Comissão debateu a implantação da agência estadual de energia elétrica, a energia solar fotovoltaica e o aumento da conta de energia dos irrigantes do Estado
José Carvalho Neto destacou as projeções de consumo de eletricidade no mundo para 2035
Mauro Borges Lemos afirmou que o Brasil tem grandes desafios para alavancar a cadeia produtiva da energia fotovoltaica
Segundo Romeu Rufino, o aumento da conta de energia tem relação com a adoção das bandeiras tarifárias

Com grande potencial, energia solar é pouco aproveitada

Comissão reúne setor elétrico e entidades da cadeia produtiva para discutir incentivo à energia fotovoltaica.

10/08/2015 - 20:37 - Atualizado em 11/08/2015 - 11:10

Apesar de apresentar um grande potencial de uso no Brasil, com sol abundante em todo o ano, a energia solar fotovoltaica ainda está engatinhando no País, que só após 2010 começou a desenvolver políticas públicas para o setor. Essa foi a principal conclusão da audiência pública que a Comissão de Minas e Energia realizou nesta segunda-feira (10/8/15) no Plenário da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Solicitada pelo presidente da comissão, deputado Gil Pereira (PP), a reunião também buscou discutir a implantação de uma agência estadual de energia elétrica e o aumento da conta de energia dos irrigantes do Estado. Participaram do evento representantes do Governo Federal, da Cemig, além de entidades representativas das empresas do setor fotovoltaico e das distribuidoras de energia, entre outros.

José da Costa Carvalho Neto, presidente da Eletrobrás, destacou as projeções de consumo de eletricidade no mundo para 2035, comparadas ao consumo em 2013. Segundo ele, o planeta consumia nesse ano 20.915 terawatts/hora (tw/h) e a projeção para 2035 é de 28.256 tw/h. Apesar de ser um aumento relativamente pequeno, na visão dele, o aumento do consumo vai se concentrar mais nos países em desenvolvimento. Tanto que a perspectiva é de aumento de 10 mil tw/h em 2013 para 17 mil tw/h em 2035 somente nesses mercados.

De acordo com José Carvalho, para fazer frente a esse acréscimo, o mundo, e principalmente os países emergentes, terão que investir pesadamente em eficiência energética, integração dos sistemas e geração renovável (principalmente nas energias eólica e solar). Nesse aspecto, o dirigente enfatiza que o percentual de participação de energia renovável na matriz energética do Brasil já evidencia uma situação favorável do País. Se no mundo, esse percentual é de apenas 18,7%, no Brasil atinge 87,1%.

Quanto ao potencial da energia solar, José Carvalho afirmou que a irradiação média no Brasil fica entre 4 e 6 kilowatts/hora por metro quadrado ao dia (kwh/m²/dia), o que é o dobro da Alemanha, país com grande uso de energia fotovoltaica, com 2 a 3 kwh/m²/dia.

Embora apresente grande potencial de crescimento, o Brasil ainda utiliza pouco a energia fotovoltaica, como constatou Rodrigos Lopes Sauaia, diretor executivo da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSolar). Ele informou que o Brasil conta apenas com 670 conexões desse tipo de fonte. Mas a associação, que já congrega quase 100 integrantes, está otimista em relação ao futuro.

Rodrigo Sauaia destacou os benefícios da energia fotovoltaica. No âmbito socioeconômico, ela promove a geração de empregos de qualidade, a criação de uma nova cadeia produtiva e o aquecimento da economia, segundo ele. No aspecto ambiental, gera-se energia limpa, sem emissão de gases, líquidos, sólidos ou mesmo ruídos. Quanto às vantagens estratégicas, Sauaia ressaltou que o País, ao optar pela energia solar, promove a diversificação de sua matriz energética e contribui para a redução de perdas por transmissão e distribuição (já que a maior parte dessa energia é produzida e consumida no mesmo local).

