Segundo relatado na reunião, enquanto a alíquota do ICMS em Minas é de cerca de 18%, no Rio de Janeiro, na região da divisa, é de apenas 2%
Lafayette de Andrada acredita que essa nova resolução seja um
Segundo Isauro Calais, o PIB de Juiz de Fora é inferior à média do Estado
Francisco José Nogueira disse que uma grande indústria de móveis, com 300 empregos diretos, foi embora da região

Lideranças da Zona da Mata se unem contra guerra fiscal

Participantes de debate em Juiz de Fora defendem instrumentos legais que permitam competição igualitária entre Estados.

01/06/2015 - 19:25

A defesa de instrumentos legais que permitam a adoção de medidas para proteger os municípios da Zona da Mata dos efeitos da chamada guerra fiscal, promovida sobretudo pelo Rio de Janeiro e pelo Espírito Santo. Essa foi a tônica da audiência pública que a Comissão de Turismo, Indústria, Comércio e Cooperativismo da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) promoveu na tarde desta segunda-feira (1º/6/15) em Juiz de Fora. A reunião atendeu a requerimento dos deputados Isauro Calais (PMN), Noraldino Júnior (PSC), Missionário Márcio Santiago (PTB), Lafayette de Andrada (PSDB) e Antônio Jorge (PPS), todos oriundos da região.

No centro das atenções está o Decreto 45.218, de 2009, que estaria sob ameaça de revogação pelo Executivo, embora tenha servido nos últimos anos como primeira linha de defesa dos municípios mineiros contra a fuga de empresas para outros Estados. Na prática, a guerra fiscal é deflagrada quando outras unidades da Federação concedem benefícios fiscais com relação ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que é estadual, sem amparo na Lei Complementar Federal 24, de 1975, que regula a questão. Embora a polêmica já tenha chegado até ao Supremo Tribunal Federal (STF), as decisões da Justiça até o momento ainda não conseguiram apaziguar a disputa.

No caso da Zona da Mata, que faz divisa com o Rio de Janeiro, o problema é ainda maior, já que os municípios fluminenses fronteiriços teriam sido diretamente beneficiados pela Lei 4.533, de 2005, mais conhecida como Lei Rosinha, atraindo para a Região Serrana do Rio tanto indústrias antes instaladas na Zona da Mata quanto novos empreendimentos que representaram investimentos e empregos.

Segundo relatado na reunião, enquanto a alíquota do ICMS em Minas é de cerca de 18%, no Rio, na região da divisa, é de apenas 2% - no restante daquele estado é de 3%. Já no Espírito Santo a alíquota seria de apenas 1%. Para complicar, o Executivo, desde o início do ano, por meio da edição de uma nova resolução sobre o tema, teria “congelado” a análise de novos pedidos do chamado Regime Especial de Tributação (RET).

“O Regime Especial de Tributação é, sim, um regime de exceção, pois não podemos tratar de maneira igual os desiguais. O decreto do governo anterior permitiu aos municípios mineiros perto da divisa lutarem em pé de igualdade com os do Rio de Janeiro, Estado que não obedece a lei e faz a guerra fiscal de maneira ilegal. Esse instrumento funcionou muito bem nos últimos anos”, ponderou o deputado Lafayette de Andrada.

“Mas essa nova resolução engavetou todos os processos até que seja criada uma normatização geral de diferimento de tributos. Isso vai exatamente na contramão daquilo que se deveria fazer neste momento. É um tiro de morte na economia da Zona da Mata”, completou o parlamentar.

Sem vencedores - Na mesma linha, o deputado Antônio Jorge cobrou uma reação mais rápida do Executivo com relação aos problemas da Zona da Mata, em meio a um cenário de crise econômica e corte de investimentos e empregos. “O desenvolvimento acontece a partir do atendimento das demandas regionais como essa. Não vivemos em uma ilha, é preciso ação. Essa guerra fiscal é insana e absurda e motivo de muitos prejuízos para a Zona da Mata e toda Minas Gerais. Mas uma guerra, no final das contas, como o próprio nome diz, é ruim para todos os lados, mesmo quem vence. A União também precisa assumir seu papel”, afirmou.

Segundo o deputado Antônio Jorge, o Rio de Janeiro pode utilizar o ICMS como artilharia nessa disputa porque tem a seu favor a arrecadação dos royalties de petróleo. “O decreto não foi o ideal, mas ao menos restabeleceu a competitividade”, disse.

Forças políticas da região unem força pelo fim do impasse

O deputado Noraldino Júnior ressaltou que a união das lideranças da região, a começar pelos deputados da Zona da Mata, todos presentes na reunião, é o primeiro passo para tentar reverter esse quadro. “Essa audiência demonstra nossa união, independentemente de objetivos políticos, em prol da retomada de nosso desenvolvimento, prejudicado há tantos anos”, apontou. “Não queremos brigar com o Governo do Estado, mas somente a possibilidade de alteração da tributação já é o suficiente para afastar quem quer investir em nossa região”, lamentou.

