Comissão de Direitos Humanos debateu a alienação parental, na tentativa de buscar formas de aumentar a conscientização dos cidadãos sobre o tema
Para Oliveira Filho, a lei que trata da guarda compartilhada representa um avanço

Demora da Justiça favorece alienação parental

Guarda compartilhada foi defendida como forma de combater a prática, que condiciona filhos a romper laços com genitor.

24/04/2015 - 14:18

A morosidade da Justiça na tramitação dos inúmeros processos litigiosos de disputa de guarda entre pais divorciados pode cristalizar a alienação parental, quebrando os vínculos afetivos entre um dos genitores e a criança. A análise foi feita pelo procurador de justiça, Bertoldo Mateus de Oliveira Filho, que defendeu a guarda compartilhada como uma alternativa a essa situação, durante audiência promovida pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta sexta-feira (24/4/15).

A alienação parental é a situação em que a criança, sob influência do pai ou da mãe, é condicionada a romper os laços afetivos com um dos genitores. A prática está associada à ruptura da convivência conjugal, gerando a tendência, em um dos pais, de desmoralizar e desacreditar o ex-cônjuge, utilizando o filho como um instrumento para isso.

“Não são raros os casos em que a alienação se tornou irreversível”, disse Filho, que também é coordenador de Defesa dos Direitos das Famílias do Ministério Público. O procurador ainda avaliou que a recuperação do vínculo não é um trabalho jurídico, sendo necessária a atuação interdisciplinar entre diversos parceiros, com o objetivo de fugir da judicialização do processo e resgatar essa relação ameaçada.

Com esse intuito, ele afirmou que o Ministério Público está formalizando um Núcleo de Prevenção e Recomposição de Vínculos Parentais e Familiares. “A judicialização de um conflito que envolve o filho não se resolve na forma da lei. Não dá para resolver a alienação em processos que duram anos”, considerou Oliveira Filho, que ainda afirmou que esses processos litigiosos podem ter uma duração média de cinco a sete anos. O procurador também afirmou que cada uma das 11 varas de família de Belo Horizonte registra uma média de 5 a 7 mil processos envolvendo todos os tipos de litígios familiares.

Guarda compartilhada é apontada como avanço

Oliveira Filho ainda considerou que a Lei Federal 13.058, de 2014, que trata da guarda compartilhada, foi um avanço, na medida em que pressupõe que ambos os pais têm idêntica aptidão à guarda da criança. “A lei da guarda compartilhada quebra um discurso de poder”, avaliou. Nesse sentido, ele apontou que os pais deixam de se postar como adversários no litígio pela guarda do filho, assumindo a posição de parceiros. Ele ainda disse que o modelo valoriza o preceito constitucional que resguarda o direito à proteção da criança, inclusive sociológica e afetivamente.

Na sua avaliação, o problema da alienação parental é antigo, difícil de ser abordado e as entidades que estão envolvidas com o tema têm fracassado na sua abordagem. O procurador ainda cobrou do Estado a criação de uma casa de recolhimento e orientação às vítimas de alienação parental, objeto que foi contemplado em um requerimento apresentado pelos deputados Anselmo José Domingos (PTC) e Cristiano Silveira (PT).

Histórico – O procurador explicou que o antigo Código Civil adotava uma visão paternalista, na qual o pai era o provedor da família e a mãe era a responsável por cuidar dos filhos e da casa, o que teria criado o entendimento de que, nos casos de escolha de guarda, a criança deveria ficar com a mãe. Segundo ele, após a Constituição Federal de 1988, esse paradigma teria começado a mudar.

Oliveira Filho ainda avaliou que o fim dos vínculos conjugais traz uma carga de ressentimentos e mágoas entre o casal, que acabam se convertendo em uma guerra interna, psicológica e afetiva, sem que os pais percebam que o filho se encontra no meio da disputa. “Há uma incapacidade de percepção de que, além da conjugalidade, permanecia situação da maternidade e paternidade e ela é imutável. O fim do casamento não pode significar o fim da parentalidade”, disse.

Consequências – O autor do requerimento para a audiência, deputado Anselmo José Domingos, considerou espantosas as consequências da alienação parental tanto para filhos como para o genitor que sofre a alienação. “Na disputa de guarda, casais que se separam imputam ao filho um sacrifício grande, pela disputa entre eles”, disse.

