Álcool, e não maconha, é porta de entrada para outras drogas
Pesquisa foi divulgada em audiência nesta quarta (25), em Mantena, onde consumo de álcool e outras drogas preocupa.
25/05/2016 - 17:38Ao contrário do que prega o senso comum, é o álcool, e não a maconha, a verdadeira porta de entrada para outras drogas. A declaração é do deputado Antônio Jorge (PPS), presidente da Comissão de Combate ao Uso do Crack e Outras Drogas da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Com essa afirmação, o parlamentar surpreendeu os participantes da audiência pública realizada a pedido dele, nesta quarta-feira (25/5/16), na Câmara Municipal de Mantena (Rio Doce).
Na reunião, foram debatidos o impacto da propaganda no consumo de bebidas alcoólicas entre jovens e a necessidade de adequação da Lei Federal 9.294, de 1996, que trata das restrições ao uso e à publicidade de bebidas. Também durante o encontro foram apresentadas as dificuldades do poder público local para lidar com o aumento do consumo de álcool e drogas pela juventude de Mantena, e sugeridas ações para minimizar o problema.
Para desfazer o mito em torno da maconha como porta de entrada para outros vícios, Antônio Jorge se valeu de uma pesquisa recente do Journal School of Health, dos Estados Unidos. O trabalho mostrou que a bebida alcoólica é, de fato, a primeira substância consumida por aqueles que mais tarde apresentam graves problemas relacionados ao uso de entorpecentes. Na apresentação de slides, o parlamentar alerta ainda que a doença do alcoolismo atinge cerca de 10% da população brasileira e, diferentemente de outras enfermidades, ela não é tratada.
Consumo precoce - Outro dado preocupante, segundo Antônio Jorge, vêm de um estudo nacional conduzido pela UFMG, o qual revela que os jovens (considerados na faixa etária entre 12 e 17 anos) têm experimentado cada vez mais cedo o álcool. Se em 2003, 48% desse público já havia respondido positivamente à pergunta sobre já ter experimentado a bebida alcoólica, esse percentual chegou a 54,5%, em 2005, e a 71%, em 2009.
Além do consumo precoce, o presidente da comissão também frisou a homogeneização do uso do álcool, uma vez que, atualmente, pessoas de todos os sexos, raças e perfis de renda consomem bebidas. “Há 20 ou 30 anos, a cada cinco rapazes, uma moça bebia; hoje a diferença é mínima, com 65% de homens e 62% de mulheres”, declarou Antônio Jorge, acrescentando que há uma aceitação social do consumo, inclusive com experimentação nas famílias. Para completar, a pesquisa mostra que os adolescentes bebem em maior quantidade, pois o gasto mensal com o álcool fica em R$ 120, na média.
“Cerveja também é álcool” - Por todos esses motivos, o deputado advoga que não haverá avanços no combate ao uso de bebida alcoólica caso não se modifique a legislação que trata da publicidade desse produto. Nesse sentido, Antônio Jorge divulgou a campanha “Cerveja também é álcool”, a qual busca sensibilizar a população para a necessidade de modificar a Lei 9.294, de 1.996. Ele explicou que a norma, de autoria do ex-deputado e crítico histórico das drogas, o professor José Elias Murad, restringe o horário de veiculação de propagandas de bebidas alcoólicas, entre 22 horas e 6 da manhã.
Ocorre que o projeto, pouco antes de ser aprovado, foi modificado, de acordo com o parlamentar, para excluir a cerveja da definição de bebida alcoólica. “Pela lei, considera-se bebida alcoólica somente aquela com teor alcoólico acima de 13 graus Gay Lussac. Por isso, somos motivo de ridículo no mundo porque, no Brasil, cerveja não é bebida alcoólica”, criticou.
Por fim, Antônio Jorge mostrou um vídeo da campanha “Cerveja também é álcool”. A peça divulga que a lei proíbe a associação de bebidas alcoólicas com temas ligados ao sexo e ao esporte e com temas que induzam a uma ideia de bem-estar e saúde. E na opinião do deputado, são essas três temáticas que a indústria da cerveja e das bebidas ices (também com teor alcoólico abaixo dos 13 graus) utiliza o tempo todo em propagandas no Brasil.
Antônio Jorge disse ainda que o objetivo final da campanha é coletar 1,5 milhão de assinaturas em um projeto de lei federal de iniciativa popular para que seja alterado o parágrafo que considerou como bebida alcoólica somente aquela com mais de 13 graus de graduação.
Autoridades cobram criação de Caps na cidade
Giselda Kênia de Oliveira, coordenadora do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) de Mantena, lembrou que o órgão atende também a adolescentes dependentes químicos que são encaminhados. Ela solicitou ao deputado e à ALMG que cobrem do Governo do Estado a instalação no município de um Centro de Atenção Psicossocial (Caps) e de um Caps-AD, esse último voltado somente para o atendimento de dependentes de álcool e drogas.
