Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária debateu as medidas adotadas pelo Contran que afetam os centros de formação de condutores
Participantes da audiência manifestaram contra a obrigação dos simuladores
O público lotou o Salão de Chá da Assembleia

Críticas à exigência de simulador em CFC marcam debate

Apesar de prorrogação de prazo, audiência pública da FFO sobre medida polêmica do Contran atrai grande público à ALMG.

12/02/2014 - 18:42

Apesar da publicação nesta quarta-feira (12/2/13) de uma nova resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) flexibilizando as exigências para a instalação de simuladores de direção, os representantes dos centros de formação de condutores (CFCs) ainda têm uma enxurrada de críticas contra a medida. Elas vão do custo da compra e da manutenção do aparelho até a obrigatoriedade e o pouco tempo para sua implantação. Essas reclamações foram expostas também nesta quarta (12) durante audiência pública da Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária (FFO) da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O debate atendeu a requerimento do deputado Zé Maia (PSDB), presidente da FFO.

O conteúdo da nova resolução, nº 473/2014, foi explicado na reunião pela coordenadora-geral de Qualificação do Fator Humano no Trânsito do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), Maria Cristina Alcântara Andrade Hoffmann, que também representou o Contran no debate. Segundo ela, a flexibilização foi decidida na véspera, em reunião do Contran, em virtude de várias dificuldades constatadas, como a interligação pela internet dos simuladores nos CFCs aos Detrans (órgãos estaduais) e a demora de até 90 dias na entrega do equipamento. Atualmente, apenas quatro empresas estão homologadas a fabricar o simulador em todo o Brasil.

De acordo com Maria Cristina, entre as medidas previstas pela nova resolução está o funcionamento offline do aparelho – que de outra forma impediria o aluno de fazer aulas práticas até completar cinco horas/aula no simulador – , a possibilidade de instalá-lo em local diferente do CFC – o que abre a perspectiva do compartilhamento do equipamento – ou que ele seja itinerante e, o mais importante, a extensão do prazo da obrigatoriedade para 30 de junho. Mas, segundo informações divulgadas durante a audiência pública, a Justiça do Ceará já aprovou liminar contra a exigência do simulador e, na Câmara dos Deputados, já há um projeto tramitando em regime de urgência com o mesmo objetivo.

Na resolução anterior, a de nº 444/13, o prazo para contar com o equipamento se encerrou em 31 de dezembro. O novo equipamento chega a custar R$ 40 mil e o impacto no custo das aulas é de, em média, R$ 300, segundo avaliações do setor. Alguns fabricantes ainda estariam cobrando uma taxa de manutenção e oferecendo a possibilidade de comodato em troca de parte do valor cobrado pelas aulas.

“É preciso lembrar que a obrigatoriedade continua válida, mas não queremos que os usuários dos CFCs sejam prejudicados. Três novas empresas estão em processo de homologação para fabricar os simuladores, mas, em junho do ano passado, quando adiamos pela primeira vez, era apenas uma. Já temos cinco linhas de crédito para isso, e precisamos lembrar que o simulador já é usado com sucesso em vários países”, afirmou Maria Cristina, vaiada pelas dezenas de instrutores e donos de CFCs que lotaram o Plenarinho IV e o Salão de Chá.

Segundo a representante do Denatran e do Contran, são quase 12 mil CFCs em todo o Brasil, 1,8 mil deles em Minas, e a avaliação é de que sejam necessários em torno de 5 mil simuladores, sendo que a primeira exigência dele remonta à Resolução 358, ainda de 2010. “Todos os envolvidos foram consultados. Os presidentes dos sindicatos dos CFCs são favoráveis à medida e as autoescolas vão ter lucro com essas aulas. Não podemos abrir mão de uma melhor formação, pois temos estudos que indicam que 93% dos acidentes são provocados pelos motoristas”, apontou.

Protestos - Durante a exposição de Maria Cristina, foram várias manifestações contrárias dos presentes, que até exibiram uma faixa: “Abaixo a extorsão do simulador”. O deputado Zé Maia sugeriu que os proprietários dos CFCs, por meio dos seus representantes, sintetizassem suas reclamações em um documento para embasar novas ações da Assembleia de Minas. O parlamentar também propôs que a UFMG possa participar do debate técnico antes da implantação dos simuladores. Até agora, o Contran consultou apenas os técnicos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) para implantar a medida.

“Como se tivesse saído da cartola de um mágico, o simulador foi colocado como a solução de todos os problemas do trânsito no Brasil. Mas precisamos de mais prazo para um debate mais amplo antes de impor esse custo a todas as autoescolas do Brasil”, afirmou o deputado Zé Maia.