De modo a alavancar a ampliação do uso da energia fotovoltaica, a ABSolar apresentou várias reivindicações à comissão. Entre elas, destacam-se a isenção de impostos federais e estaduais sobre a cadeia produtiva da energia solar; programas de incentivo às chamadas micro e minigeração (com a adoção de uma meta estadual de telhados fotovoltaicos até 2020); realização de um leilão estadual de energia solar (nos moldes dos leilões federais); criação de linhas de financiamento para pessoa física e jurídica; e instalação de sistemas fotovoltaicos em prédios públicos.

Brasil está atrasado por não deter tecnologia de purificar silício

O presidente da Cemig, Mauro Borges Lemos, afirmou que o Brasil, mesmo com seu alto índice de insolação, tem grandes desafios para alavancar a cadeia produtiva da energia fotovoltaica. Ele avalia que a capacitação tecnológica é um gargalo a ser superado. Isso porque o País não domina a tecnologia de purificação do silício e sua transformação em cristal, insumo necessário para a construção de placas fotovoltaicas. “Corremos o risco de perder mais uma corrida nessa área. A base tecnológica da energia fotovoltaica é a mesma dos microprocessadores - a purificação do silício - e o Brasil perdeu essa onda tecnológica”, constatou.

Ainda assim, Mauro Borges avalia que é possível pular etapas. “Um dos mecanismos de superação de hiatos tecnológicos é buscar parceiros mundiais que tenham competência tecnológica, mas sem o nível de insolação que temos. Por isso, precisamos buscar grandes parceiros tecnológicos”, defendeu. Ele complementou dizendo que o investimento para a construção de uma refinaria de silício é da ordem de R$ 4 bilhões. Mas o Brasil, até o momento, segundo ele, só tem investido em fábricas de montagem de placas fotovoltaicas, que pedem investimento de R$ 100 milhões.

Outro desafio que Mauro Borges considera mais imediato é o de transmissão da energia gerada. “Vamos ter agora leilões de empresas geradoras de energia solar, mas temos que pensar também em em transmissão e distribuição”, ressaltou. Ele lembrou que, no caso da energia eólica, houve problemas nesse sentido, pois o governo incentivou a criação de usinas sem pensar na distribuição da energia. E informou que a Cemig tem capacidade de distribuir cerca de 1,2 gigawatts atualmente, o que será insuficiente daqui a poucos anos, se aumentar muito a produção de energia.

Altino Ventura Filho, secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia, rememorou que até 1995, a matriz energética brasileira era predominantemente hidroelétrica. Só a partir de 1995, com a necessidade de construir usinas em regiões mais distantes do Brasil, é que o País começou a ver a necessidade de buscar energias alternativas.

Segundo Altino Ventura, o início da diversificação da matriz energética se deu com o incentivo à energia eólica, que já apresentava preços mais competitivos. “Queremos seguir esse mesmo caminho com a energia solar, mas é importante viabilizarmos os investimentos de forma sustentável”, disse.

O secretário lembrou que os preços da energia fotovoltaica estão chegando a patamares mais competitivos em relação a outras fontes. “Há uns seis anos, recebemos investidores estrangeiros interessados em produzir energia solar no Brasil. Na ocasião, o custo do megawatt/hora era de cerca de R$ 1.000,00, enquanto o da hidroeletricidade girava entre R$ 150,00 e R$ 180,00”, registrou. Altino Ventura contou que o Ministério de Minas e Energia foi acompanhando a conjuntura internacional com a queda de custo da energia solar, devido ao aumento do seu uso. “Os preços caíram para R$ 400,00, até R$ 250,00. Em 2014, lançamos o primeiro leilão para energia fotovoltaica e conseguimos o preço de R$ 300,00 por megawatt/hora”, disse.