Os vereadores mantenenses Roberto Machado e Robério Costa apoiaram a reivindicação da coordenadora do Creas. Machado acrescentou que já existe a autorização para instalação do Caps na cidade e Costa completou que faltam os recursos para isso. Os dois parlamentares apoiaram a campanha “Cerveja também é Álcool” e conclamaram toda a população para se engajar no movimento. “Precisamos evitar que os jovens entrem para o mundo do álcool e das drogas e acabem na cadeia ou no cemitério”, afirmou Roberto Machado.
Prevenção - O vereador de Mantena Wanderson Ferreira da Silva foi quem solicitou à comissão a audiência pública na cidade. Ele reivindicou a construção de uma casa para internação e recuperação de dependentes químicos no município e, ainda, de um centro de apoio a esse público, de modo a atender a demanda local e da região.
Wanderson também destacou a necessidade de ações na área da prevenção, colocando o esporte como prioritário nessa iniciativa. E divulgou o trabalho que vem sendo realizado pelo professor Nivaldo Santos, criador da Equipe Evolution, o qual já foi inclusive homenageado pela Câmara Municipal. O orientador desenvolve a prática esportiva, especialmente do judô para crianças e jovens da periferia de Mantena, que têm obtido bons resultados em competições. Nivaldo agradeceu a lembrança, mas pediu apoio das autoridades ao seu trabalho, que já está ficando comprometido devido a falta de recursos financeiros.
Horário de funcionamento de bares é previsto em lei municipal
O subtenente PM Wender Ferreira coordena no município o Programa Educacional de Resistência às Drogas (Proerd), da Polícia Militar. Ele afirmou que o trabalho é desenvolvido nas escolas, mas que enfrenta dificuldades, como a falta de recursos e de divulgação, a indisciplina nas escolas e o excesso de alunos nas turmas.
O policial divulgou que a Câmara Municipal aprovou recentemente uma lei que prevê o fechamento de bares e similares à meia-noite, de segunda a sexta, e às 2 horas da madrugada, nos fins de semana. E acrescentou que a PM local já atua para que a norma seja cumprida pelos comerciantes. Antônio Jorge elogiou a iniciativa da Câmara e da Polícia.
Mesmo com a lei em vigor, o capitão Lindomar Batista de Oliveira, comandante da 159ª Companhia de PM, de Mantena, avaliou que o consumo do álcool em praças e bares ainda é grande. “O problema está crescendo e temos que combatê-lo, descobrindo uma forma de tentar conter esse avanço”, constatou. O dirigente também defendeu a necessidade de criar no município entidades de apoio para jovens e adultos que usam álcool e drogas sem moderação.
Já o diretor do Hospital Evangélico de Mantena, Adson Cerqueira Santana, lembrou a importância da atuação das entidades religiosas na prevenção ao uso de drogas e álcool. Segundo ele, muitas instituições foram convidadas pelo Ministério da Justiça para participar de treinamentos sobre prevenção e enfrentamento às drogas. “Isso mostra que o poder público já percebe que essas entidades são fundamentais na prevenção do uso e no tratamento dos dependentes”, destacou.
Omissão - O pastor da Igreja Batista Central, Hélio Correia de Oliveira, criticou a omissão do Poder Executivo, pelo fato de o prefeito não ter comparecido e nem enviado representante à audiência. Ele concordou com a campaha pela mudança da lei federal, mas advertiu que só isso não resolverá a questão. “Em Mantena, temos festas, inclusive de escolas, em que são servidas bebidas alcoólicas para menores. Há também bares que vendem essas bebidas para menores, durante o dia”, lamentou. Por outro lado, disse que não vai desistir da luta e que a sociedade deve se unir para não entregar seus filhos às drogas.
Janete Batista, do Conselho Tutelar de Mantena, registrou que a cidade não tem delegacia regional e, por isso, os menores infratores têm que ser conduzidos até Governador Valadares (Rio Doce). Como Valadares também não conta com uma unidade de internação de adolescentes, eles acabam sendo soltos, segundo Janete.
Providências - O deputado Antônio Jorge respondeu a Janete que vai solicitar à Secretaria de Estado de Defesa Social que tome providências no sentido de viabilizar unidade socioeducativa em Governador Valadares. Também respondeu que provocará a área de segurança e o comando da PM para que ofereçam maior apoio ao Proerd local.
Por fim, o parlamentar colocou seu gabinete à disposição para assessorar as autoridades locais na criação do Conselho Municipal sobre Drogas (Comad). Sobre o Caps, o parlamentar informou que essa previsão foi feita há cerca de três anos, mas que vai requerer providências à Secretaria de Estado de Saúde para que viabilize a unidade local.