fundiária. Toda a área do parque é privada e cerca de 90% pertence a empresas mineradoras. O IEF já negocia a regularização dessa área das empresas por meio de compensação ambiental.

Os terrenos restantes, que pertencem a pequenos proprietários, terão que ser desapropriados, mas os representantes do IEF não estimaram quando isso poderá ser feito. O diretor de área protegidas do IEF, Henri Dubois Collet, recomendou que os proprietários procurem a direção do parque e providenciem a documentação necessária. Ele acrescentou que o Conselho Consultivo do Parque deve ser implantado até agosto deste ano.

O deputado federal Padre João (PT-MG), que também participou da audiência pública, ressaltou que a preservação do parque é importante não apenas por uma questão ambiental, mas também econômica, uma vez que a recarga hídrica da área é que garante o abastecimento e funcionamento da usina siderúrgica da Gerdau Açominas, principal empresa de Ouro Branco e uma das maiores do País. Ele lembrou que a criação do parque teve que vencer muita resistência e isso não pode ser perdido. “Queriam montar um condomínio com heliporto e isolar a serra da comunidade”, recordou.

Já os vereadores Nilma Aparecida Silva e Charles Silva Gomes cobraram que a ALMG não ignore a vontade dos moradores de Ouro Branco. “Estão tentando demarcar o parque de dentro de seus gabinetes, sem vir a Ouro Branco. Todos os vereadores são contra”, afirmou Nilma Aparecida.

Apresentações - A audiência pública contou ainda com a participação de alunos de cinco escolas do ensino fundamental, que cantaram o Hino Nacional e apresentaram poemas, música e vídeo homenageando a Serra de Ouro Branco. Os artistas Rogério Dias e Patrick Duprat também participaram da apresentação. Todo o auditório foi decorado com textos e ilustrações de estudantes, se manifestando contra a redução do parque estadual.

Consulte o resultado da reunião.