Deputados são favoráveis a mais tempo para aprofundar discussão

A exigência do simulador subverte a função do CFCs, que seria prioritariamente a de formar bons condutores, e não apenas aprovar o maior número de pessoas em um exame. A posição foi expressada pelo deputado Lafayette de Andrada (PSDB), também presente ao debate. “O simulador sem dúvida agrega valor na formação do condutor. Mas não dá para impor uma medida assim, goela abaixo. Não são mais quatro ou cinco aulas que vão resolver todos os problemas. Não sei a quem essa obrigatoriedade atende e tenho minhas desconfianças”, pontuou.

Essa posição foi apoiada pelo deputado Antônio Carlos Arantes (PSDB): “o maior sinal de que o que estão fazendo está errado é a forte reação contrária”. Para o parlamentar, mais do que apostar em uma máquina, as autoridades de trânsito deveriam confiar mais na formação prática dos condutores, com a ajuda da experiência de outro ser humano, no caso, seu instrutor.

O deputado Antônio Lerin (PSB) ressaltou que os instrutores dos CFCs são, antes de tudo, professores e, portanto, têm a maior parcela de responsabilidade de preparar um país melhor para as próximas décadas. “Não sei se são algumas aulas em um simulador que vão transformar o trânsito no Brasil. Será que quem pensou nessa medida, sem discuti-la amplamente antes, conhece a realidade do interior do Brasil?”, criticou.

O deputado Romel Anízio (PP) classificou como um “monopólio absurdo” a exigência em tempo recorde de simuladores diante do pequeno número de empresas habilitadas para fabricá-los. “Vão aumentar os custos, mas as pessoas não vão deixar de dirigir. O resultado disso serão menos motoristas habilitados nas ruas”, analisou.

Por fim, a deputada Luzia Ferreira (PPS) lembrou que, nos pequenos municípios mineiros, o custo extra representado pelo simulador pode significar a extinção de microempresas. “Até acredito que a intenção foi boa, mas não dá para sentar e redigir uma resolução dessa amplitude. Alguns assuntos são discutidos por até dois anos aqui na Assembleia, com as pressões legítimas da democracia, para que o assunto amadureça”, lembrou.

Equipamento não eliminaria deficiências na formação dos condutores

O presidente do Sindicato dos Proprietários de CFCs de Minas Gerais (Sipro-CFC), Rodrigo Fabiano da Silva, lamentou que a polêmica dos simuladores tenha desviado o foco da formação de condutores, segundo ele muito ultrapassada no Brasil em relação ao resto do mundo. Na visão dele, sob o pretexto de modernizá-la, foram criados novos entraves.

“Na Austrália são no mínimo 120 horas de aula prática e aqui são apenas 20. Nossa legislação é despreparada. Não é acrescentando mais cinco horas de simulador que tudo vai melhorar. Todo o conteúdo exigido pelo Denatran precisa ser revisto. Com 20 horas de direção ele pode exigir o certificado e a marcação do exame de rua, mesmo não estando preparado”, ressaltou. Rodrigo Silva ainda denunciou a exigência de valores até R$ 1.750 a título de taxa de manutenção dos simuladores.

O chefe da Divisão de Habilitação do Detran-MG, Anderson França de Menezes, ressaltou que o órgão que comanda não tem poderes para reverter a decisão. “Nós apenas cumprimos a legislação. O simulador vai agregar valor ao processo de aprendizado, mas mas está sendo implantado na hora errada”, contemporizou.

Já o presidente da Federação Nacional das Autoescolas e Centros de Formação de Condutores (Feneauto), Magnelson Carlos de Souza, que também chegou a ser vaiado pelos manifestantes, lembrou que a presença do simulador já constava do Código de Trânsito Brasileiro, que é de 1998, mas, nesse momento, o melhor é optar pelo caminho do entendimento. “É um avanço tecnológico e pode contribuir para a formação de condutor. Conseguimos essa prorrogação do prazo, pois é difícil a implantação de maneira uniforme. Nossa luta é para que essa seja, em princípio, uma medida facultativa”, disse.

Empresários - Venício Feliciano de Vasconcelos, do Centro de Formação de Condutores de Canápolis (Triângulo Mineiro), comparou o simulador a um “videogame de R$ 40 mil”, fadado a cair em desuso como o kit de primeiros socorros em todos os veículos, que foi abolido após pouco tempo da exigência. E Paulo Alexandre Teixeira Vertes, do Centro de Formação de Condutores de Uberaba (Triângulo), lembrou que a prorrogação de prazo beneficiou os fabricantes e não as autoescolas.

“Temos que requerer alvarás para adaptações físicas, não vai dar tempo, e no dia 30 de junho estaremos de volta aqui, com o mesmo problema”, adiantou Paulo Vertes, que acrescentou ainda que o simulador só tem duas utilidades: reduzir custos, como no treinamento na aviação, e evitar acidentes. “O simulador é muito caro, aumenta os custos, e não tenho notícia de acidentes com vítimas envolvendo veículos de autoescolas”, finalizou.