Financiamento - Ana Raquel Paiva Martins, gerente da Área de Infraestrutura do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), informou que o banco tem linhas de financiamento para os setores fotovoltaico e eólico. Mas esses projetos precisam ter conteúdo local mínimo. Para facilitar o financiamento dessas empresas, o órgão criou uma nova metodologia, de modo a estimular nacionalização progressiva dos equipamentos. “Ao longo do tempo, o banco vai aumentando a exigência de nacionalização dos equipamentos de empresas que se instalam no Brasil, o que facilitou a obtenção de empréstimos”, concluiu.

O assistente da presidência de Furnas Centrais Elétricas, Luiz Felipe da Silva Veloso, disse que é preciso cautela por parte dos empresários ao investirem no setor fotovoltaico. "Novos custos deverão advir dos sistemas eólicos e fotovoltaicos. Como lidar com isso de modo que, numa crise do sistema hidrelétrico, sejamos supridos da energia elétrica de que precisamos? Como os novos projetos vão gerar a taxa de retorno necessária? É preciso refletir sobre isso, de maneira sóbria".

O secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico, Altamiro de Araújo Rôso Filho, pontuou que precisam ser definidas regras claras para os investimentos estrangeiros no setor fotovoltaico mineiro. “Estamos bem avançados na obtenção de células fotovoltaicas a partir do silício. Essas células de estrutura orgânica mudariam a realidade do mercado hoje. Estou otimista quanto a isso”, disse.

De acordo com o deputado Dalmo Ribeiro Silva (PSDB), debater a energia fotovoltaica em Minas é essencial. "Fizemos história aqui na Assembleia hoje. Temos projetos preparados para catapultar a energia solar no Estado, e tenho certeza de que Minas fará sua parte. Temos de buscar também ouvir outros Estados sobre essa questão, tentando também um debate em nível federal”, concluiu.

Deputado reclama de aumento da conta de luz

O deputado Gil Pereira criticou o aumento da conta de luz de modo geral, mas centrou fogo nos impactos desse reajuste na situação dos irrigantes do Norte de Minas. Ele também reivindicou a implantação de uma indústria em Minas Gerais para beneficiamento do silício, matéria-prima das placas fotovoltaicas. E destacou a realização do leilão de energia solar da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) no dia 28 de agosto. Segundo o parlamentar, uma das empresas participantes vai instalar a maior usina solar da América Latina, em Pirapora (Norte de Minas), com geração de 300 megawatts.

Romeu Donizete Rufino, diretor-geral da Aneel, respondeu que o aumento da conta de energia tem relação com a adoção das chamadas bandeiras tarifárias. Para ele, com a medida, o consumidor tende a fazer um uso mais racional de energia, pois passa a ter consciência de que ela está mais cara ou mais barata de acordo com a bandeira.

Em relação ao leilão citado pelo deputado Gil Pereira, o dirigente informou que Minas Gerais conta com 127 empreendimentos na área de energia fotovoltaica (9% do total brasileiro). Sobre a possibilidade de criação de uma agência reguladora estadual de energia elétrica, Romeu Donizete informou que ela não teria competência para regular o setor. De acordo com ele, a agência poderia atuar em apenas algumas áreas, como fiscalização, e teria que ser estruturada nos moldes da agência federal.

Biomassa - Mário Campos Ferreira Filho, presidente do Sindicato da Indústria de Fabricação do Álcool em Minas Gerais (Siamig), disse que as dificuldades atuais do setor fotovoltaico são parecidas com as que o setor da biomassa enfrentou no passado. “Recebemos um incentivo inicial do governo, que logo depois foi retirado, o que gerou o colapso do setor. Isso não pode ocorrer de novo, com a energia solar”, defendeu.

Mesmo com as dificuldades, ele declarou que a energia gerada pelo setor sucroalcooleiro, incluindo o próprio etanol e também a biomassa (proveniente do bagaço da cana), responde por 16% da matriz energética brasileira. “Consumimos nossa própria energia nas usinas e ainda geramos excedentes”, concluiu.

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