Segundo o deputado Isauro Calais, desde 2006 o Produto Interno Bruto (PIB) de Juiz de Fora já se mostra inferior à média do Estado. “Até o Vale do Jequitinhonha, com todos os seus problemas, cresceu mais do que a Zona da Mata no ano passado. É um sofrimento para quem é da nossa região ver as indústrias e empregos irem embora. Nós, deputados da Zona da Mata, que convivemos no Parlamento mineiro, não podemos mais aceitar mais isso. Já são mais de 500 pedidos sem definição do Estado. Pela situação que vivem, temos que ter uma política tributária diferente para a Zona da Mata e para o Sul de Minas”, defendeu.

A união das forças políticas da Zona da Mata também foi apontada pelo deputado Missionário Márcio Santiago como o caminho para tirar o Executivo da inércia. “São cinco deputados de Juiz de Fora e mais quatro da região. Temos que combater esse mal e fazer o discurso sair do papel. Só vamos conseguir uma vitória unidos, atuando em parceria com entidades como a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg)”, afirmou.

O parlamentar citou como contraponto a cidade fluminense de Três Rios, situada próxima da divisa com Minas Gerais, destino de vários empreendimentos que antes teriam como alvo Juiz de Fora. “Lá os investimentos levaram qualidade de vida para a população, mas isso foi resultado de uma parceria das ações do poder publico com as empresas”, destacou.

Críticas - A audiência pública foi coordenada pelo deputado Antônio Carlos Arantes (PSDB), presidente da comissão, que criticou a ausência de um representante do Executivo. “Com mais de cinco meses no poder, um governo interessado na questão já teria chamado os representantes dos municípios e empresários para conversar, mesmo que de imediato não pudesse fazer nada. É preciso dar pelo menos um apoio moral. São gestos assim que, independentemente das posições políticas, dão alguma esperança. Está faltando ousadia do governo e acreditar mais no povo mineiro”, disse.

Uma bengala para que a economia mineira continue andando

O presidente regional da Fiemg na Zona da Mata, Francisco José Campolina Martins Nogueira, comparou o Regime Especial de Tributação a uma “bengala” que tem permitido à economia mineira continuar a andar mesmo diante dos malefícios da guerra fiscal. Segundo ele, a Lei Complementar Federal 24, de 1975, já traz os instrumentos legais necessários para que o Governo do Estado faça frente aos abusos supostamente cometidos pelas administrações estaduais fluminense e capixaba.

O dirigente da Fiemg destacou ainda a situação da indústria moveleira na Zona da Mata, uma das mais atingidas pelo problema. “No Espírito Santo, o ICMS é de apenas 1%. Já denunciamos isso ao governador e nada ainda foi feito. O resultado mais recente é que perdemos uma grande indústria de móveis, e junto foram embora 300 empregos diretos. Empresário não é bobo, não vai querer quebrar com a concorrência. Qual empresário vai querer pagar 18% de imposto aqui se pode pagar 1% no Espírito Santo ou 2% no Rio, bastando atravessar a divisa?”, desabafou.

Segundo Francisco Nogueira, no final das contas, não há vencedores na guerra fiscal, já que os três Estados têm economias fortemente dependentes de commodities e todos estão sofrendo com a queda no preço tanto do petróleo quanto do minério. Mas, independentemente disso, algo precisa ser feito, pois a Fiemg contabilizou 196 empresas instaladas em Três Rios, do outro lado da divisa, nos últimos anos, de acordo com ele. “Precisamos de leis diferenciadas para cada região, pois Minas são muitas. Aqui não chegam novas empresas e as que já existem estão indo embora”, lamentou.

Áureo Calçado Barbosa, do Sindicato Intermunicipal das Indústrias de Marcenaria de Ubá, reconheceu que as diferenças tributárias entre Estados ameaçam 320 indústrias de mobiliário em oito cidades mineiras, que geram mais de 13 mil empregos diretos. “Elas já estão sofrendo com essa crise generalizada e perdendo a condição de competir. Defendo os interesses de um grupo que é uma indústria de alta tecnologia que evoluiu muito nos últimos anos, sobretudo em cidades como Ubá. Precisamos de uma tributação diferenciada e apoio em outras áreas, como na importação de equipamentos que nos garantam mais eficiência energética”, exemplificou.

Arco e flecha - O secretário municipal de Desenvolvimento Econômico de Juiz de Fora, André Luiz Zuchi Conceição, foi ainda mais enfático. “Estamos lutando com arcos e flechas enquanto nossos vizinhos estão com armas automáticas. Mudar as regras no meio do jogo é o pior caminho. Nosso sistema tributário virou uma colcha de retalhos, e isso atrapalha o aumento da competitividade do País. O ideal é uma solução definitiva, que passa, por exemplo, pela redefinição do papel do Confaz e do pacto federativo”, afirmou.

Por fim, o presidente da Câmara Municipal de Juiz de Fora, Rodrigo Cabreira de Mattos, destacou que a reunião serviu para mandar ao governador a mensagem de que a cidade está unida em torno de uma causa. “O decreto foi editado no meio de 2009, e naquele ano registramos 2.826 empregos criados. No ano seguinte foram 6.805. Isso mostra a importância desse instrumento”, pontuou.