De acordo com o parlamentar, entre os problemas causados pela alienação parental estão o não compartilhamento e comunicação ao ex-cônjuge dos fatos e decisões importantes da vida do filho pelo genitor que possui a guarda da criança; o controle dos horários de visita de um dos pais; as constantes a críticas ao outro genitor que não detém a guarda do filho; a pressão exercida sobre a criança para optar por um dos pais; e a utilização do filho para obter informações sobre a vida íntima do ex-parceiro.

Domingos também considerou uma evolução a Lei Federal 13.058, que na sua percepção traz um alento à situação da alienação parental, já que prevê que o convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada entre os pais. Segundo ele, a norma ainda prevê que nos casos em que a guarda unilateral permanecer, as instituições públicas e privadas frequentadas pela criança devem dar informações para o outro genitor. “O direito de conviver familiarmente é um direito que a criança continua tendo”, afirmou o deputado, que ainda reforçou a importância de garantir os direitos da criança, entre eles o direito ao afeto e à assistência moral.

O deputado Cristiano Silveira (PT) considerou que o anseio da sociedade é que essas questões que envolvem a guarda de filhos pudessem ser resolvidas não só pela força da lei.

Pai relata dor de ter perdido convivência com a filha

O empresário Alexandre Bersan Carneiro é uma das vítimas da alienação parental. Ele é pai de uma garota de 12 anos e, segundo ele, há dois anos e meio não passa um fim de semana na companhia da filha, vendo-a raramente. O caso de Carneiro já foi encerrado pela Justiça que, na sua avaliação, foi irresponsável e ineficiente ao proferir uma decisão que ele considera injustificada e questionável.

Segundo ele, no processo que se iniciou em 2009, ficou constatado por meio de estudo social que havia, por parte da mãe de sua filha, a prática de alienação parental. Mesmo assim, de acordo com o empresário, ele teria perdido o processo. “Como pai vivi a dor, a saudade, a impotência, a ausência, a ineficiência e a incapacidade do Judiciário, e sofri a perda de uma filha que está viva”, desabafou. Segundo Carneiro, atualmente a convivência entre eles não acontece por vontade da filha, apesar dele ter o direito de vê-la.

Carneiro cobrou uma postura diferenciada do Judiciário nesse tipo de caso, de modo a enxergar a questão de forma mais humanizada. A celeridade nos processos judiciais também foi abordada por Carneiro, que ainda questionou se os profissionais dos setores psicossociais envolvidos no processo estão aptos e capazes a emitir pareceres justos sobre a questão. A falta de estrutura do Judiciário e dos profissionais envolvidos com a questão também foi questionada por outros pais que participaram da reunião.

Prática é considerada crime – O advogado criminalista especialista em crimes contra a criança e o adolescente, Murilo Evandro Andrade, lembrou que o termo alienação parental começou a ser proposto em meados da década de 80, pelo psiquiatra norte-americano Richard Gardner, quando se identificou a dificuldade de convivência entre o filho e o pai que não detém a sua guarda. Ele também apontou que a Lei Federal 12.318, de 2010, exemplifica o que são os atos de alienação parental, definindo sanções pra o genitor que a provocar, uma vez que a prática é considerada crime.

Andrade ainda considerou a alienação parental como um ato de negligência e crueldade e defendeu a guarda compartilhada como uma maneira de minimizar a disputa de poder que um dos pais exerce sobre o filho. Ao falar sobre as consequências que o problema pode trazer para a vida dos envolvidos, o advogado exemplificou que, no Rio de Janeiro, nos casos em que há litígio entre os pais, 85% das acusações de abuso sexual de crianças e adolescentes  apresentam-se como falsas. Ele disse que não há estatísticas nesse sentido em Minas Gerais.

Esse é o caso de Fernando Greco, pai de uma garota de cinco anos, e que relatou ser vítima da acusação de abuso sexual da filha. Ao falar que há dois anos não vê a criança, ele cobrou que, nesse tipo de caso, o genitor tenha direito a ampla defesa e que a denúncia seja devidamente investigada e comprovada. “Os pais que sofrem alienação se tornam pessoas mais frias, insensíveis e perdemos a capacidade de amar e dar amor ao próximo”, lamentou.

Consulte o resultado da reunião.