Divinópolis é contra redução da maioridade penal
Para autoridades do município, mudança na lei pode esconder as causas da delinquência juvenil.
09/10/2013 - 18:42Representantes da sociedade civil e do poder público de Divinópolis (Centro-Oeste do Estado) são contrários à redução da maioridade penal. A defesa dessa opinião foi feita durante audiência pública da Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizada nesta quarta-feira (9/10/13) na cidade. A reunião foi requerida pelos deputados André Quintão (PT), Fabiano Tolentino (PSD) e pela deputada Maria Tereza Lara (PT).
Para a conselheira municipal dos Direitos da Criança e Adolescente de Divinópolis, Maria da Consolação Faria, a criminalização serviria para maquiar a verdadeira causa do problema, já que os adolescentes também são vítimas da falta de oportunidades no Brasil. “A delinquência juvenil é um aviso de que a sociedade, o Estado e a família não têm cumprido o dever de assegurar os direitos das crianças e dos adolescentes, por isso, os jovens são também vítimas”, afirmou.
Segundo Maria da Consolação, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê punições para jovens que cometem delitos, ao contrário do que muitos afirmam. “O adolescente que comete um crime é responsabilizado por meio de medidas socioeducativas, e essa responsabilidade começa com 12 anos. O ECA prevê inclusive a privação de liberdade, por meio da internação, que pode durar até três anos”, elucidou.
O papel do ECA foi também abordado pelo deputado André Quintão, que defendeu a necessidade da garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes antes da diminuição da maioridade penal. “Tenho certeza de que, se o ECA estivesse sendo cumprido na íntegra, essa discussão não estaria colocada”, afirmou.
O parlamentar reforçou ainda que a família, a educação e o combate às drogas são questões que precisam ser trabalhadas pelas políticas públicas e por toda a sociedade para reduzir a criminalidade entre os adolescentes. "Precisamos de políticas para que a família tenha renda, tenha sustentabilidade. Precisamos garantir o acesso à educação desde o ensino infantil, a qualidade do ensino fundamental e repensar o ensino médio em associação com o ensino técnico. Estamos perdendo a batalha contra as drogas – a maior parte dos atos infracionais estão associados ao uso e ao tráfico de drogas”, defendeu.
Sistema prisional - Para a deputada Maria Tereza Lara, levar o adolescente para a cadeia não é solução. “O sistema prisional está falido e, muitas vezes, é uma universidade do crime”, afirmou. O mesmo ponto de vista foi defendido pelo deputado Fabiano Tolentino. “Quando discutirmos maioridade, temos também que discutir o sistema prisional. Colocar as crianças na cadeia vai resolver a questão? Temos que ver que a situação é muito mais ampla. Não adianta diminuir a maioridade, é preciso trabalhar com outros fatores para reduzir a criminalidade”, reforçou Tolentino.
A conselheira Maria da Consolação também criticou o sistema carcerário nacional. Segundo ela, 70% dos que foram encarcerados em presídios no Brasil voltaram a cometer crimes. “O nosso sistema carcerário é meramente punitivo, sem nenhuma medida para reinserção social. Onde não existem políticas, existe polícia”, afirmou.
MP defende solução intermediária
O promotor Carlos José e Silva Fortes afirmou que são necessários melhores instrumentos para coibir a delinquência juvenil. Segundo ele, alguns países adotam um pré-julgamento que avalia se o adolescente poderá ser julgado como maior de idade. “Isso porque as pessoas não são iguais. Existem casos em que o que está previso no ECA é uma impunidade, sim”, defendeu.
Apesar de defender um ponto de vista intermediário em relação à redução da maioridade penal, o promotor foi enfático ao ressaltar que as crianças e os adolescentes brasileiros não têm seus direitos garantidos e que esse cenário é um dos grandes responsáveis pelos índices de criminalidade nessa faixa etária. “Como podemos reduzir a maioridade se não demos chance à criança e ao adolescente? Não temos infraestrutura para aplicar o ECA e todas as medidas que visam à recuperação das crianças e adolescentes”, criticou. Para ele, solução passa, prioritariamente, pela educação. “Precisamos de investimento em educação em todos os sentidos: matemática, português, trato no dia a dia, respeito, até na etiqueta do por favor e do obrigado”.
A educação também foi colocada como prioritária pelo professor de Direito Francys Gomes Freitas. Para ele, é necessária a valorização dos professores para garantir educação de qualidade. “Ninguém quer ser professor. Precisamos incentivar esses profissionais com salários e boas condições de trabalho”, destacou. Ele ainda apontou outras medidas para o combate à criminalidade, como aumento de políticas sociais ao contrário de políticas assistencialistas, aumento da abordagem orientativa por parte da Polícia Militar e o incremento da política anti-drogas.
Professora critica a imprensa
A professora da Faculdade de Direito de Divinópolis Simone Matos Rios Pinto apontou os meios de comunicação como os responsáveis pela difusão da ideia da criminalidade causada por adolescentes e crianças. “Buscamos sempre culpados pela violência no mundo, e agora colocamos os jovens como os culpados. Somos nós que alimentados esse discurso, e não podemos dizer que reduzir a maioridade penal vai diminuir a criminalidade no País”, destacou.
Já a diretora-geral do Centro Socioeducativo de Divinópolis, Maria José Rabelo Vilaça, afirmou que a cultura consumista é uma das responsáveis pelos índices de criminalidade entre os menores de 18 anos. “Temos que observar ainda o discurso capitalista, que coloca como imperativo o consumo”. Ela ainda considerou as drogas como o principal item de consumo visado por essa faixa etária e, por isso, um dos grandes motivadores para a realização de delitos. “A droga tem um mercado imenso e extremamente articulado, com pequenos vendedores, os adolescentes. O adolescente é consumido pela droga. Outro fenômeno preocupante é a utilização dessas crianças como mediadores entre os consumidores e os traficantes – são os aviões e as mulas”, destacou.